PABLO IGLESIAS: A democracia frente ao medo
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PABLO IGLESIAS: A democracia frente ao medo

Análise de Pablo Iglesias, dirigente do PODEMOS, sobre a nova situação política aberta no Sul da Europa pela possibilidade do Syriza chegar ao governo da Grécia daqui um mês.

Pablo Iglesias 30 dez 2014, 12:14

*Pablo Iglesias

Dizia Antônio Gramsci que o Estado é apenas uma trincheira avançada, atrás da qual se assenta a robusta cadeia de fortalezas e fortins da sociedade civil. Robert Cox primeiro e a escola de Amsterdã depois adaptaram a teoria do gênio sardo às relações internacionais e à compreensão da União Europeia, para concluir a existência de algumas elites transnacionais europeias vinculadas a poderes financeiros capazes de dominar hegemonicamente a vontade de qualquer Estado da União, e não apenas digamos de um Estado do Sul.

Ambos os limites à soberania popular que se cristaliza no Estado são tão certos para Grécia como para a Espanha; Alexis Tsipras sabe disso também, da mesma forma que nós. E, no entanto, quão nervosas ficaram as bolsas europeias ante a possibilidade de os gregos primeiro e de os espanhóis depois votarem em liberdade e entregarem essa trincheira avançada aos defensores da soberania e dos direitos sociais. Será que as elites europeias e os poderes financeiros, aos quais representam, temem perder de súbito o poder dos Estados do Sul se os de sempre não ganham as eleições? Será que elas não fazem ideia do que pode acontecer na Europa se Syriza governa e as coisas melhorarem para os gregos? Será que temem que depois dos gregos chegue a vez de os espanhóis votarem? Será que lhes causa preocupação que em um ou dois anos poderosos movimentos populares possam defender as conquistas dos governos da mudança? Será que temem a re-emergência de uma sociedade civil europeia que reivindique as bases sociais e democráticas do sonho europeu que nos deixou o antifascismo?

Ao final, resultará que o Estado é mais importante do que parece quando os consensos assentados durante mais de 40 anos de domínio das finanças demonstram estar explodindo pelos ares. As elites e seus partidos estão nervosos; logo veremos de que maneira, frente à emergência do soberanismo do Syriza, o PP e e CIU dirão exatamente o mesmo e voltarão a selar a aliança das contas bancárias em paraísos fiscais (a exemplo de Cambó).

Nos próximos dias, veremos os fundos de investimentos agitarem o medo para tratar de influenciar o o voto dos gregos e veremos os seus partidos, quer se chamem Nova Democracia ou PP, PASOK ou PSOE, repetirem que  é preciso seguir fazendo o mesmo que nos tem levado para o desastre. Contudo, existem momentos na história nos quais a democracia se impõe sobre o medo. Alexis sabe, assim como nós, que ganhar as eleições não é tomar o poder e que a margem de ação no atual e inevitável marco da União Europeia é pequena. No entanto, Alexis sabe também, assim como nós, que sopram ventos de mudança e que os povos do Sul da Europa e suas forças políticas soberanistas estão dispostos a alterar o rumo e avançar na direção de uma Europa onde a justiça social e a soberania popular sejam as bases de uma democracia que saberá se impor sobre o medo.

Pablo Iglesias é secretário-geral do PODEMOS, partido espanhol recém-formado no bojo do movimento dos indignados e que já aparece como forte concorrente a assumir o governo da Espanha nas próximas eleições

Fonte: El Mundo

(Tradução: Charles Rosa)


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