Tarcísio declara guerra contra o ensino público
Nomeação de Renato Feder é apenas o começo de um avanço truculento do projeto bolsonarista contra a educação no estado de SP
A eleição Tarcísio de Freitas (Republicanos), recém chegado a São Paulo, ao governo do estado representa um ataque articulado entre o projeto privatista e o conservadorismo das classes médias paulistas já conhecido. Como já esperado, o Palácio dos Bandeirantes vai se tornar um refúgio dos bolsonaristas expulsos de Brasília com a derrota de Jair Bolsonaro para a presidência: Ricardo Salles, o ecocida, e Mario Frias, o líder da “guerra cultural” olavista, já estão sendo cotados para assumirem secretarias.
Na educação, não poderia ser diferente. Para além do abandono histórico da educação pública pelos governos do PSDB, em especial do ensino básico, simbolizado pela falta de professores, descaso com as condições físicas das escolas e repressão constante aos sindicatos e aos estudantes, teremos agora também um empresário ultra-liberal e entusiasta das escolas cívico-militares para completar o serviço de precarização da educação em São Paulo. Trata-se de Renato Feder, atual secretário da educação do Paraná no governo de Ratinho Junior (PSD).
Sua gestão da educação paranaense é caracterizada pelo profundo alinhamento com os interesses dos grandes empresários da educação, evidenciado, por exemplo, pela abertura recente de um edital para entregar 27 escolas estaduais nas mãos da iniciativa privada. O avanço de um projeto mercadológico de educação significa, no fim das contas, a extinção de qualquer possibilidade de se promover um ensino libertador e crítico e também a supressão de quaisquer movimentos de contestação que parta dos professores e dos estudantes. Além disso, Feder pode dar seguimento à política implementada por Rodrigo Garcia (PSDB) de expandir o uso de aulas remotas para “tapar o buraco” da falta de professores: recentemente, a secretaria de educação do Paraná, sob sua direção, firmou um contrato com a Unicesumar – universidade privada pertencente ao conglomerado de instituições de ensino ‘Vitru’, atualmente em valorização na bolsa de valores e com lucro previsto de R$166 milhões no ano de 2023 – para promover aulas on-line para alunos do ensino médio profissionalizante.
Como se não bastasse, Renato Feder pode se tornar uma ameaça em outra frente: a militarização do ensino. No Paraná, Feder e Ratinho Júnior promoveram a maior ampliação das escolas cívico-militares no país: foram mais de 195 escolas estaduais que passaram a seguir o modelo. Apoiado pelos bolsonaristas, com grande adesão no interior paulista, o projeto de militarizar escolas serve para a imposição da ideologia que toma conta das Forças Armadas brasileiras: com fortes resquícios da ditadura, acréscimos das ideias formuladas na Escola Superior de Guerra e pitadas do olavismo. Com esses ingredientes, forma-se um corpo ideológico que sustenta a crença na existência de um inimigo interno que pode assumir diversas faces – os movimentos sociais, a juventude negra, a comunidade LGBTQ+, os partidos de esquerda etc.; na necessidade de tutela militar de todos os poderes e instituições; e na força do aparato policial como resolução do problema de segurança pública no Brasil. Tudo isso tem uma única função: a crescente formação de quadros que estejam dispostos a defender a “ordem” e os interesses das classes dominantes.
O ensino médio certamente será alvo do governo de Tarcisio de Freitas e Renato Feder. Após os traumas causados pela implementação do Novo Ensino Médio, ainda há muito pela frente para avançar no projeto de um ensino excludente. A inserção cada vez maior do ensino remoto é exemplo disso, o que evidencia índices de desigualdade, e elitiza o ensino público. Além de tal projeto, a privatização de escolas se combina para transformar o direito à educação em mercadoria.
Como secretário da Educação, Feder encontrará desafios de gestões anteriores, e mostra ter como “soluções” projetos inimigos da Educação e parceiros de grandes empresários que lucram com a mesma, além de flertar de maneira escancarada com o militarismo e o bolsonarismo – estes que, ideologicamente, transformam a emancipação escolar em doutrina, ainda com resquícios da ditadura militar.
Diante do ataque que representa a nomeação de Renato Feder no âmbito estadual, não resta outra interpretação: Tarcísio de Freitas declarou guerra à educação, aos estudantes e aos professores e professoras de instituições do ensino público. Porém, não podemos nos esquecer também que no âmbito nacional a luta também não será fácil. Apesar da vitória simbolizada pela derrubada de Bolsonaro e pela eleição democrática de Lula, é necessário relembrar os limites do petismo na pasta da educação. Tais limites podem ser facilmente exemplificados pela transferência incessante de renda da União para os conglomerados de educação e a vacilação para fazer avanços no currículo da educação básica – basta nos lembrarmos do recuo de Dilma no projeto de integrar políticas de educação sexual nas escolas, perante as ameaças de perder apoio parlamentar de integrantes da “bancada da bíblia”.
Diante de tantas lutas que não podem deixar de ser compradas pelo movimento estudantil, o que caberia a ele fazer, portanto? A resposta não é simples, mas uma coisa é certa: não podemos ter medo! A radicalização do bolsonarismo, tanto na esfera institucional, quanto na sociedade civil, não deixa dúvidas: não é só tempo de resistir, mas também de avançar, mantermos nossa independência enquanto movimento, levantarmos nossas bandeiras e lutarmos para a mobilização de todes es estudantes dentro das universidades e nas ruas.