Destruição e impunidade não podem vencer
O início da destruição da legislação ambiental brasileira encabeçada por Aldo Rebelo, patrocinada pelos ruralistas e posta em prática por 410 deputados federais na noite do dia 24/05, além das consequências ambientais, traz à tona uma disputa de rumos no país e suas mensagens implícitas que mostram quais valores estão sendo parcialmente vitoriosos nesse processo.
O início da destruição da legislação ambiental brasileira encabeçada por Aldo Rebelo, patrocinada pelos ruralistas e posta em prática por 410 deputados federais na noite do dia 24/05, além das consequências ambientais, traz à tona uma disputa de rumos no país e suas mensagens implícitas que mostram quais valores estão sendo parcialmente vitoriosos nesse processo.
O código florestal brasileiro é a lei que rege toda a relação da estrutura fundiária nacional com a preservação florestal, sendo responsável, em linhas gerais, por delimitar os índices mínimos aceitáveis de remanescentes florestais visando à preservação da biodiversidade, a garantia das funções social, ambiental e econômica da terra, além da garantia de que áreas que se tornariam de risco caso desmatadas ou ocupadas sejam preservadas.
O texto do código, que foi desmontado pela câmara dos deputados na fatídica “noite das trevas”, foi construído entre 1963 e 1965 por uma comissão composta por pesquisadores, técnicos e ambientalistas, muitos consagrados até os dias de hoje. Foram feitas pesquisas e encontrados índices visando uma relação equilibrada da produção econômica do campo e da expansão humana no território. Ou seja, foi feito um texto com uma clara intenção na positiva da promoção do desenvolvimento humano e do progresso sócio-ambiental brasileiro.
Desconsiderando todo este espírito por trás do que era o código florestal, sobretudo após o decreto federal que passou a definir como crime ambiental o descumprimento de artigos da lei de 1965, a bancada ruralista se apressou por encabeçar uma comissão de reforma do código. O relatório final terminou com uma proposta final de código em marcos completamente distintos dos da lei anterior.
Ao invés de especialistas e políticos com comprometimentos ambientais, a maioria esmagadora da comissão era de ruralistas, em que muitos inclusive receberam milhões de reais de empresas do agronegócio para financiar suas campanhas ou possuem multas e irregularidades ambientais em sua vida pessoal. Ao invés de uma iminente preocupação com as questões ambientais, a preocupação explícita da maioria da comissão foi com a ampliação da possibilidade de utilizar o meio ambiente como um mero instrumento de ampliação do capital.
Sob esse espírito, foi promovido um falso “fla x flu ” entre produção rural e preservação ambiental (ainda que mínima), confundindo a população, os produtores rurais e instaurando de maneira velada uma verdadeira guerra de distintos projetos de país.
A forma como se deu o debate deste código aprovado, que me recuso a chamar de florestal, foi sintomática dessa disputa. Houve tentativas de votar a proposta sem que o texto estivesse disponível, ou seja, sem que os deputados sequer lessem do que tratava a matéria, houve propostas de emendas mirabolantes e ausente de critérios técnicos/ambientais por parte do governo e oposição, que até mesmo feriam a constiuição federal.
Sobretudo, houve um atropelo ao colocar a matéria em regime de urgência na pauta da câmara, desrespeitando por completo o tempo mínimo aceitável para um debate honesto com a sociedade dos valores que estarão sendo promovidos pela nova lei.
Toda essa bagunça e atropelo foram arquitetados passo a passo pelos ruralistas, setores do governo e o que há de mais retrógrado e conservador no Brasil. Para constatar tal afirmação basta verificar na mídia quem são os protagonistas do texto aprovado e verificar quais tem sido suas proposições recentes.
Além de todo este contexto, que foi aspecto fundamental para o código ficar com o trágico texto e a respectiva calamitosa emenda 164 (que, na prática joga para os estados decidirem o que são as APPs e elimina atribuições federais fundamentais), a nova lei passa duas claras mensagens: destruição e impunidade.
A nova quantidade de área que poderá ser destruída com a flexibilização da Reserva Legal e o que quer que venham a ser as “APPs lights” no futuro são uma clara mensagem favorável à destruição do que ainda está de pé. Praticamente um tiro de largada para os tratores e moto-serras país afora. Além disso, o corrente descumprimento do Código de 1965 cometido por muitos ruralistas, como num passe mágica pode deixar de existir. Ou seja, quem nunca respeitou a lei acaba de ganhar a legitimidade de seguir na impunidade encontrada até ontem, pois os crimes simplesmente não existem mais.
Contudo, a luta não está perdida, muito ainda vai transcorrer em relação a esta questão, são muitas as pessoas e entidades que, antes desligadas, agora voltaram suas atenções ao cenário político nacional. Outras questões fundamentais para o meio ambiente e a sociedade brasileira estarão em pauta no congresso e exigirão o comprometimento e a luta destes novos despertos, além do que, o “Código Aldo Rebelo” ainda passará pelas mãos do Senado e da Presidente da República.
Para que ainda exista esperança, estão sendo fundamentais as lutas promovidas pelos parlamentares do PSOL e de alguns outros partidos, pelas ONGs ambientalistas, sindicatos, entidades estudantis e especialistas, que tem cerrado fileiras na luta por um país no sentido oposto ao que corrobora a aprovação do novo código.
A pressão tem que crescer, é preciso haver um combate implacável à bandalheira política promovida no momento dos debates, tanto os de agora como nos que virão. A hora é de projetar os próximos passos e aos que se indignam saber que está sendo desenhada e acirrada neste exato momento uma polarização na disputa pelo futuro do país e, por isso, deixar de estar ao lado dos que visam um país justo e igualitário é o único caminho que, com certeza, nos impedirá de vencer.