A lógica neoliberal na educação pública do Estado do Paraná
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A lógica neoliberal na educação pública do Estado do Paraná

Uma análise da influência neoliberal no desmonte da educação pública no Estado do Paraná no governo reeleito de Ratinho Junior (PSD).

Luiz Maioli 2 dez 2022, 15:24

          Com a escalada rápida da pandemia do novo Corona Vírus, nós presenciamos mudanças em nossas vidas que desafiam a nossa compreensão sobre os processos em curso. Processos esses que afetaram diretamente a educação no Brasil e no Estado do Paraná. De um dia para o outro, vimos o fechamento temporário e sem previsão de reabertura de escolas e de universidades, realização de aulas por meio de plataformas digitais, professores em trabalho remoto, cortes nos investimentos educacionais e na garantia do acesso ao ensino durante esse processo, vimos a militarização dos colégios da rede estadual, evasão de estudantes motivada pela falta de acesso à internet e à tecnologia, discussão sobre ensino domiciliar, o famoso homeschooling, reabertura desordenada e sem garantias de biossegurança dos estudantes, professores e funcionários.

            É a partir desses fatores que a educação no Paraná está sendo transformada no momento atual. Neste quadro, a pandemia da Covid-19 funcionou como uma espécie de catalisador, criando um cenário novo e até então inimaginável, em que as condições e oportunidades de aceleração das mudanças foram excepcionais. Foi uma daquelas situações comumente caracterizadas como uma “tempestade perfeita” para o avanço do capital na educação, jogando um papel central na acelerada conversão da educação em mercadoria. Grande parte das mudanças que vêm acontecendo têm como plano de fundo este processo. É visível que estamos frente a um novo desdobramento da forma de produção capitalista aplicada à economia de serviços. Enfatizo a dimensão tecnológica porque nos últimos anos está ocorrendo nos países centrais uma mudança estrutural na forma de produção de mercado e em países de capitalismo periférico, como é o caso do Brasil, a introdução de inovações técnicas acaba tendo como consequência um caráter subdesenvolvido e dependente que domina a nossa formação social. Ou seja, aqui no sul global, as novas tecnologias não contribuem para o avanço da sociedade a patamares civilizacionais superiores, pelo contrário, funcionam como agravadoras das contradições pré-existentes e dos traços anti-civilizatórios do sistema. Dessa forma, a introdução dessas inovações não somente chega aqui atrasada e incompleta, como adquire também um acentuado caráter predatório, agravando o subdesenvolvimento, a superexploração do trabalho, e as mais variadas formas de dependência. Longe de ser um processo natural, as tendências da educação no Brasil obedecem à lógica dominante nesse tipo de sociedade.

O que acontece com a educação no Paraná hoje é a implementação fidedigna do modelo neoliberal de educação. A atuação do governador Ratinho Junior (PSD) e seu secretário de educação Renato Feder, um empresário do lobby educacional do sistema Positivo de ensino, tem como objetivo claro o desmonte da educação pública. Essa política de sucateamento afeta diretamente a realidade dos mais de 1,5 milhões de estudantes paranaenses, que sentem no seu cotidiano os efeitos desse projeto, seja com a militarização das escolas (vale ressaltar que os primeiros colégios a serem militarizados foram justamente aqueles que em 2016 foram referência nas ocupações do movimento estudantil contra a reforma do ensino médio) seja com as vídeos aulas nos colégio técnicos onde os professores foram substituídos por Smart Tvs fornecidas pela Unicessumar, em licitações que ultrapassam os 35 milhões de reais, ou também por meio do ataque à auto-organização dos estudantes através dos grêmios estudantis, onde os núcleos regionais de educação, seguindo às orientações da SEED, ditam para as direções dos colégios de que maneira se deve organizar os grêmios estudantis, reformulando completamente as diretrizes do movimento estudantil, cooptando, dessa forma, a organização, a independência e a atuação política da entidade, assim como também a sua filiação às entidades nacionais (UBES) e estaduais (UPES).

GOVERNADOR AMIGO DOS RICAÇOS E INIMIGO DO POVO. MAIS UM ATAQUE À EDUCAÇÃO!

             O governo de Ratinho Jr. é marcado por ataques que beneficiam interesses privados que agora ameaçam a educação pública. Segundo o novo edital promulgado em outubro desse ano, o estado prevê a privatização de 27 colégios em todo o estado, afetando cerca de 100 mil estudantes.  Esse ataque destina 200 milhões de reais dos cofres públicos para as mãos de empresários que não se importam com o futuro dos estudantes e nem com as preocupações dos familiares. O Estado está omitindo sua obrigação de oferecer educação pública e gratuita de qualidade, transferindo a sua responsabilidade para a iniciativa privada e deixando estudantes, trabalhadores e famílias como reféns de empresários que colocam o lucro acima das necessidades da população.

              É preciso frear Ratinho Jr. e seu projeto de desmonte e sucateamento do ensino. Sem fazer pesquisa e levantamento de valores serão escolhidos os aliados do atual Governador, e não saberemos como todo esse dinheiro será gasto. A privatização pode atingir estudantes, trabalhadores e famílias de diferentes formas, desde: piorar o aprendizado; ofertar materiais e serviços sem qualidade; exclusão dos estudantes por meio de convite para se retirar do colégio e até mesmo aumentar a evasão escolar; terceirização da oferta de merenda; exclusão de estudantes com necessidades educativas especiais. Trabalhadores temporários não terão a garantia de manutenção dos seus empregos, estarão sujeitos à demissão antes do término de seus contratos e poderão ser substituídos por terceirizados precarizados e desconhecidos da sua comunidade.

              A comunidade e professores não mais poderão opinar sobre a melhor forma de ensinar e desenvolver as potencialidades de cada aluno e aluna, ficando à mercê do controle das empresas contratadas. A empresa contratada pelo governo tem um ano para atuar e caso não atinja os dados e índices exigidos é substituída. Isso destrói a educação continuada, fazendo com que o estudante seja submetido a um processo constante de readequação e mudança. Além disso, a não obrigatoriedade do ensino noturno, o que força estudantes e jovens trabalhadores a se matricularem em escolas distantes de seus locais de moradia, desestimulando o aprendizado e ampliando as chances de evasão escolar.

               Outra questão é que para a empresa ser contratada precisa ter um resultado pouco acima da média nacional no ENEM em suas 10 melhores escolas. Esta nota é uma nota inferior à média do Paraná, ou seja, dependendo da nota da empresa contratada a nota do Paraná pode estar melhor, o que não justifica a contratação. O que o Estado deve fazer é suprir a falta de professores e funcionários, investir em reformas estruturais das escolas, garantir que o dinheiro público seja investido na educação pública e não vá para os cofres de empresas milionárias.

AS TAREFAS DO MOVIMENTO ESTUDANTIL EXIGEM UMA POSTURA COMBATIVA!

             Toda essa articulação da Secretaria de Educação do Paraná tem como norte desestruturar a atuação do estado sobre a educação pública, visando a inserção privada como gestora do ensino no Estado, criando a abertura a novos nichos de mercado para a iniciativa privada, levando a uma multiplicação de mercadorias educacionais. Neste caso, como já falado, o Estado cumpri sobretudo um papel negativo, de desmonte do sistema educacional, o que potencializou a criação de novos espaços para o setor privado, ou seja, o setor privado não cresce apenas onde o estado está ausente, mas também onde ele está presente. Neste sentido, os investimentos estatais não competem com os investimentos privados, mas pelo contrário, os sustentam. Isso demonstra que o Estado do Paraná funciona também como organizador dos interesses empresariais na educação, e o maior expoente desse processo é o próprio secretário de educação Renato Feder, que antes de se tornar secretário, era um empresário do ramo educacional. 

            Neste cenário, mais do que nunca se fez tão necessária a organização dos estudantes em aliança com o movimento sindical. Somente através da organização e da mobilização nós iremos conseguir somar vitórias para a educação paranaense. O imobilismo das direções das entidades estudantis e sindicais deve ser superada. É fundamental apresentarmos uma alternativa para os estudantes do Paraná frente à desarticulação da União Paranaense dos Estudantes Secundaristas (UPES) que é dirigida por uma cristalizada burocracia, a qual cumpre um papel de travamento da luta dos estudantes contra esses projetos de destruição da educação. Os estudantes sequer sabem que existe uma entidade que tem como finalidade representá-los e organizá-los, criando assim um grande sentimento de abandono por parte dos estudantes que percebem o que está acontecendo, mas, no entanto, não contam com apoio de uma entidade representativa.

            Esse modelo educacional não nos representa! Queremos um sistema de educação que seja umbilicalmente ligado a realidade do estudante, principalmente daqueles estudantes oriundos da classe trabalhadora, da periferia, do campo, estudantes de quem lhes são negados o direito de estudar, estudantes que são submetidos a um modelo que visa o lucro de grandes empresários em vez de sua aprendizagem e de seu desenvolvimento. Queremos professores capacitados em sala de aula e não militares ou robôs nos dizendo o que deve ser feito sem ao menos podermos tirar dúvidas! Queremos uma escola que seja política, que debata e discuta com os estudantes a realidade do nosso Estado e a realidade dos milhares de estudantes LGBTQIA+, dos estudantes negros, indígenas, mulheres, filhos dos pequenos agricultores, desempregados, subempregados e sem-terra. Queremos uma entidade estudantil que nos represente, que esteja presente nas salas de aula, nos corredores das escolas. Queremos uma escola que seja um espaço acolhedor, que tenha um caráter popular, que atenda a realidade de todos os estudantes e que, sobretudo, forme cidadãos pensantes e emancipados!


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