Novo clipe da Lady Gaga retrata violência sexual nas Universidades
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Novo clipe da Lady Gaga retrata violência sexual nas Universidades

Clipe retrata a violência sexual nas Universidades americanas, mas revela um problema de dimensões internacionais. Parecem cenas gravadas nos corredores da USP.

Sâmia Bomfim 23 set 2015, 11:41

Til It happens to you, novo clipe da Lady Gaga, tem impactado muita gente. No Brasil, tem setornado grande sucesso. O clipe mostra algumas cenas de estupros em universidades. É impossível não se emocionar assistindo, especialmente quem já passou por situações similares, pois retrata a realidade de muitas mulheres americanas – uma em cada cinco estudantes é vítima de violência sexual nos EUA. A comoção e reflexão que o clipe está gerando é muito importante para somar forças à luta das jovens de todo o mundo contra os estupros.

Panos quentes

Muitas denúncias de casos de violência sexual foram feitas no último período por estudantes universitárias. Ficou famoso em 2014, por exemplo, o caso de Emma Sulkowicz, estudante de 21 anos, que andava pela sua Universidade carregando o colchão do dormitório estudantil onde dormia quando foi estuprada por um colega, como forma de protesto à decisão da Universidade, que inocentou o estuprador, e também de fazer a sociedade refletir a respeito da naturalização e conivência com a violência contra a mulher. Centenas de outros casos de estupro foram expostos, e todos são muito parecidos com o de Emma: as vítimas de violência sexual nos campi não recebem apoio e são desencorajadas pelas universidades a denunciar os agressores.

As denúncias das vítimas de estupro e a pressão da sociedade forçaram o governo americano a pautar a questão da violência nas universidades e ter uma agenda política essa situação. O Departamento de Educação dos EUA investiga atualmente 86 instituições de ensino superior por ignorarem os casos de violência sexual em suas dependências. Em setembro, a Casa Branca lançou uma campanha nacional para enfrentar o problema, chamada It’s On Us (algo como “Cabe a Nós”). A Casa Branca também determinou padrões mais rígidos para punir os acusados do que os usados no sistema de justiça criminal. A regra é que, em casos de julgamentos nos campi (geralmente conduzidos por professores e diretores), se houver pelo menos 51% de probabilidade de culpa, o acusado deve ser punido. Na Califórnia, foi criada uma nova lei batizada de Yes Means Yes .

O estuprador mora ao lado

O clipe de Gaga acerta ao não tratar os casos de violência sexual como atitudes desviantes ou isoladas e não tratar os estupradores como anormais, psicopatas ou doentes. São homens jovens comuns, colegas da sala de aula, que agem sob a lógica machista de dominação e violência. O clipe também desmistifica a ideia de que o estuprador é o sujeito desconhecido que agarra uma mulher sozinha num beco escuro. Apesar desses casos também acontecerem, a maioria dos estupradores são conhecidos e familiares das vítimas, são parte de seu cotidiano e de suas relações sociais. Homens “de confiança”, de família, que estudam, trabalham e, em muitos casos, moram com a vítima. Outro aspecto importante do clipe é mostrar como muitas mulheres e homens trans, bem como mulheres lésbicas, sofrem com estupros corretivos por não terem sua identidade de gênero e sexualidade respeitadas. Também mostra os conflitos pelos quais passam as vítimas, que se sentem desgostosas, culpadas, se isolam, têm medo e dificuldades de seguir a vida. O clipe termina de forma emocionante, com a união das vítimas e familiares, de cabeça erguida, em frente por uma vida sem violência.

Um problema de dimensões internacionais

Assistindo ao clipe, lembrei de várias histórias que tive contato na USP, de mulheres que foram estupradas nas dependências da Universidade, que sofreram muito com a dor física e psicológica, se sentiram culpadas e desamparadas e não receberam nenhum apoio das Diretorias e Reitoria. Assim como nas universidades americanas, a USP destrata as estudantes e as desestimulam a denunciarem, acoberta os casos e inocenta os estupradores. Ganharam muita repercussão as barbaridades que aconteceram nos corredores da Faculdade de Medicina. Os relatos dos abusos são revoltantes, bem como a postura que teve a Faculdade e a Universidade. Para eles, as vítimas que denunciam são inquisidoras, e os estudantes meninos que estavam brincando e não sabem o que fazem. Panos quentes.

As estudantes do Coletivo Geni foram as primeiras a colocarem a boca no mundo. De lá para cá, dezenas de outros casos foram revelados, não somente na Faculdade de Medicina e tampouco somente na USP. A CPI das Universidades Paulistas contou com o relato de jovens de várias universidades do estado de São Paulo. O tratamento dado às vítimas e o desenrolar das histórias são universais. Assim o é o machismo.

A USP na rota dos protestos contra a violência sexual

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No mês passado, após a publicação do blog do “Tio Astolfo” que traçava uma rota e dava dicar para estuprar as mulheres da USP e do caso de uma estudante que foi estuprada à luz do dia na Praça do Relógio, as estudantes e funcionárias da USP fizeram um belíssimo ato dizendo “Basta de estupros, queremos segurança para as mulheres na Universidade!”. No próximo dia 30, haverá um novo ato (https://www.facebook.com/events/1490123954644707/), que deve cobrar medidas contundentes da Reitoria da USP para combater a violência. As mulheres exigem campanhas de conscientização, melhor iluminação, mais linhas de ônibus, uma guarda feminina que seja capaz de atender mulheres em situações de violência, Centro de Atendimento às vítimas e punição e expulsão dos estupradores, que até hoje são protegidos pela Reitoria. E a luta das mulheres contra a violência tem se espalhado. Nesta semana, alunas da UFPE e UFU também se organizam com muitas força.

Não à toa o clipe da Lady Gaga está sensibilizando tantas jovens brasileiras. Este clipe poderia ter sido produzido nos corredores da USP, não fossem alguns detalhes que diferenciam as universidades americanas daqui. Se fizessem uma pesquisa para saber quantas estudantes foram vítimas de violência nas universidades do Brasil, certamente veríamos que os números de assemelham muito a dos Estados Unidos. O machismo é universal, mas a nossa luta também é. A organização coletiva dá força para denunciar e lutar contra a violência sexual, e tem feito, por exemplo, o governo dos Estados Unidos admitirem uma realidade que sempre foi acobertada. Estamos juntas em todo o mundo contra a violência sexual e por mais direitos. Se você é estudante de alguma Universidade brasileira, assistiu ao clipe da Lady Gaga e teve embrulho no estômago, não tenha medo. Denuncie, organize-se, proteste. Vamos juntas dar um basta à violência sexual nas universidades!


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