A juventude negra tem direito de viver
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A juventude negra tem direito de viver

Ronaldo de Lima era um jovem, negro e voltava de uma festa na manhã do dia 3 de setembro quando foi abordado pela polícia e morto com um tiro. Ronaldo não ofereceu resistência, mas mesmo assim foi alvejado pelas costas.

Juliano Marchant 4 set 2015, 19:00

A situação de crise do Rio Grande do Sul avança e com a redução abrupta da renda dos servidores, os impactos sociais ficam cada vez mais evidentes. A soma dos cortes estaduais aos cortes federais arrasta o estado para um cenário de desespero onde os governantes se fecham em seus palácios e a a única resposta é o recrudescimento das forças de segurança. Em meio a esse cenário, Ronaldo de Lima foi morto pela polícia militar gaúcha no morro Santa Tereza.

Ronaldo de Lima era um jovem, negro e voltava de uma festa na manhã do dia 3 de setembro quando foi abordado pela polícia e morto com um tiro. Ronaldo não era traficante, não ofereceu resistência, mas mesmo assim foi alvejado pelas costas. Essas são as informações passadas pela irmã e conclusões preliminares da perícia. A arma que seria do jovem não foi encontrada na cena do homicídio, foi entregue horas depois em uma unidade de pronto atendimento da polícia militar. Todas essa informações desmentem a versão dos policias e são mais do que suficientes para afirmar que Ronaldo foi mais um dos jovens negros assassinados pela polícia de forma covarde.

As mentiras da polícia para justificar e esconder a verdade sobre a sobre a morte de Ronaldo expressam resquícios da ditadura militar nas instituições de segurança que tem por fim, manter a ordem social inabalada. A questão é que esta ordem social é a mesma que exclui uma parcela da população através da lógica perversa que destina recursos públicos para a dívida pública. Uma ordem social que tira dinheiro das escolas, dos hospitais e de outros serviços públicos essenciais para beneficiar banqueiros e as famílias mais ricas do país. Famílias que não vão chorar a morte de um filho assassinado pela polícia e que não terão salários parcelados.

Durante o dia as famílias do Morro Santa Tereza responderam com indignação a morte de mais um jovem na região. Relatos de moradores e de lideranças comunitárias expressam o sofrimento e o cansaço de uma população que convive diariamente com o abuso policial. Não são poucas as denúncias de agressões sofridas por estudantes e trabalhadores que são taxados como suspeitos somente pelo fato de morarem na periferia. A resposta das forças de segurança foi mais policiamento ostensivo com tropa de choque e homens com fuzis pelas ruas da comunidade na busca de mais vítimas.

Cercado pelo agronegócio, o Secretário de Segurança Pública, Wantuir Jacini se afastou da cidade e foi para a Expointer. Em sua declaração não conseguiu esconder a indiferença com as 14 vidas perdidas somente no dia 3 de setembro, 7 delas em um intervalo de 13 horas, entre elas a morte de Ronaldo:

“Olhe só, a maioria dessas vítimas tinha antecedentes criminais, a maioria delas. Não se trata de pessoas que não tivessem antecedentes. Claro que é uma coisa que nos impacta, porque são muitas vítimas. Mas impactaria muito mais se as vítimas não tivessem antecedentes criminais. Dessas, a maioria tem. Então, é uma situação que impacta, mas não gera a mesma consternação que causaria se fossem pessoas que não tivessem antecedentes.”

Wantuir ultrapassa os limites do absurdo e trata como normais mortes de pessoas com antecedentes como se isso fosse aceitável. Por acaso o secretário de segurança púbica sabe que a pena de morte não é lei no Brasil? Sabe que apesar da atuação policial todo suspeito tem direito a ser julgado? A indiferença de Wantuir é uma clara demostração de que o estado não se preocupa com a segurança de seus cidadãos, de todos os cidadãos, mas em garantir que um pequena parcela privilegiada siga usufruindo de seus benefícios. Por isso, Wantuir estava na Expointer.

Em toda região metropolitana de Porto Alegre há em média um assassinato de criança ou jovem a cada 3 dias. A maioria destas mortes é fruto da política de guerra às drogas, que é uma verdadeira guerra aos pobres. Ronaldo, Claudia, DG, Amarildo todos foram mortos pela polícia sob a justificativa do combate às drogas, mas, na verdade, escondem o racismo institucional que vítima 83 jovens negros por dia. A morte de Ronaldo não pode ficar impune, os culpados precisam ser responsabilizados e o Secretário de Segurança Pública afastado, pois é clara sua conivência com mais essa ato brutal. Precisamos acabar com essa política que torna jovens, pobre e negros em inimigos do estado. Precisamos de uma sociedade onde jovens negros não tenham medo de viver.

 

Guly Marchant, estudante de jornalismo da UFRGS e militante do Juntos! Negras e Negros


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