Quem vai fiscalizar a violência e os feminicídios no RN?
Cinco mulheres mortas na semana passada. Duas tinham medidas que deveriam protegê-las do agressor. Em pleno natal nós mulheres potiguares somos “presenteadas” com a notícia de que a violência machista aumentou em 39% de 2010 pra cá (Coedhuci) no RN.
*Nina Marina
Cinco mulheres mortas na semana passada. Duas tinham medidas que deveriam protegê-las do agressor.
Em pleno natal nós mulheres potiguares somos “presenteadas” com a notícia de que a violência machista aumentou em 39% de 2010 pra cá (Coedhuci) no RN, número que nos choca mais ainda por sabermos que a grande maioria das mulheres não denuncia, logo não estão nas estatísticas. O que mais dói é ouvir das pessoas que as mulheres estão naquela situação porque querem, mas vamos esclarecer alguns fatos:
A Lei Maria da Penha – conquistada graças às intensas lutas feministas – infelizmente não consegue diminuir a violência contra as mulheres. Isso é resultado de uma série de violências que não se encerra no momento da agressão doméstica. Normalmente quando mulheres vão prestar queixa contra o agressor elas se deparam com diversos questionamentos que costumam violentá-las mais ainda. Perguntar “o que você fez pra ele te bater” é violentar novamente uma pessoa que já está fragilizada demais e que teve um momento de força para pedir socorro. É desencorajar a vítima, é colocá-la como culpada da agressão, é tirar o resto de forças que lhe resta. Existem policiais que se referem a essas mulheres como “freguesas”, pois dizem que elas vão lá toda semana. Ora, se estão lá toda semana não há algo a se investigar? Se elas retiram a queixa toda semana também não há motivos para se investigar o porquê de sempre retirarem a queixa?
Existem cinco Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher (DEAMs) no estado (duas em Natal, uma em Parnamirim, uma em Caicó e uma em Mossoró) e uma casa-abrigo em Natal que tem capacidade para quarenta mulheres. Se foram 140 MORTAS no ano de 2014, não há prova maior que os números de delegacias e casas-abrigo são insuficiente para a proteção das vítimas. Bate também à porta dos governos e profissionais envolvidos a responsabilidade da fiscalização dos casos denunciados e a punição dos agressores. A necessidade de parar de responsabilizar quem já está machucada demais para reagir e a obrigação de fazer a lei ser cumprida. A governadora do estado é uma mulher que parece não ter se importado com os crescentes casos de violência em seu governo.
Bate à nossa porta a responsabilidade de também denunciar os casos que conhecemos. O 180 é um número onde qualquer um pode denunciar até de forma anônima casos de violência doméstica e os responsáveis irão investigar os casos. Quando nós pensamos que não é problema nosso estamos contribuindo para o sofrimento de outra pessoa. Essa outra pessoa pode ser sua mãe, sua filha, sua irmã. Pode ser você.
Em briga de marido e mulher se mete a colher sim!
Sabemos que existe um sistema opressor que coloca mulheres e homens em patamares desiguais na sociedade, onde eles têm privilégios sobre nós quando se trata de gênero. É a mulher que deve obedecer o marido. É a mulher que deve “se preservar”. É baseado nisso que esse tipo de violência acontece. Homens pensam que são donos dos nossos corpos. muitas mulheres já passaram por relações abusivas. Uma relação onde a pessoa que deveria ser companheiro usa de violência psicológica (a mais difícil de provar). “Ninguém mais vai querer você, você tem que agradecer por eu ainda te querer e cuidado pra eu não ir embora” , “Se você acabar comigo eu vou embora/me mato/te mato”, “você não vai sair com essa roupa, todo mundo vai olhar pra você”, “você está se jogando pra Fulano…”. Essas são, talvez, as mais “leves”. Muitas dessas mulheres sabem que se terminarem um relacionamento elas vão ser perseguidas, agredidas e até mortas. Muitas dessas mulheres denunciam e são violentadas novamente. Com uns retalhos de força poucas conseguem ir adiante e menos ainda são as que conseguem medidas que deixam os agressores distantes. Mas infelizmente não estão fiscalizando. Infelizmente as mulheres estão sendo mortas.
Reconhecendo esse sistema opressor entre gêneros e reconhecendo também as falhas citadas anteriormente a justiça incluiu, este ano, o Feminicídio como crime no código penal (também com muita luta feminista por trás):
“Art. 121
Parágrafo 7º – Denomina-se feminicídio à forma extrema de violência de gênero que resulta na morte da mulher quando há uma ou mais das seguintes circunstâncias:
I – relação íntima de afeto ou parentesco, por afinidade ou consanguinidade, entre a vítima e o agressor no presente ou no passado
II – prática de qualquer tipo de violência sexual contra a vítima, antes ou após a morte
III- mutilação ou desfiguração da vítima, antes ou após a morte
Pena – reclusão de 12 a 30 anos”
Porém esses casos só podem ser punidos se denunciados, se investigados, se as mulheres tiverem condições de sair de suas casas para um lugar seguro e ter a certeza de que andarão seguras nas ruas. É necessário mais que tudo a fiscalização que não está sendo feita. O resultado é este: 140 mulheres declaradamente mortas por feminicídio, a maioria dos assassinos soltos, o medo de sair na rua, a culpabilização da vítima. Quantas de nós vão precisar morrer para que nossas denuncias sejam levadas a sério? Com quanto sangue derramado se faz uma investigação?
*Nina é estudante de Letras na UFRN e militante da Juntas! Natal