DEZ ANOS DA PRIMAVERA SECUNDARISTA – COMO A RESPOSTA DAS OCUPAÇÕES VEIO EM ATAQUES VELADOS
Reprodução: Projeto Colabora

DEZ ANOS DA PRIMAVERA SECUNDARISTA – COMO A RESPOSTA DAS OCUPAÇÕES VEIO EM ATAQUES VELADOS

Os ataques na educação de Tarcísio 10 anos depois das ocupações de escolas em São Paulo

Manu Cavalcanti 6 nov 2025, 15:33

Dez anos após as ocupações nas escolas, o movimento estudantil secundarista nunca esteve tão morno, e nunca vimos tantos ataques simultâneos. Não é por acaso, ao contrário, faz parte de um projeto para esvaziar as ruas e fortalecer a extrema-direita. Para fazer uma análise do atual momento que vivemos, é preciso voltar um pouco no passado, entender a crise de 2008 e seus desdobramentos que se dão até os dias de hoje.

Em 2008 tivemos o que foi a maior crise econômica contemporânea, com bancos dos Estados Unidos declarando falência e Bolsas do mundo todo perdendo valor. O desemprego aumentou rapidamente, e o presidente do Brasil neste ano, Lula, disse que não permitiria que a crise chegasse aqui.

Nesse momento de crise do capitalismo, a esquerda ao redor do mundo tomou fôlego de se organizar, de chamar o povo para as ruas e apresentar uma alternativa, um novo projeto de sociedade. A manifestação mais emblemática é, com certeza, a Primavera Árabe, que aconteceu em 2010 e é até hoje bastante referenciada como exemplo de revolta popular. Aqui no Brasil, o estopim para as manifestações veio nas Jornadas de Junho de 2013.

Era dito que não havia dinheiro para investir em saúde e em educação, mas, ao mesmo tempo, gastavam milhões em estádios para a Copa no ano seguinte. Em cada estado do país havia uma insatisfação própria, as pessoas sentiam a piora na sua qualidade de vida e, quando os protestos iniciaram em São Paulo contra o aumento da passagem de ônibus (de R$3,00 para R$3,20), ninguém poderia prever que se espalhariam nacionalmente tão rápido. Apesar da forte repressão aos movimentos sociais, acendeu-se uma chama na esquerda, um espírito de luta que demoraria a se apagar.

Dois anos depois, em 2015, São Paulo vivia um ataque violento e explícito à educação com a reorganização escolar proposta por Alckmin. Sua ideia era que as escolas passassem a ser divididas por ciclos escolares, o que causaria o fechamento de 93 escolas, salas de aulas fechadas, ensino noturno encerrado, um impacto também pessoal na rotina dos alunos e de suas famílias. O movimento secundarista, que havia vivido junho de 2013, se indignou fortemente e, inspirados pelos secundaristas do Chile, iniciaram ocupações em suas escolas.

Dormindo diariamente dentro da escola, com comissões de segurança, alimentação, cultura e limpeza para garantir que ocorresse tudo da melhor forma, apoiados por professores, pais e colegas, rapidamente duzentas escolas foram ocupadas no estado. Fato é que nem todas seriam afetadas com o projeto de reorganização, o que nos mostra o elemento primordial desse processo: a solidariedade.

Algumas escolas optaram por ocupar em solidariedade às outras, para fortalecer o movimento. Outras, em São Paulo e nacionalmente, se inspiraram e decidiram ocupar suas escolas trazendo suas pautas próprias: infraestrutura de péssima qualidade, falta de merenda, falta de professor e tantos outros motivos uniram os estudantes de todo o país e, em 2015 e 2016, mais de mil escolas foram ocupadas em todo o país, sendo aproximadamente 850 somente no Paraná. A este processo, foi dado o nome de Primavera Secundarista.

Em São Paulo, as ocupações foram vitoriosas. O Secretário da Educação da época, Herman Voorwald, pediu para sair de seu cargo e o governador Geraldo Alckmin arquivou seu projeto. Nacionalmente, a resposta às ocupações veio de outra forma.

Logo após a Primavera Secundarista, foi criada a proposta do Novo Ensino Médio, vendida como uma forma de o aluno ter uma formação técnica dentro da grade horária do ensino regular. Na prática, o que acontece é a diminuição de aulas das matérias base para a inserção de itinerários formativos, de forma que o aluno não tenha preparo suficiente para prestar vestibulares e se renda à mão de obra barata, além de uma domesticação do movimento estudantil, cortando matérias como sociologia, filosofia e história, que diminui a formação de senso crítico dos jovens. Apesar de o movimento estudantil ter lutado contra o NEM, essa foi uma batalha que perdemos.

No estado de SP, com os movimentos sociais já bastante derrotados, Novo Ensino Médio e pós-Bolsonaro, os maiores ataques surgiram com a eleição de Tarcísio de Freitas para governador. Ele, que aprendeu com as ocupações de escolas, se mostra muito organizado em seus ataques, os fazendo de forma velada o suficiente para não acender revoltas.

A plataformização, que obriga os professores a seguirem um currículo de inteligência artificial, é um passo significativo para o sucateamento da educação, visto que desconsidera rendimento em sala de aula para focar em atividades virtuais que não dizem nada sobre a capacidade do aluno. Seu ataque mais violento, porém, foi ano passado, com a tentativa de militarização das escolas, um projeto abominável que tinha como objetivo colocar policiais no pátio de escolas públicas para fazer rondas, além de ministrar aulas de política e ética.

O projeto de escolas cívico-militares é uma nostalgia das escolas da ditadura militar, além de uma tentativa explícita de oprimir os estudantes e calar o movimento estudantil. Os secundaristas foram às ruas e o governador se viu obrigado a arquivar o projeto, mas nunca abrindo mão dele cem por cento. Seus ataques não pararam por aí e agora, em 2025, ele está resgatando o projeto de reorganização escolar.

Como foi dito, Tarcísio aprendeu muito com a Primavera Secundarista, e não cometeria o mesmo erro de Alckmin. O que iniciou o processo de ocupação foi, justamente, a divulgação da reorganização escolar. Agora, o que Tarcísio vem fazendo é implementando forçadamente o projeto de escolas PEI — ensino integral —, fechando salas uma de cada vez, alegando baixo rendimento e poucas matrículas, encerrando o ensino noturno sem fazer alarde. Dessa forma, com o movimento estudantil já enfraquecido, não parecia um ataque à educação por completo, mas sim um problema local de cada escola, o que não traria motivo para revoltas.

A juventude está cansada. O trabalho é precário, de segunda a sábado e longe de casa, a única opção de muitos é estudar a noite e, com o ensino noturno de tantas escolas sendo fechado, alguns optam por abandonar os estudos. O dia de muitos começa às 05h da manhã e acaba à 00h, o descanso fica para o domingo. Com que forças vamos às ruas? Com que tempo vamos nos organizar? A apatia é um sintoma geral, não porque falta incômodo, mas porque a perspectiva de futuro da juventude está sendo roubada, e parte disso se dá na precarização do ensino.

Nós devemos ser aqueles que apresentarão uma alternativa à juventude, mostraremos aos alunos que é possível construir um futuro bom para nós e vamos reacender a chama dos movimentos sociais, mostrando uma saída dessa crise.


Imagem O Futuro se Conquista

Últimas notícias