A Crise Bancária é uma Crise do Capitalismo
Crédito: Reuters

A Crise Bancária é uma Crise do Capitalismo

“O que é o crime de roubar um banco comparado com o crime de fundar um banco?” – Bertolt Brecht

Labiba Chowdhury e Victor Luccas 31 mar 2023, 10:39

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Estamos enfrentando a maior crise bancária desde 2008. Trabalhadores em todo o mundo estão observando apreensivamente enquanto a crise iminente se aproxima e os principais bancos vão à falência. O Silicon Valley Bank (SVB) foi o primeiro a entrar em colapso em 10 de março e é o maior banco a falir desde a crise financeira de 2008. O Credit Suisse e outros também entraram em colapso desde então e agora nos deparamos com as seguintes questões: Por que isso está acontecendo? Como isso afetará as pessoas da classe trabalhadora em todo o mundo? O que podemos fazer para evitar crises como essa?

O SVB era um credor especializado em startups e a 16ª maior instituição financeira dos EUA, com mais de U$ 200 bilhões em ativos. Ele faliu devido a uma “corrida bancária” – grande parte de seus depositantes retirou seu dinheiro ao mesmo tempo devido ao medo de que o banco se tornasse insolvente, uma profecia auto-realizável, evidenciando a instabilidade do capitalismo. Uma das muitas razões do medo foi a queda do valor dos ativos do SVB. O aumento das taxas de juros levou à queda do valor dos ativos do SVB porque uma quantidade significativa de investimentos do SVB foi em títulos e empréstimos de taxa fixa, que perdem valor quando as taxas de juros aumentam. Muitos estão dizendo que o SVB estava fadado à falência, não é preciso muita investigação para ver que essa instituição nunca deveria ter existido. Cerca de 89% dos US$ 175 bilhões depositados no banco não estavam assegurados. Tudo isso culminou com o saque de U$ 42 bilhões em 48 horas e a falência do SVB.

Por que devemos nos preocupar com um banco localizado no Vale do Silício? O SVB foi apenas o primeiro a falir, criando um efeito cascata internacional. Dois dias após a falência do SVB, os reguladores dos Estados Unidos fecharam outro banco, o Signature Bank. Depois de alguns dias, foi o Credit Suisse, banco internacional classificado como “too big to fail” (grande demais para falir). Outros bancos estão enfrentando o mesmo problema, como o First Republic Bank, cujas ações caíram mais de 70%.

Como foi a Intervenção Governamental?

As consequências dessas falências seriam enormes, por isso os governos dos Estados Unidos e da Europa injetaram dinheiro no sistema bancário para salvá-lo. Agora, os bancos podem pegar empréstimos no Federal Reserve tendo seus títulos da dívida como garantia. O FED já emprestou mais de US$ 300 bilhões em fundos emergenciais aos bancos nas últimas semanas. Em contrapartida, o salário mínimo federal, por exemplo, é de apenas U$ 7,25 por hora sem nenhum reajuste desde 2009 e os programas sociais são pouco estimulados enquanto o governo socorreu mais de 50 bancos nesses anos. A famosa privatização dos lucros e a socialização das perdas, sempre há dinheiro para os capitalistas, mas nunca para o povo.

Por outro lado, apesar do apoio de US$ 30 bilhões, as ações do First Republic Bank caíram quase 33%. John Petrides, gerente da Tocqueville Asset Management, disse que “possivelmente o mercado está procurando uma venda/comprador total e não uma injeção de capital”. Mas qualquer gestão de bancos privados está exposta ao risco de uma crise financeira, é inerente ao capitalismo.

De modo semelhante, o Credit Suisse pegou um empréstimo de quase 50 bilhões de francos suíços do Banco Nacional da Suíça, mas não foi o suficiente para salvá-lo do colapso. No fim das contas, o governo obrigou o UBS, seu principal concorrente, a comprá-lo por apenas U$ 3,2 bilhões. O conhecido processo capitalista de centralização do capital.

“Com a diminuição constante do número de magnatas do capital, que usurpam e monopolizam todas as vantagens desse processo de transformação, aumenta a massa da miséria, da opressão, da servidão, da degeneração, da exploração, mas também a revolta da classe trabalhadora, que, cada vez mais numerosa, é instruída, unida e organizada pelo próprio mecanismo do processo de produção capitalista. O monopólio do capital se converte num entrave para o modo de produção que floresceu com ele e sob ele. A centralização dos meios de produção e a socialização do trabalho atingem um grau em que se tornam incompatíveis com seu invólucro capitalista. O entrave é arrebentado. Soa a hora derradeira da propriedade privada capitalista, e os expropriadores são expropriados.”

– Karl Marx. O Capital, Capítulo 24.

Quais as Consequências para o Brasil?

Devido ao aspecto internacional do capitalismo, todo esse processo afeta o Brasil. A política monetária internacional restritiva combinada ao aliado de Bolsonaro na presidente do Banco Central do Brasil nos levam a ter a maior taxa de juros real do mundo, nominalmente em 13,75%. Isso está desacelerando tanto a economia que as montadoras concederam férias coletivas forçadas a seus funcionários (devido às leis trabalhistas e aos sindicatos do Brasil, os trabalhadores recebem seus salários, ao contrário dos EUA), o que é um sintoma precoce de corporações fechando. Como a Ford que fechou as portas no Brasil em 2022 deixando mais de 5000 pessoas desempregadas. Além das baixas apresentadas na bolsa de valores do Brasil, refletindo as falências dos EUA. O objetivo da alta de juros seria reduzir a inflação às custas do aumento do desemprego e da estagnação da economia. No final, enquanto os bancos são resgatados, as pessoas da classe trabalhadora são deixadas à própria sorte diante do desemprego e do aumento das despesas de vida devido à inflação persistente.

Nesta semana, o mercado pareceu se recuperar e aliviar o estresse do sistema financeiro. Embora na última quarta-feira, 22/03, o FED tenha aumentado a taxa de juros em 0,25% para 5%, a maior desde 2006. A Inglaterra e a Suíça também aumentaram suas taxas de juros para a maior taxa desde 2008. Por enquanto temos que esperar para ver seus efeitos e em que medida a crise se intensificará.

Agências Reguladores no Capitalismo não são Suficientes

Em 2010, após a crise financeira de 2008, o governo dos EUA aprovou a Lei Dodd-Frank, que regulava os bancos e impedia a tomada de riscos excessivos. Então, começou a campanha do setor bancário para revogar as regulamentações. Lobistas e executivos de bancos fizeram campanha alegando que os regulamentos os prejudicavam enquanto desfrutavam de lucros recordes. Os bancos comerciais também investem milhões de dólares em eleições para eleger políticos que estão em seus bolsos. De fato, os bancos comerciais investiram mais de U$ 47 milhões nas eleições federais de 2016. Com seus milhões de investimentos ​​em 2018, o congresso reverteu os regulamentos passando a serem aplicados a menos de dez bancos nos EUA, apenas oito anos após a Lei Dodd-Frank passado.

Mesmo quando o governo aprova regulamentos sobre bancos comerciais, eles são rapidamente revogados, resultando em um sistema econômico com ciclos intermináveis ​​de crises financeiras. Sob o capitalismo, o governo serve ao capital e aos interesses da classe capitalista, não da classe trabalhadora. Assim o governo prioriza os lucros de curto prazo dos bancos comerciais acima de tudo, mesmo acima dos meios de subsistência das pessoas e de possíveis crises financeiras futuras.

Precisamos Combater e Estatizar os Bancos

A catástrofe econômica que se aproxima é certa. Professores de finanças da Columbia University, Kellogg Institute e Stanford University, publicaram um estudo revelando que outros 190 bancos americanos podem ir à falência. Esta não é uma crise isolada, é um sintoma da crise do capitalismo como um todo. Como a guerra imperialista na Ucrânia, os ataques à previdência na França e a ascensão de políticos autoritários como Bolsonaro, Trump, Dina Boluarte e Netanyahu. Não há saída para a crise dentro do sistema capitalista. Mas o povo resiste e luta nas manifestações do Peru, fazendo greve na França, Inglaterra, Grécia, Palestina, Israel e outros.

Bancos comerciais no valor de centenas de bilhões de dólares têm um poder antidemocrático e não deveriam existir. A fome e os bilionários não deveriam existir. Precisamos combater os bancos e avançar para a estatização do sistema financeiro. Juntos vamos construir um mundo que coloque as pessoas acima do lucro e lutar pela Auditoria da Dívida Pública, Estatização do Sistema Financeiro e Taxação dos Ricos!

“O que é o crime de roubar um banco comparado ao crime de fundar um banco?”

– Bertolt Brecht

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The Banking Crisis is a Crisis of Capitalism 

“What is the robbing of a bank compared to the founding of a bank?” – Bertolt Brecht 

We are facing the largest banking crisis since 2008. Working class people around the world are apprehensively watching as the looming crisis approaches and major banks go bankrupt. Silicon Valley Bank (SVB) was the first to collapse on March 10th and is the largest bank to fail since the 2008 financial crisis. Credit Suisse and others have also collapsed since then and now the questions facing us are: Why is this happening? How will this affect working class people around the world? What can we do to avoid crises like this?

SVB was a startup focused lender and the 16th biggest financial institution in the US with more than U$200 billion of assets. It failed due to a “bank run”- a large portion of its depositors withdrew their money at the same time due to fears that the bank would become insolvent, a self fulfilling prophecy and clear example of the instability of capitalism. One of the many sources of fear was the falling value of SVB’s assets. Increasing interest rates led to the value of SVB’s assets falling because a significant amount of SVB’s investments were in fixed-rate bonds and loans, which lose value when interest rates increase. Many are saying that SVB was bound to fail, it doesn’t take much inspection to see that this institution should never have existed in the first place. About 89% of the bank’s $175 billion in deposits were uninsured. All of this culminated in people withdrawing U$42 billion from SVB in 48 hours and SVB going bankrupt.

Why should we care about a localized bank in Silicon Valley? SVB was only the first to fall, setting up an international ripple effect. Two days after SVB went bankrupt, US regulators closed another bank, Signature Bank. After a few days, it was Credit Suisse, an international bank that is classified as “too big to fail”. Other banks are facing the same problem, like the First Republic Bank whose stocks had fallen more than 70%.

What Has Government Intervention Looked like?

The consequences of these bankruptcies would be huge, therefore the US and European governments injected money into the bank system to save it. Now, banks can borrow money from the Federal Reserve having their treasuries as collateral. The FED has already lent more than U$ 300 billion in emergency funds to banks in the past few weeks. In contrast, the federal minimum wage, for example, is only U$7.25 per hour without any adjustment since 2009 and social programs are barely stimulated while the government has bailed out more than 50 banks in this period. This is the privatization of profits and socialization of losses, there is always money for the capitalists but none for the working class.

On the other hand, despite U$30 billion support, First Republic Bank shares have tanked almost 33%. John Petrides, manager of Tocqueville Asset Management, said that “possibly the market is looking for an all-out sale/buyer rather than an injection of capital”. Any management by private banks are exposed to risk of a financial crisis, it is intrinsic to capitalism. 

Similarly, Credit Suisse borrowed nearly 50 billion Swiss Francs from the Swiss National Bank, but it wasn’t enough to save it from melting down. In the end, the government forced UBS, its major competitor, to buy it for only U$3.2 billion. This is the capitalism process of centralisation of capital.

“Along with the constantly diminishing number of the magnates of capital, who usurp and monopolise all advantages of this process of transformation, grows the mass of misery, oppression, slavery, degradation, exploitation; but with this too grows the revolt of the working class, a class always increasing in numbers, and disciplined, united, organised by the very mechanism of the process of capitalist production itself. The monopoly of capital becomes a fetter upon the mode of production, which has sprung up and flourished along with, and under it. Centralisation of the means of production and socialisation of labour at last reach a point where they become incompatible with their capitalist integument. This integument is burst asunder. The knell of capitalist private property sounds. The expropriators are expropriated.”

– Karl Marx. Capital, Chapter 24.

How will this affect Brazil?

As capitalism is international, all of this affects Brazil. The international restricted monetary policy together with Bolsonaro’s ally as the President of the Brazil Central Bank led us to have the highest real interest rate in the world, nominally at 13,75%. This is slowing down the economy so much that car assemblers gave forced, collective vacations to their employees (due to strong labor laws and unions, it is illegal to furlough workers in Brazil, unlike in the US), which is an early symptom of corporations closing down. For example, Ford did the same and then closed their doors in Brazil in 2022 leaving more than 5000 people unemployed. Now, Brazil’s stock exchange is falling, reflecting US bankruptcies. The goal of the government is to reduce inflation at the expense of increasing unemployment and stagnating the economy. In the end, while the banks will be bailed out, working class people are left to fend for themselves in the face of unemployment and rising living expenses due to persisting inflation. 

This week the market seemed to recover itself and relieve the stress on the financial system. Although last wednesday, 03/22, the FED hikes interest rate by 0.25% to 5%, the highest since 2006. England and Switzerland also hiked their interest rate to the highest since 2008. We have to wait and see its effects and to what extent the crisis will intensify. 

Regulating Corporations Under Capitalism Is Not Enough 

In 2010, after the 2008 financial crisis, the US government passed the Dodd-Frank Act, which regulated banks and prevented excessive risk taking. Then, began the banking sector’s campaign to rollback regulations. Bank lobbyists and executives campaigned claiming that the regulations hurt them while enjoying record profits. Commercial banks also invest millions of dollars in elections to elect politicians that are in their pockets. In fact, commercial banks invested over U$47 million in federal elections in 2016. Their millions in investment paid off in 2018, congress rolled back the regulations to apply to less than ten out of thousands of banks in the US, just eight years after the Dodd-Frank Act passed. 

Even when the government passes regulations on commercial banks, they are quickly repealed, resulting in an economic system with endless cycles of financial crises. Under capitalism, the government serves capital and the interests of the capitalist class, not working class people. And so the government prioritizes the short term profits of commercial banks over all else, including people’s livelihoods and potential future financial crises. 

We Need to Break the Banks and then Nationalize Them

The incoming economic catastrophe is certain. Financial professors of Columbia University, Kellogg Institute and Stanford University, published a study revealing that another 190 American banks can go bankrupt. This is not an isolated crisis, it is a symptom of the crisis of capitalism as a whole, like the imperialist war in Ukraine, the attacks on welfare in France and the rise of authoritarian politicians like Bolsonaro, Trump, Dina Boluarte and Netanyahu.  There is no way out of these crises within the capitalist system. But we see people struggling in manifestations in Peru, striking in France, England, Greece, Palestine, Israel and others. 

Commercial banks worth hundreds of billions of dollars have undemocratic power and should not exist.  The hunger and the billionaires shouldn’t exist. We need to break the banks and move towards nationalizing the financial system. Together, let’s build a world that puts people over profit and fight to Audit Public Debt, Nationalize the Financial System and Tax the Rich!

“What is the robbing of a bank compared to the founding of a bank?”

– Bertolt Brecht

Labiba Chowdhury, student at City College of New York and member of Bread and Roses caucus of DSA
Victor Luccas, member of Juntos! SP and PSOL


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