Que o direito à segurança da mulher no transporte e fora dele se estenda por todo o Brasil!
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Que o direito à segurança da mulher no transporte e fora dele se estenda por todo o Brasil!

A aprovação da lei no Distrito Federal, que determina que os ônibus, após as 22h, devem parar obrigatoriamente onde as mulheres transportadas solicitarem, é uma medida concreta de fomento ao debate da igualdade entre gêneros e que avança no tema da violência contra a mulher e do feminicídio.

Daniela Possebon e Paola Rodrigues 11 abr 2014, 08:34

Daniela Possebon e Paola Rodrigues*

bus dfMuito se tem debatido recentemente sobre os casos de agressão às mulheres dentro do transporte público por todo o país. Acompanhamos e participamos indignadas dessa importante campanha que pretende conscientizar sobre o que deveria ser óbvio: o transporte é público, o corpo da mulher não e exige respeito. Porém, junto com isso, precisamos dizer: a rua também não nos torna públicas e, além da luta feminista, o Poder Público deve fazer sua parte para garantir a segurança e autonomia das mulheres.

Nesse sentido, semana passada no Distrito Federal, foi aprovado a Lei que determina que os ônibus, após as 22 (vinte e duas) horas, devem parar obrigatoriamente onde as mulheres transportadas solicitarem, desde que, dentro do trajeto da linha, mas mesmo fora das paradas oficiais. Além disso, as empresas de ônibus deverão dispor deste aviso em local visível dentro dos coletivos para que as usuárias conheçam e usufruam deste direito. Veja a notícia aqui.

Violentar verbal ou fisicamente uma mulher no transporte ou na rua é inaceitável, porém recorrente – visto que boa parte dos estupros no país acontece com mulheres que estão indo ou voltando do trabalho ou estudo. No caminho de casa, no trabalho, na rua, na festa ou dentro do transporte as mulheres sofrem diariamente com piadinhas sexuais, buzinadas, preconceitos se estão sozinhas em um horário – considerado pelo senso comum – “tarde para uma mulher sozinha”, “encoxadas”, serem seguidas, passadas de mão e os mais diferentes e piores assédios. Todas nós que utilizamos o transporte público já vivenciamos agressões dentro ou fora dos mesmos, uma pauta concreta que traz demandas concretas!

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Apesar de a mídia tratar como um dado e impressionante isso não é novidade para nenhuma mulher trabalhadora e ou estudante, e essas há muito reivindicam (sempre pouco ouvidas) iluminação pública existente e funcionando; ônibus com mais linhas periféricas e solícitas às necessidades das mulheres, dos que sofrem opressão e ou preconceito; campanhas de conscientização contra a agressão e pela igualdade e diversas outras medidas que são extremamente importantes e possíveis de realização que apesar de simples e óbvias mudariam muito a vida da maioria das brasileiras.

Segundo o Instituto de Pesquisa e Economia Aplicada (IPEA), apenas metade dos domicílios brasileiros possui meio de transporte motorizado e ainda assim, muitas vezes este é utilizado apenas ou principalmente pelos homens do domicílio – já que a disparidade social e de salários ainda é grande em todo o país e em todos os níveis de escolaridade.

Também segundo o IPEA, a maioria dos brasileiros ainda acredita que a mulher influencia no ato criminoso, hediondo e irracional do estupro, logo, toda mulher na rua corre certo grau de perigo e é preciso freá-lo. Essa pesquisa responsabiliza o comportamento e ou a roupa da mulher em 26,1% pelo estupro[1], então, responsabiliza a mulher por sua simples existência, pois não há como explicar – de forma aceitável – qual tipo de roupa ou comportamento levaria a uma agressão animalesca contra o corpo, a psicologia, à vontade e a autonomia da pessoa como o estupro. Discordamos veementemente dessa opinião e identificamos o estupro com a opressão machista que objetifica e desqualifica a mulher e faz alguns agirem e pensarem como se esta pudesse ser tomada e utilizada sem direito à opinião, como se a mesma não fosse uma pessoa com história, vontades e direitos.

paradaSomos parte dos 65% que lutam pela garantia de segurança à mulher e avanço de consciência de gênero. Entendemos que a violência, os baixos salários, dificuldades de transporte eficiente e gratuito e o estupro não atingem apenas as mulheres, porém, estas sofrem um tipo específico de violência, opressão e preconceito que precisa de ações e políticas específicas. Isso é comprovado por dados de fontes reconhecidas que mostram que a cada doze segundos uma mulher no país é vítima de violência[2], as mulheres são os maiores números registrados de estupros – sem contar os não registrados, a mulher é a maioria dos casos de miséria, dupla jornada, precarização no trabalho[3], desemprego, menores salários para os mesmos cargos (de 11% a 14% de diferença[4]) e ainda quem faz a maioria dos trabalhos nos lares compartilhados com homens[5].

Vivemos em um país onde a presidente Dilma Roussef que é mulher e ex-militante, avançou muito pouco nacionalmente nas pautas feministas, sendo recorrentes campanhas – na maioria das vezes paliativas e ou mal divulgadas – apenas após casos extremos de violência acontecer às mulheres. Assim como no poder nacional, a descentralização regional também, na maioria, não atenta a essa pauta precarizando as delegacias da mulher, a saúde da mulher, dentre outros.

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Além de simples e concreta, mesmo que paliativa, a pauta da parada do transporte traz para o debate, avança a consciência feminista e fomenta ações para diversas outras pautas feministas e da luta social em geral; como a igualdade entre gêneros, a violência contra a mulher, o feminicídio (homicídios femininos ligado ao gênero especificamente configurando crimes de ódio, como são também os crimes por racismo ou homofobia), segurança não militarizada, ciclovias, diferença salarial entre gêneros, diferença entre o avanço propagandeado da mulher burguesa acompanhada da desatenção às pautas da mulher estudante e ou trabalhadora, problemas diversos do transporte público (diferenciação de oferta de linhas e horários para bairros periféricos, preconceito e violência dentro deste, licitação para um transporte verdadeiramente público e pautado pela sociedade), dentre outros.

Esperamos que esta Lei seja cumprida, mas não apenas esperamos, lutaremos para que se efetive e se estenda para todo o país! Lutamos diariamente para que cada vez mais haja consciência de igualdade, que leve a respeito para as mulheres, sejam nas pautas concretas, seja no avanço de consciência.

*Daniela e Paola são militantes das Juntas! de Porto Alegre e do Distrito Federal, respectivamente.

[1] Fonte: <www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/04/1435877-pesquisa-que-indica-apoio-a-ataques-a-mulheres-esta-errada-diz-ipea-so-26-concordam.shtml>.

[2] Fonte: <www.noticias.r7.com/brasil/a-cada-12-segundos-uma-mulher-sofre-violencia-no-brasil-informa-secretaria-de-politicas-para-mulheres-02082013>.

[3] NOGUEIRA, C. M. A feminização no mundo do trabalho: entre a emancipação e a precarização. In: ANTUNES, R.; SILVA, M. A. M. (Orgs.). O avesso do trabalho. São Paulo: Expressão Popular, 2010.

[4] Fonte: <www.oglobo.globo.com/economia/mulher-ganha-menos-em-qualquer-trabalho-7095657>.

[5] Fonte: <www.agenciapatriciagalvao.org.br/pesquisa/>.


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