Será que o Maracanã vai virar MaracaneX*?
O Juntos! esteve presente no ato contra a privatização do Maracanã, que reuniu cerca de 400 pessoas na última quinta (11), em frente ao Palácio Guanabara, onde acontecia a abertura dos envelopes da licitação do estádio.
por Daniel Faria**
O Juntos! esteve presente no ato contra a privatização do Maracanã, que reuniu cerca de 400 pessoas na última quinta (11), em frente ao Palácio Guanabara, onde acontecia a abertura dos envelopes da licitação do estádio.
Convocada a partir das redes sociais, a concentração começou às 7h no Largo do Machado, e por volta das 9h os manifestante seguiram rumo à sede do governo estadual, onde a abertura dos envelopes estava prevista para as 10h. Ao contrário do que afirmou o jornal O Globo, o protesto não “fechou as principais ruas em torno do palácio”: devido a um acordo com a polícia, tanto a marcha quanto o protesto ocuparam meia-pista.
O “tumulto” na manifestação, que também foi destacado pela imprensa, não passou de atos isolados de grupos minoritários que entraram em confronto com a polícia. O clima geral entre os manifestantes foi pacífico e marcado por gritos de ordem como “O Maraca é Nosso, e não das empreiteiras”, e pela diversidade, refletida nas reivindicações, que incluíam críticas ao leilão do petróleo e solidariedade à Aldeia Maracanã.
Se o protesto ocorreu sem maiores problemas, o processo de licitação foi tumultuado. No dia anterior, uma liminar do Ministério Público Estadual havia suspendido a licitação, apenas para ser derrubada horas mais tarde pela presidente do Tribunal de Justiça do Rio.
A audiência também foi interrompida no dia pela presença dos deputados estaduais Marcelo Freixo e Janira Rocha, ambos do PSOL. Inicialmente, os parlamentares foram impedidos de entrar pelos seguranças, supostamente por ordens do governador, e só conseguiram a autorização depois de 40 minutos. A audiência foi interrompida sob a alegação de que a população teria o direito de participar do processo de licitação.
A abertura dos envelopes revelou dois concorrentes no processo: o “Consórcio Maracanã SA”, formado pela Odebrecht Participações e Investimentos, pela IMX Venues e pela norte-americana AEG Administração de Estádios (dos Estados Unidos); e o “Consórcio Complexo Esportivo e Cultural do Rio de Janeiro”, formado pela OAS AS, pela Stadion Amsterdam NV (da Holanda) e pela Lagardère Unlimited (da França).
A IMX é de propriedade do empresário Eike Batista, tendo sido a razão da liminar do Ministério Público, que questionava a participação da empresa no estudo de viabilidade do projeto; e a Odebrecht participa da atual reforma do Maracanã, o que torna o primeiro consórcio como favorito, na opinião de Marcelo Freixo. O deputado também entrou com uma ação civil pública na Justiça, contra um suposto favorecimento à IMX, e pretende questionar na Justiça a falta de acesso do público à audiência.
O debate sobre a privatização do Maracanã deve ser mais do que simplesmente ideológico. É claro que a entrega à iniciativa privada (e consequente elitização) de um dos maiores símbolos do Rio de Janeiro é um grave problema. Mas, mais do que isso, o que parece indefensável é a maneira que essa privatização será feita.
Desde 1999, foram investidos no “Maior do Mundo” aproximadamente 1,5 bilhão de reais, o que corresponde a 110 milhões por ano. O consórcio vencedor pagará, durante 35 anos, 153 milhões de reais, ou 4,5 milhões anuais. Um prejuízo enorme e incontestável.
Outro ponto muito criticado no projeto é que ele prevê a demolição de outros espaços públicos, como a Escola Municipal Friedenreich (uma das melhores do país), a Aldeia Maracanã (antigo Museu do Índio), além do Parque Aquático Júlio Delamare e o Estádio de Atletismo Célio de Barros, locais de treinamento dos atletas e palco de programas sociais. A ideia é construir estacionamentos, restaurantes, lojas e bares.
Estamos presenciando, mais uma vez, os megaempreendimentos orquestrados pela dupla Paes e Cabral beneficiar grupos restritos da sociedade, como as empreiteiras e incorporadoras multinacionais envolvidas nesta licitação. Em troca, recebemos a demolição de patrimônios culturais, o aumento da especulação imobiliária, o desalojamento de bairros inteiros e o direito de assistir aos jogos da copa e das olimpíadas no conforto do sofá das nossas casas, pois a geral já nos foi tirada em demolições passadas.
Em tempo: a primeira área do “novo Maracanã” a ficar pronta foram os camarotes. Nada mais representativo.
*As empresas do grupo EBX de Eike Batista são conhecidas por possuir a marca X em suas siglas. Por isso o trocadilho com o nome do Maracanã.
**Daniel Faria é estudante de Comunicação Social da UFRJ e militante do Juntos RJ.