Era só mais um Silva
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Era só mais um Silva

Faltando 50 dias para a Copa, a política de “pacificação” da principal cidade-sede do país faz mais vítimas, dentre elas DG.

Iata Mendonça e Nathalie Drumond 27 abr 2014, 12:05

Faltando 50 dias para a Copa, a política de pacificação da principal cidade-sede do país faz mais vítimas, dentre elas DG.

 

por Iata Mendonça* e Nathalie Drumond **

Velório de DG (Foto: Mídia Ninja)

Velório de DG (Foto: Mídia Ninja)

Há 10 meses, onze pessoas foram mortas pela polícia na favela da Maré. No início deste mês, o mesmo complexo foi ocupado pela Força Nacional, a qual já foi acusada pela morte de um jovem de 18 anos. Há cerca de 9 meses, Amarildo de Souza desapareceu após ter sido detido por policiais da UPP da Rocinha. Sabe-se que ele foi torturado até a morte pelos agentes da polícia militar do Rio. Nos últimos anos no Rio de Janeiro, para cada 100 mil habitantes, foram contabilizados 200 homicídios de jovens negros e pobres. Douglas Rafael da Silva Pereira, o ¨DG¨ do programa Esquenta, entrou para esta estatística. O dançarino foi encontrado morto nesta terça-feira, 22 de abril. O corpo do jovem foi reconhecido por populares quando policiais da UPP da Favela do Pavão-Pavãozinho tentavam retira-lo do local onde fora espancado, baleado e morto.

Mas, felizmente, o destino de DG não foi o mesmo ao de muitos corpos que terminam estendidos no chão nas favelas do Rio. A população do Pavão-Pavãozinho decidiu reagir diante da morte de mais um jovem negro, de sobrenome Silva. A revolta tomou conta da comunidade, de familiares, amigos e, sobretudo, de sua mãe, Maria de Fátima. As lutas travadas em 2013, bem como a campanha de denúncia do desaparecimento de Amarildo, serviram de inspiração para os protestos da comunidade.

Manifestação no dia do Enterro de DG. (Foto: Mídia Ninja)

Manifestação no dia do Enterro de DG. (Foto: Mídia Ninja)

Logo em seguida à descoberta da morte de Douglas, a população fechou algumas ruas de Copacabana. Em meio a este conflito, mais um jovem foi baleado e morto pela polícia, Edilson dos Santos. A indignação aumentou ainda mais. Então, o velório e o enterro de DG foram marcados por uma intensa mobilização. Mais de mil pessoas estiveram na cerimônia de despedida do dançarino e a transformaram num bonito protesto também contra a militarização das favelas, a criminalização da pobreza e as injustiças que acontecem no Rio de Janeiro hoje em nome da Copa.

Os governos de plantão (sejam eles comandados por Paes, Pezão ou Dilma) tentam a qualquer custo impor a Copa das empreiteiras, dos grandes patrocinadores e da FIFA. A cidade do Rio de Janeiro para a maioria dos políticos e para os grandes empresários não passa de um tabuleiro do Banco Imobiliário. O único objetivo é valorizar seus investimentos. Sendo assim, ignorando o interesse da maioria da população, decretam leis, sobem estádios, compram e tomam terrenos, removem e desabrigam centenas de famílias, fazem obras que causam um enorme transtorno e injetam boa parte do dinheiro público diretamente em seus meganegócios e empreendimentos. Ao mesmo tempo, tentam esconder a pobreza e as injustiças da cidade debaixo do tapete. Fazem de tudo para que a o Rio transforme-se na cidade vitrine da Copa. E a única forma de calar e conter o pobre e sua indignação é através da força policial. A política de pacificação de Beltrame e seus aliados tem se revelado sobretudo num mecanismo de criminalização da pobreza.

As UPPs (Unidade de Policia Pacificadora), como a muito vem sendo denunciado, não atendem as demandas internas das comunidades. Na verdade, são responsáveis por uma série de abusos,   os policiais intimidam, ameaçam e matam os moradores, como vimos nos casos de Amarildo, Claudia e agora DG, sem contar os inúmeros outros casos que não chegamos a saber. São comuns as duras em trabalhador, tapas na cara, insultos de todos os tipos, assédio às mulheres, agressões a estudantes voltando da escola, invasão de casas sem mandado judicial, repressão e proibição dos nossos bailes e festas, assassinatos, espancamentos. E nos perguntamos atéquando? Não aguentamos mais e nem podemos aceitar a violência do Estado contra pobres negros e favelados. A revolta da população no enterro do DG mostrou que o povo estádisposto a resistir e a lutar por seus direitos.

Homenagem a DG. (Foto: Mídia Ninja)

Homenagem a DG. (Foto: Mídia Ninja)

Não podemos permitir que mais nenhum caso como do dançarino DG, da empregada doméstica Cláudia e do pedreiro Amarildo aconteçam. Três Silvas mortos de maneira bárbara possivelmente todos pelas supostas forças de pacificação. Somamos nossa voz àindignação de milhões contra a repressão promovida pela polícia às favelas do Rio de Janeiro. As favelas precisam de direitos e políticas públicas para lhes assegurar vida digna e não de militarização. A propósito, torna-se cada vez mais urgente a construção de outro modelo de segurança pública, a começar pela desmilitarização das polícias. Nossa maior homenagem a DG serásomar forças a todos aqueles que lutam por justiça para os mortos pela polícia no Rio, aos Amarildos, Cláudias e DGs que tombam todos os dias. Nossa homenagem serálutar para que isto nunca mais aconteça. Somos todos DG!

 

* morador da Rocinha, estudante da PUC e do Juntos Rio

** do Grupo de Trabalho Nacional do Juntos

 

 

 


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