A atualidade dos jargões
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A atualidade dos jargões

Quem conhece alguma militante do movimento feminista já deve ter ouvido a máxima “somos mulheres e não mercadoria”. É bastante comum que as pessoas reclamem do uso recorrente de algumas palavras de ordens, frases de efeitos ou mesmo — porque não? — jargões pelos movimentos sociais em geral. Mas uma matéria chamou minha atenção na […]

Renata Albuquerque 14 set 2011, 23:17

Quem conhece alguma militante do movimento feminista já deve ter ouvido a máxima “somos mulheres e não mercadoria”. É bastante comum que as pessoas reclamem do uso recorrente de algumas palavras de ordens, frases de efeitos ou mesmo — porque não? — jargões pelos movimentos sociais em geral. Mas uma matéria chamou minha atenção na internet, e achei prudente escrever sobre o caso.

Um jargão é uma expressão utilizada por um determinado grupo social que pode ou não ser compreendida por sujeitos estranhos ao grupo. No caso do movimento feminista e do “somos mulheres e não mercadoria” acredito que as duas coisas sejam verdadeiras.

A manchete era a seguinte: “Chineses solteiros pagam até US$6 mil por esposas virgens”. A totalidade do texto é repreensível e discuti-lo em detalhe poderia tomar longas sessões de debate. Mas sugiro atenção ao início do texto, quando @ jornalista, em tom quase científico, revela que o estímulo ao mercado de noivas virgens seria o “desequilíbrio de gêneros na China”, motivado, especialmente, pela prática de “aborto seletivo” de fetos de mulheres – característica “daquela sociedade”.

A confusão do texto é generalizada: aponta-se o tal do desequilíbrio (que se é ou não verdadeiro, não vem ao caso) que é diagnosticado como um efeito de uma ordem cultural. Mas a respeito de toda a lógica machista (violentamente machista) que organiza o processo, não se fala nada! Toma-se como natural que a solução ao problema do “desequilíbrio de gêneros” seja a compra de mulheres.

O que mais me preocupa é perceber em que sentido a mencionada máxima do movimento feminista pode ser lida como um jargão. Será que mesmo após tantos anos de sua utilização em diversos momentos ainda não é compreensível a tod@s, mesmo da maneira mais superficial possível, que as mulheres não são mercadorias?

Ao menos por isso o texto teve sua relevância: me lembrou da atualidade das pautas e bandeiras do movimento feminista; da necessidade diária de mobilização contra as opressões igualmente cotidianas. Enquanto fomos vendidas, traficadas, mercantilizadas (além de violentadas, estupradas e oprimidas) permanecem as nossas lutas e os nossos desafios.

Nossa tarefa mais atual é bradar que nós somos mulheres, não somos mercadorias.

Link para a matéria: http://www1.folha.uol.com.br/mundo/974989-chineses-solteiros-pagam-ate-us-6-mil-por-esposas-virgens.shtml


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