Os sentidos da disputa na UFRN rumo ao II CONUEE
Não iremos ao congresso para decidir apenas quem irá operar a próxima presidência da UEE, mas principalmente para debater coletivamente como deve ser uma entidade fiel aos interesses estudantis.
Acaba de acontecer a primeira grande eleição presencial do movimento estudantil potiguar depois da crise sanitária e dos longos semestres de ensino remoto. Atravessada pelas intempéries de uma convocação feita às pressas, a votação que definiu as e os representantes da UFRN no segundo congresso da UEE deu o pontapé na disputa política geral da entidade que foi refundada no início do governo Bolsonaro e volta a ter vida democrática apenas com a vitória de Lula – intervalo exato de um mandato presidencial.
Não é possível enumerar quantas vezes tivemos que ir às ruas para barrar as investidas reacionárias de Bolsonaro contra a educação pública, mas quantos conselhos de entidades gerais, que reúne os DCEs do estado, chamados pela atual direção majoritária da UEE no mesmo período sim: exatamente dois, sendo o último obrigatório para aprovar o calendário eleitoral às vésperas do apagar das luzes do semestre letivo nas universidades.
Na UFRN três chapas foram inscritas no processo. Construída pelo Correnteza (que ocupa metade da gestão do DCE) e UJC, a chapa 1 ‘A Todo Vapor’ reuniu inicialmente 304 estudantes e terminou com 1144 votos. A chapa 2 ‘UFRN Antifascista’, uma articulação inédita que fizemos com o Juntos (a outra metade do DCE) e das juventudes da Alternativa Socialista e Fortalecer começou com 510 estudantes e obteve 812 votos. A chapa 3 ‘Por Todas As Vozes’, impulsionada pela UJS, Kizomba, LPJ, Enfrente, ParaTodos, Fora da Ordem e Brota inscreveu 464 estudantes um pouco além do prazo previsto pelo edital da eleição, sofreu uma impugnação temporária e ficou na frente com 1233 votos.
A vitória política parece ter sido comemorada pelas três chapas. Para que não seja contabilizada nem exclusivamente pelo resultado numérico e nem por narrativas paralelas (num concurso de quem encaixa melhor a realidade para caber na fotografia de cada organização), vale a pena ter uma análise mais científica sobre ela.
Um olhar a partir da divisão de campo nacional do movimento estudantil favorece a Oposição de Esquerda, do qual as chapas 1 e 2 se reivindicam. Está avalizada mais uma vez a autoridade e o balanço positivo do DCE da UFRN, com cerca de 900 votos de diferença do campo Democrático Popular, inscrito na 3. Esse aspecto é importante, porque apesar da chapa 3 ter centrado a campanha muito mais no discurso de oposição ao DCE do que no programa que defende para a UEE, ainda assim a base estudantil valoriza quem atua organicamente nas lutas da universidade.
No entanto, o movimento não se resume à soma das partes. O Juntos apostou que precisava existir um levante antifascista com a proximidade das eleições burguesas e a necessidade de derrotar a extrema-direita nas urnas. Essa foi a nossa principal bandeira em maio de 2022 durante o congresso da UBES e foi ela que nos permitiu também reconhecer em primeira instância a candidatura democrática de Lula como a alternativa viável para tirar Bolsonaro do poder, ainda que sem ilusões com o que viria a ser um outro governo do PT.
Mais cedo e mais decididamente atuamos para comprová-la entre a maioria social da juventude. Criamos a plataforma ‘UFRN com Lula’ e organizamos assembleias expressivas no campus central, na FACISA e no CERES, além de conectar estudantes com a mesma disposição ativista que lotaram grupos de whatsapp. Tendo havido despendido muito esforço no primeiro e no segundo turno em nome dessa tática, mantemos agora a nossa posição de independência em relação ao governo Lula.
Fazer política de movimento considerando as variáveis da situação histórica não compromete o princípio de entidades estudantis independentes. Não sabemos em que medida a conciliação de classes característica do PT penderá ao povo trabalhador, por isso resguardamos as nossas defesas programáticas. O que podemos e devemos fazer desde já criar condições nos locais de estudo para que o combate ao projeto político bolsonarista siga consequente.
A chapa com os companheiros da Alternativa Socialista e do Fortalecer introduziu na UFRN um campo próprio da esquerda do PSOL (que luta para que o partido siga sua independência). Estreamos em linhas partidárias na disputa com a UP (Correnteza) e o PCB (UJC) de um lado e do outro o PCdoB (UJS) e o PT (Kizomba, Enfrente, ParaTodos e LPJ). Vale resgatar aqui a menção ao Brota para explicar que se trata do coletivo que foi fundado e continua alimentado justamente pela ex-presidenta da UEE, que hoje está na prefeitura do PSDB em Natal e foi responsável por agredir estudantes da UFRN que reivindicavam a gratuidade do Circular.
Uma diferença de pouco mais de 300 votos nos separou das demais chapas, em condições desiguais de campanha, sobretudo no dia da votação. O PSOL, portanto, foi o partido que recebeu sozinho o maior número de votos. Vários fatores poderiam explicar o porquê, mas acreditamos que o acerto em linha política foi o mais determinante. Recebemos votos em urnas que não chegamos a estar no dia da votação, buscamos apresentar a cada estudante um programa dentro de uma eleição que o debate de ideais foi bastante sufocado e testamos a política com cara própria.
O PSOL ainda é um partido pequeno e o Juntos pode crescer muito mais nas universidades do Rio Grande do Norte. Sozinhos seguramente não daremos conta de reativar a UEE de verdade. O movimento estudantil é dialético, pulsante e possui níveis avançados de consciência política. Não iremos ao congresso para decidir apenas quem irá operar a próxima presidência da UEE, mas principalmente para debater coletivamente como deve ser uma entidade fiel aos interesses estudantis. Não basta refundá-la cartorialmente outra vez e dividir cadeiras na diretoria. É preciso temperá-la na luta.