O que significa a morte de Lázaro?
Foto: Gabriela Biló/Estadão Conteúdo

O que significa a morte de Lázaro?

Para além da queima de arquivos e a celebração da pena de morte, a falência da Polícia Militar e o direito burguês.

Letícia Corrêa e Pedro Levi 28 jun 2021, 17:54

Hoje (28/06), após 20 dias de fuga, cerca de 19 milhões de reais em dinheiro público investidos em sua “perseguição”, mais de 300 policiais envolvidos, cães de busca e todo tipo de equipamento tático: Lázaro foi morto pela Polícia Militar. Chamar essa caçada de bem sucedida, entretanto, é comemorar a impunidade no Brasil e agitar a competência de uma instituição falida cujo único objetivo é acumular corpos todos os dias, mantendo um ciclo de violência ativo em nosso país que afeta principalmente a negritude.

Para quem não pôde acompanhar o desfecho dessa história com detalhes, cabe aqui fazer um breve resumo: Lázaro Barbosa era um homem de 32 anos com uma extensa ficha criminal que continha além de assassinatos e assaltos sexuais na Bahia, Goiás e Distrito Federal, três fugas da prisão. Aterrorizou o país após matar uma família em Ceilândia – DF e atentar contra diversas outras fazendas das redondezas, estopim para a força-tarefa que se iniciou dia 09 de junho de 2021. Desde o primeiro momento, a Polícia Militar – braço armado do Estado -, se esforçou muito para conectá-lo às religiões de matriz africana. A intolerância religiosa ganhou forma pública e nacionalizada quando diversos veículos de comunicação publicaram imagens de um assentamento – local sagrado para cultuar Orixás, afirmando ser “um possível esconderijo de Lázaro” e assimilando-o com o “satanismo”. Após diversos líderes do candomblé e umbanda em Goiás denunciarem invasões e tentativas de coerção durante as buscas, recheadas de violência e descaso para com seus espaços sagrados, provou-se que tais imagens nada tinham a ver com ele e sim com a tentativa incessável de criminalização dos povos de terreiro. Outra coisa que não pode passar batida é a violência enquanto única via de resposta por parte da PM para com jovens negros. Não muito diferente da realidade do Rio de Janeiro, por exemplo, que enfrenta a maior política de extermínio da juventude negra no Brasil, diversos foram os relatos de espancamentos e tortura no DF contra qualquer um que se parecesse minimamente com Lázaro, mesmo que a única similaridade fosse a cor da pele.

O desenrolar da situação é ainda mais complexa. A relação entre o foragido e proprietários de terra da região rural de Goiás foi trazida à tona quando descoberto que o mesmo havia passado ao menos 5 dias em uma chácara, acobertado e escondido por um fazendeiro. Iniciou-se então a suposição de que ele fazia parte de um esquema muito maior, incentivado pela especulação imobiliária, cujo objetivo era diminuir o preço dos imóveis da região, sendo apoiado e financiado por uma rede de corrupção.

O que a legislação aponta é que a vida de Lázaro deveria ter sido preservada e sua prisão transformada em um primeiro passo para uma investigação de qualidade mais ampla. Ora, não existe serial killer sem um processo legal que o aponte como tal. Quem morreu foi um suspeito cujo óbito, para nós, significa nada mais do que uma queima de arquivos. O que provavelmente era um matador de aluguel trabalhando para fazendeiros transformou-se num thriller racista cuja única explicação midiática possível era a bruxaria, sem conexão alguma com o acúmulo de capital dos grandes latifundiários. Além de que, comemorar essa ação truculenta é dar amparo para todo e qualquer tipo de brutalidade policial. É entregar à PM o direito de escolher quem vive e quem morre, sendo deliberadamente incapazes de solucionar crimes seguindo o processo legal. O Direito no capitalismo serve aos interesses da grande burguesia, através da utilização da força armada e do punitivismo para regular a dominação sobre os corpos, além da proteção da propriedade privada e de seus detentores.

A prova disso é que no Brasil, o governo de Bolsonaro foi eleito em uma conjuntura de aliança e apoio da grande burguesia nacional. O ataque aos direitos humanos e a insistente agitação que “bandido bom é bandido morto” transformou-se em um dos seus principais pilares. A polícia segue cumprindo seu papel e é parabenizada pelo presidente.

Lázaro foi morto pelo Estado brasileiro. Suas motivações provavelmente jamais serão desvendadas. As famílias das vítimas provavelmente jamais terão o ponto final que merecem. Comprometeu-se todo um processo de investigação para satisfazer o projeto pessoal de vingança da Polícia Militar que, por 20 dias, foi ridicularizada pelo criminoso. A lógica do sistema segue sem dar respostas nem soluções às nossas vidas. É urgente a construção de uma nova alternativa e portanto, nosso compromisso político é com a organização do povo rumo ao socialismo.

Derrotar Bolsonaro imediatamente, além de salvar vidas, é combater radicalmente as lógicas de extermínio que ele dissemina e avançar socialmente. Precisamos dar um basta! Por isso, estaremos juntos nas ruas nos dias 3J, 13J e 24J, construindo a luta rumo à uma sociedade mais justa! #ForaBolsonaroGenocida


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