Nota de repúdio à cultura do estupro. Em Porto Alegre ou em qualquer lugar, estupradores não passarão!
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Nota de repúdio à cultura do estupro. Em Porto Alegre ou em qualquer lugar, estupradores não passarão!

Nota de repúdio do Coletivo Juntas RS à cultura do estupro. Em Porto Alegre ou em qualquer lugar, estupradores não passarão!

Clarissa Sommer 30 out 2014, 13:06

Por Clarissa Sommer**

No dia 25/10 a jovem iraniana Reyhaneh Jabbari foi enforcada pelas autoridades do Irã. Ele foi condenada à morte por ter assassinado seu estuprador. Jabbari vivia em uma sociedade machista e fundamentalista, em que os estupros são corriqueiros, e tomou uma atitude desesperada que custou a vida. Alguns diriam: “Nossa, ainda bem que não vivemos no Irã!”.

Bem, sentimos muitos informar, mas verdade seja dita: o caráter liberal atribuído a boa parte das relações no Brasil, a não questionamento de ideias como “aqui as mulheres podem se vestir como quiserem”, ou “aqui a sexualidade não é um tabu”, e a hiperssexualização a qual somos expostas, muitas vezes camuflam relações misóginas e machistas, dissimulam situações de violência, naturalizam o abuso de nossos corpos, e contribuem para nos culpabilizar, como se nós mulheres fôssemos as responsáveis pelo crime cometido por abusadores e estupradores.

Na noite do dia 12/10, domingo, agora aqui no Brasil, em Porto Alegre, em um local por onde passamos muitas vezes, uma menina de 16 anos foi estuprada por dois homens, próximo ao Anfiteatro Pôr do Sol, ao voltar de uma festa gratuita na Usina do Gasômetro. Ela foi socorrida por moradores de rua, que corajosamente tentaram intervir e ainda chamaram a polícia. Os estupradores foram presos em flagrante, um deles ainda sobre o corpo da vítima, que foi internada, desfigurada pelas agressões.

Devido ao flagrante e à atuação dos moradores de rua o fato ganhou notoriedade. Porém, contribuindo para perpetuar a cultura do estupro, diversos veículos de informação publicaram a notícia com ponderações que relativizavam a situação: “ela voltava sozinha de uma festa à noite”, “ela tinha sinais de embriaguez”, “ela saiu sem a companhia do namorado”…

Para piorar a situação, o juiz Paulo Augusto Oliveira Irion mandou soltar um dos acusados, Marlon Patrick Silva de Mello, de 24 anos, argumentando que ele era réu primário, poderia aguardar o julgamento em liberdade, e que o estupro era um “fato isolado” na vida do acusado! Compreendemos que a legislação brasileira prevê esta possibilidade, entretanto, também prevê que a prisão preventiva pode ser decretada quando a soltura puder acarretar danos à investigação, risco às vítimas ou testemunhas, ou a fuga do acusado. O Ministério Público interveio nessa segunda-feira pedindo a prisão preventiva, que foi acolhida pelo mesmo juiz, porém, Marlon está foragido!

No caso de um crime bárbaro como esse, porque a Justiça não usou as prerrogativas possíveis para manter o criminoso na cadeia? Como o juiz pode ter sido tão leviano afirmando que era um “fato isolado”? Porque a mídia buscou elementos que parecessem justificar o crime? Se vivemos em um país de “igualdade”, como diriam alguns, por que uma mulher é estuprada a cada 12 segundos no Brasil?! Não, o estupro relatado não é mesmo um fato isolado, e se há liberdade no Brasil, ela tem lado, e é o lado dos machistas!

Para nós, a liberdade só é efetiva com igualdade, e estupro é crime bárbaro! Queremos a liberdade de usar a roupa que desejarmos, sem sermos invadidas. Queremos o direito de sair à noite e usufruir da cidade. Queremos a liberdade de sair com ou sem nossos companheiros (ou companheiras, é claro), afinal, mulheres que nos antecederam sofreram e lutaram por séculos para que hoje pudéssemos ter o direito de sermos nós mesmas, e não a “extensão” de um homem qualquer. Queremos a liberdade de viver e desfrutar de nossos corpos – inclusive do prazer que ele pode nos proporcionar, por que não?! – quando e com quem escolhermos. E sim, queremos que a sociedade identifique o assédio, o abuso e o estupro como CRIMES, e que os criminosos sejam punidos e vistos como tal, jamais como homens que “não resistiram”, ou foram “provocados”. Ensinemos os meninos e homens a respeitar, e não as meninas e mulheres a temer!

Para isso, entendemos que nossa luta é coletiva e feminista. Certamente é importante que as mulheres sejam capazes de se autodefender, e de identificar e escrachar o maior número possível de estupradores. Mas precisamos fundamentalmente nos organizar coletivamente para intervir e disputar a sociedade: disputar os espaços públicos, a construção de leis e de políticas públicas, a forma de atuação das polícias e dos serviços de amparo e acolhimento às vítimas. Precisamos construir redes e fazer denúncias, nos formar e formar mais e mais pessoas, mulheres e homens, para mudar a cultura e punir a prática do estupro.

Nesse sentido, nos somamos a diversas mulheres, autônomas e de diversos outros movimentos, coletivos ou partidos, para dizer ESTUPRADORES NÃO PASSARÃO! Faremos um ATO neste domingo, dia 02/11, às 16h, na Praça da Alfândega (Centro de Porto Alegre/RS), com saída da marcha prevista para as 17h. Leve seu cartaz, sua vela, seu instrumento, e especialmente, sua indignação!

*Clarissa Sommer é historiadora,militante do Juntas RS
**Em caso de chuva será transferido para o dia 15/11, sábado, mesmo horário e local.


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