A luta contra o racismo no Brasil exige o combate a mecanismos que buscam manter a população negra na marginalidade e submetidas a um regime de exploração. Por isso, a luta contra a privatização dos presídios é uma urgência.
No mundo todo, o sistema prisional vem sendo utilizado como uma arma contra a população negra. No Brasil, dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública apontam que, em 2022, 68,2% das pessoas encarceradas eram negras, e essas pessoas são punidas para muito além do cárcere.
Pessoas encarceradas são estigmatizadas durante toda a vida, sendo constantemente taxadas como criminosas, mesmo após o cumprimento da pena judicialmente estabelecida, o que se reflete na dificuldade em encontrar emprego, por exemplo. Uma das razões para essa situação é a existência de um judiciário seletivo e racista, que é mais duro contra pessoas negras e pobres, enquanto é leniente com membros das elites econômicas.
Com a privatização dos presídios, corpos negros se tornam mercadoria. Isto porque, quanto mais pessoas presas, mais lucrativo será às empresas responsáveis pelos complexos prisionais, já que o Estado remunera essas empresas de acordo com o número de pessoas encarceradas.
A privatização só é boa para as empresas: com ela, o Estado gastará um valor por preso muito maior do que o valor em presídios estatais. Todo esse dinheiro vai para os bolsos da iniciativa privada, sem que isso signifique uma melhoria nas condições do sistema prisional. Ao contrário, diversos problemas e violações de direitos humanos foram reportados em presídios privatizados no Brasil, como o de Ribeirão das Neves/MG e o presídio Anísio Jobim, em Manaus/AM.
As empresas também ganham ao estabelecer contratos em que fornecem mão de obra de pessoas encarceradas. Quanto mais gente presa, mais mão de obra barata a ser fornecida para o setor privado, acentuando a superexploração do trabalho de pessoas negras.
Mesmo assim, este ano o governo Lula não apenas deu continuidade ao projeto de privatização do complexo prisional de Erechim, no Rio Grande do Sul, como deu diversos incentivos para atrair empresas dispostas a participar do projeto – dado que, em 2022, sob o governo de Bolsonaro, um leilão já havia sido realizado, mas nenhuma empresa havia participado. O projeto, que prevê que a empresa privada deverá construir o presídio de Erechim e auxiliar em sua gestão, será realizado com uso de dinheiro público. A partir do decreto n. 11.498/2023, assinado por Geraldo Alckmin, o governo autorizou incentivos para a exploração do sistema prisional por empresas privadas. Além disso, o complexo prisional de Erechim será construído com financiamento do BNDES. Ou seja: é dinheiro público sendo destinado ao setor privado, enquanto falta investimento em saúde, educação e outros direitos sociais a quem mais precisa.
A experiência de países como os Estados Unidos demonstra que essa política acentua o número de pessoas encarceradas. Isso, contudo, não resolve o problema da segurança pública. No Brasil, as prisões, longe de promoverem a reeducação e a reinserção das pessoas à sociedade, servem como verdadeiras escolas do crime, fortalecendo as organizações criminosas e o crime organizado. Um programa antirracista para o Brasil deve estar comprometido com o combate a privatização dos presídios.