5 anos de cotas na UFRGS, é preciso manter e ampliar!
Na sexta-feira, 20 de julho, cinco anos depois a UFRGS reavalia a adesão as cotas. Mais uma vez é hora de os estudantes darem aula e vencerem o conservadorismo e o racismo por uma universidade pública, gratuita, de qualidade e POPULAR!
* Juliano “Guly” Marchant e Manuela Miranda
O recente período democrático do Brasil tem possibilitado a organização de mobilizações de grupos sociais da sociedade civil em prol de pautas importantes e que por muito tempo foram esquecidas pelos governos. As pautas do movimento negro estão entre elas. Com mais de trezentos anos de luta, o povo negro vê poucos avanços efetivos no enfrentamento ao racismo social e institucional. Hoje podemos citar as ações afirmativas como principais medidas encontradas pelos movimentos sociais e pelo Estado para combater o racismo. A titulação dos territórios quilombolas e a reserva de vagas em universidades públicas são as de maior ênfase.
Nas últimas décadas ocorreram alguns fatos importantes frutos de múltiplos esforços. Cabe citar a Marcha Zumbi dos Palmares contra o racismo, pela Cidadania e a Vida realizada em 1995 que reuniu 30 mil pessoas em Brasília. Essa mobilização, organizada pelo Movimento Negro, propiciou a articulação de projetos institucionais, voltados para os direitos culturais, econômicos e sociais da população negra brasileira. O que pode ser visto em outro momento importante, a 3ª Conferência Mundial contra o Racismo, Discriminação, Xenofobia e Intolerâncias Correlatas, realizada na cidade de Durban, África do Sul, em 2001. Na ocasião o estado brasileiro assumiu ser um país racista e se comprometeu a aplicar medidas efetivas para combater o racismo na sociedade brasileira.
Observou-se a baixíssima presença de negros nas instituições de ensino superior, independente da origem escolar. O que reforçou as teorias daqueles que reivindicavam maior atenção a comunidades negras. A proibição de frequentar escolas instituída no passado mostrava suas consequências no presente. Não é novidade que entre os índices de analfabetismo haja um enorme percentual de negros. Assim é fácil compreender porque mais de 70% dos 10% mais pobres no Brasil são negros e 75% dos 10% mais ricos são brancos.
No ano de 2001, mesmo ano da Conferência de Durban, a Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ) foi a primeira a adotar o sistema de reserva de vagas, o projeto havia sido aprovado na Assembleia Legislativa do estado do Rio de Janeiro. Na sequência, em 2004, a Universidade Nacional de Brasília (UnB) foi a primeira universidade federal a implementar o sistema de cotas no seu vestibular. Unicamp, Unifesp e UFRJ foram na mesma seguiram a lógica. A universidade pública começou a ficar popular.
A adesão das cotas nas universidades federais, até então um espaço para poucos e privilegiados, foi se aproximando cada vez mais ao Brasil que vemos nas ruas, com suas várias cores. O conservadorismo estava presente em muitos professores e membros dos Conselhos Universitários eram a representação dos ideais elitistas e racistas. Mobilizados e com mais de trezentas pessoas, em 7 de junho de 2007, os estudantes ocuparam a reitoria da UFRGS. A saída da reitoria só seria realizada quando as suas solicitações fossem atendidas pelo reitor da universidade, na época José Carlos Ferraz Hennemann.
No dia 25 de junho de 2007 um muro, que fica em frente ao campus central da UFRGS, amanheceu pichado com a seguinte frase: “Lugar de negro é na cozinha do R.U (restaurante universitário). Cotas Não!”. Não obstante a frase ser de caráter extremamente racista, uma cruz suástica acompanhava-a. O ambiente em toda sociedade gaúcha ficou polarizado, ser contra as cotas não era mais falta de conhecimento, e sim preconceito. Outras frases como “voltem para a senzala”, em uma calçada do campus central, e “macaco é no zoológico!”, em um muro na frente da faculdade de engenharia. Mesmo grupo que em 2010 conseguiu chegar ao diretório central dos estudantes (DCE) da universidade, em uma gestão cheia de polêmicas, suspeita de corrupção, cuja prestação de contas não foi entregue.
Contudo, no dia 29 de junho de 2007, após seis horas de reunião, com 43 votos a favor e contra 27, o CONSUN aprovou a implantação do sistema de cotas na UFRGS. O sistema aprovado destinava uma reseva de 30%, do qual 15% seriam para estudantes de escola pública e outros 15% estudantes de escola pública auto-declarados negros. Também foi aprovada na ocasião a reserva de vagas para indígenas, contemplando assim os grupos mais perseguidos e ceifados dos seus direitos na história do país.
O sistema aprovado não foi exatamente o defendido pelos setores pró-cotas, por não haver a desvinculação de escola pública e autodeclarado negro e manter os colégios militares e que possuem seleção de entrada na lista de escolas públicas. O racismo não vê classe social e ao não considerar os estudantes negros oriundos de escolas privadas na aplicação das cotas, não combate de fato o racismo existente na sociedade. Além disso, a retirada dos colégios militares é uma medida necessária, pois tais colégios recebem duas verbas, uma do ministério da educação (MEC) e outra do exército, além de possuirem um plano pedagógico diferente das diretrizes do MEC e não serem subordinados ao ministério.
Em 2008 vieram os primeiros cotistas. Muitos jovens, advindos da periferia, negros, estudantes de escolas públicas puderam, pela primeira vez, acreditar que seria possível o acesso a uma universidade pública e que era possível sim transformar a realidade de sua família, de sua comunidade e também de sua universidade. Encontraram no ensino a chance que foi negada a seus familiares por várias gerações e viram que nada deve parecer impossível de mudar.
Na sexta-feira, 20 de julho de 2012, às 8h30min, o CONSUN se reunirá mais uma vez, cinco anos após a aprovação das cotas os conselheiros tem a difícil tarefa de rever o efeito das cotas na universidade e na sociedade como um todo. O conservadorismo de 2007 não foi vencido, ainda está presente em muitos membros do conselho. Mas o legado destes cinco anos, que, sim, apresentou falhas, falhas de estrutura institucional, deve-se dizer que provou a necessidade das cotas. Está nas mãos dos cotistas e daqueles que compreendem a importância desse mecanismo o importante papel de defender o legado e propor os avanços. Mais uma vez é hora de os estudantes darem aula e vencerem o conservadorismo e o racismo por uma universidade pública, gratuita, de qualidade e POPULAR!
Vídeo da ocupação da reitoria da UFRGS em 2007
*Juliano e Manuela são militantes do Juntos! Igualdade Não Tem Cor RS e do DCE da UFRGS