Qual é o lado de Haddad? Breves reflexões sobre a visita do ministro à USP em meio à greve
Fica claro como esse encontro age como uma cortina de fumaça, para que a atenção da mídia não esteja na greve dos estudantes.
No último sábado, o atual ministro da economia e professor da FFLCH Fernando Haddad visitou a USP e se encontrou com o reitor. Na ocasião, Haddad e Carlotti trocaram afagos e fizeram uma coletiva de imprensa juntos. Nela, ambos se esquivaram do tema que pautaram os debates dentro da universidade na última semana: o desmonte da universidade, a intensa falta de docentes e a luta que partiu dos estudantes para defender a educação pública. Fica claro como esse encontro age como uma cortina de fumaça, para que a atenção da mídia não esteja na greve dos estudantes.
No último ano, uma larga parcela dos estudantes da Universidade de São Paulo se mobilizaram ativamente na campanha de Haddad para o governo, mesmo sabendo de suas limitações programáticas. Fomos às ruas defender sua candidatura para derrotar o projeto bolsonarista e neoliberal de Tarcísio de Freitas. Mesmo o petista sendo derrotado, esperávamos, no mínimo, a defesa da educação pública no cargo em que ele ocupa, em especial das universidades públicas – onde ele ainda é professor. Entretanto, nem isso Haddad fez em sua visita: ele ignorou os alunos e o sucateamento da USP.
A origem disso reside no projeto de educação que Carlotti e Haddad compartilham. Ambos quadros formados nos banquetes da elite intelectual paulistana e nas reuniões de gabinete da burocracia universitária, suas ideias se pautam pelo “neoliberalismo progressista”, que tenta apaziguar as disputas através de uma política conciliatória que tem como eixo os interesses privados e o “equilíbrio das contas públicas”, ao mesmo tempo em que se apresenta com um “verniz” modernizante e em oposição à direita bolsonarista. Na USP, isso se manifesta no argumento da reitoria de que não se pode haver novas contratações e mais investimento nas políticas de permanência pela “responsabilidade fiscal”, mesmo tendo dito em campanha que seria uma “nova reitoria”, que atenderia os anseios dos estudantes e dos trabalhadores da USP. Por outro lado, no âmbito nacional, é no novo teto de gastos emplacado por Haddad e Lula que isso aparece de forma mais gritante, limitando os gastos na educação e na saúde e fragilizando os serviços públicos utilizados pela população que foi às ruas para eleger o novo governo e derrotar as políticas antipovo do bolsonarismo.
Em oposição, os estudantes grevistas agitam um projeto de educação 100% público, democrático e de livre acesso a todes. As principais pautas da greve, de fato, são a contratação de professores e a expansão das políticas de permanência estudantil. Porém, isso não nos basta. Vemos as nossas mobilizações como um ponto de partida para impulsionar uma nova geração de estudantes a se engajarem na luta para reverter os processos de desmonte empreendidos contra a educação pública.
Por fim, a visita de Haddad tinha como objetivo divulgar “inovações tecnológicas”, mas vale ressaltar que sem professores e estudantes essas inovações não existem. E, sem uma nova política econômica e de educação, essas inovações ficarão cada vez mais trancafiadas dentro das universidades e submetidas aos interesses do mercado, e não da população.