Diretor de Direitos Humanos da UNE protocola carta ao Secretário Nacional de Justiça
Nesta última quarta-feira, 23 de outubro, o Diretor de Direitos Humanos da UNE pela Oposição de Esquerda e membro do Grupo de Trabalho Nacional do Juntos, Thiago Aguiar, protocolou junto ao Secretário Nacional de Justiça Paulo Abrão, uma carta tratando sobre a onda repressiva que assola os movimentos sociais em todo o Brasil
Nesta última quarta-feira, 23 de outubro, o Diretor de Direitos Humanos da UNE pela Oposição de Esquerda e membro do Grupo de Trabalho Nacional do Juntos, Thiago Aguiar, protocolou junto ao Secretário Nacional de Justiça Paulo Abrão, uma carta tratando sobre a onda repressiva que assola os movimentos sociais em todo o Brasil com presos políticos no Rio de Janeiro, uso da Lei de Segurança Nacional para a detenção de manifestantes, a utilização da Lei de Organizações Criminosas para enquadrar jovens militantes bem como o recente uso do Exército por parte do Governo Federal para conter manifestações democráticas. A carta exige a suspensão imediata desses inúmeros processos repressivos bem como propõe a abertura de amplos debates por todo país sobre o tema. Confira abaixo o documento entregue:
Carta da Diretoria de Direitos Humanos da UNE a Paulo Abrão, Secretário Nacional de Justiça
São Paulo, 23 de outubro de 2013.
Caro Senhor Paulo Abrão,
Secretário Nacional de Justiça e Coordenador da Comissão de Anistia do Ministério da Justiça,
Na data de hoje, reunimo-nos com o senhor para expressar a profunda indignação do movimento estudantil brasileiro com a onda de repressão promovida pelos governos às recentes manifestações organizadas pela juventude e por categorias de trabalhadores em greve em todo o país.
Nas manifestações de junho, o caráter das Polícias Militares e do tipo de repressão por elas realizado revelou-se em plenitude. Após semanas de intensos conflitos, que resultaram em centenas de prisões e de ativistas e mesmo profissionais da imprensa feridos, amplas parcelas da sociedade condenaram a violência policial e passaram a exigir que o exercício do direito à livre manifestação e expressão fosse respeitado. Nesse contexto, muitos governos recuaram e a reivindicação de queda das tarifas de transporte, entre tantas outras apresentadas pelo povo, foi conquistada em quase 100 cidades do país.
Posteriormente, no entanto, num movimento coordenado com diversos órgãos de imprensa e comunicação que voltam a reproduzir o velho discurso que criminaliza os movimentos sociais, houve um recrudescimento brutal da repressão policial em vários Estados do país. É no Rio de Janeiro, no entanto, que a situação ganha contornos mais dramáticos. A greve dos professores levou às ruas dezenas de milhares de pessoas em apoio às reivindicações da categoria e se enfrentou com uma ação desequilibrada, intensamente violenta e inaceitável por parte da Polícia Militar, comandada pelo governador Sérgio Cabral Filho.
Causa-nos igual indignação a aplicação de mecanismos legais ilegítimos e mesmo inconstitucionais, como a Lei de Segurança Nacional, resquício imundo da ditadura militar que mancha a história recente de nosso país, utilizada em São Paulo para processar jovens manifestantes.
Não é apenas, entretanto, o recurso a antigos dispositivos do último governo ditatorial do Brasil que marca o aparato repressivo em meses recentes. A lei 12850/2013, conhecida como “Lei de Organizações Criminosas”, proposta pelo Ministro da Justiça José Eduardo Cardozo e aprovada pelo Congresso Nacional, foi utilizada para enquadrar e processar dezenas de jovens presos na manifestação de 15/10 no Rio de Janeiro. Cerca de 10 deles, ao que consta, seguem num presídio. É simplesmente inaceitável que num Estado Democrático de Direito leis tipifiquem como “organização criminosa” a manifestação política e a livre associação do povo para reivindicar seus direitos.
O espírito repressivo e punitivo que toma conta de governos, de diversos matizes ideológicos e partidários, teve seu corolário no envio das Forças Armadas e da Força Nacional de Segurança para reprimir centenas de manifestantes contrários à privatização do campo de Libra nesta segunda-feira 21/10. Ao mesmo tempo em que a juventude honrava a história de nosso povo, que defendeu nossos recursos naturais e construiu a Petrobrás na década de 1950, o governo federal relembrou páginas vexatórias e lamentáveis de nossa história ao enviar fragatas da Marinha e homens do Exército para reprimir aqueles que não concordam com a dilapidação do patrimônio nacional.
Temos acompanhado a atuação do senhor na condução dos trabalhos da Comissão de Anistia do Ministério da Justiça. Consideramos este trabalho de enorme valia para que o povo brasileiro possa conhecer a verdade por trás dos assassinatos, torturas e perseguições cometidos pelo Estado brasileiro durante a ditadura militar. Lamentamos, no entanto, que neste mesmo Ministério diretrizes como as presentes na lei 12850/2013 orientem a atuação do Estado, as mesmas, aliás, que populações indígenas do Mato Grosso do Sul e do Paraná têm experimentado ao longo deste ano.
Reivindicamos do Ministério da Justiça e do senhor a libertação imediata de todos os jovens ativistas presos durante as recentes manifestações. Em particular, temos a convicção de que o conjunto da juventude brasileira e do movimento estudantil não aceitam que dezenas de pessoas estejam sendo indiciadas e processadas de acordo com a “Lei de Organizações Criminosas”. É preciso interromper imediatamente tais processos! Em adição, reivindicamos veementemente que o governo federal comprometa-se a enviar ao Congresso Nacional projeto de lei que reforme o disposto na lei 12850/2013 para impedir que movimentos sociais, organizações políticas e sindicais sejam consideradas organizações criminosas ou mesmo terroristas, como o texto da lei permite. Por último, consideramos fundamental que se abra um amplo processo de debates em todo o país com organizações de Direitos Humanos e entidades da sociedade civil sobre a recente onda repressiva adotada por governos estaduais e pelo governo federal. Somente a discussão democrática e a participação popular podem apontar o caminho para a real democratização de nosso país e o combate aos resquícios dos regimes de exceção presentes no aparato repressivo nacional, como centenas de trabalhadores pobres em nosso país, dos quais Amarildo é um triste exemplo, presenciam diariamente em comunidades Brasil afora. São estes os compromissos que esperamos e desejamos do senhor.
Cordialmente,
Thiago Trindade de Aguiar
Diretor de Direitos Humanos da União Nacional dos Estudantes
Para ver a carta em versão PDF clique aqui