Os interesses por trás das mudanças no Código Florestal
A discussão sobre o novo Código Florestal brasileiro dividiu a sociedade sobre a questão ambiental no país. De um lado, grandes produtores rurais defenderam regras frouxas para o desmatamento e para a poluição de rios e solos. De outro, movimentos ambientais defenderam rigor na preservação, punição severa para desmatadores e poluidores, além de mudanças na […]
A discussão sobre o novo Código Florestal brasileiro dividiu a sociedade sobre a questão ambiental no país. De um lado, grandes produtores rurais defenderam regras frouxas para o desmatamento e para a poluição de rios e solos. De outro, movimentos ambientais defenderam rigor na preservação, punição severa para desmatadores e poluidores, além de mudanças na produção agrária.
Um bom exemplo dessas diferenças apareceu no debate sobre a definição das áreas a serem preservadas. Os ambientalistas defenderam uma área de preservação de 30 metros nas margens dos rios, a mata ciliar, sem contar as áreas naturais de alagamento. Defenderam também a proibição do desmatamento em encostas e topos de morro e a fiscalização rigorosa dos desmatadores, recordando as centenas mortes pelos os graves deslizamentos ocorridos no Rio de Janeiro e por todo país.
Já os ruralistas propuseram o oposto, a diminuição pela metade da área de preservação da mata ciliar (para 15 metros) a partir do leito dos rios, ignorando suas áreas de alagamento. Defenderam também a liberação do desmatamento em encostas e topos de morros e o perdão para os fazendeiros que já desmataram locais proibidos.
O que está em jogo?
A divergência esclarece bem os interesses por trás do conflito. Os deputados da bancada ruralista no Congresso têm suas campanhas eleitorais financiadas por latifundiários justamente para defender os interesses do agronegócio. Este setor defende que o modelo agrário no Brasil continue o mesmo dos tempos da colônia, com grandes latifúndios produzindo para exportação e utilizando mão de obra barata ou escrava. Há séculos esse tipo de produção destruiu imensa parte da mata atlântica, e hoje os grandes produtores de soja, criadores de gado, arrozeiros, entre outros, avançam sobre o cerrado e a floresta amazônica, sempre em combinação com a destruição causada pelos madeireiros.
Um dos principais argumentos para a expansão do agronegócio sobre as florestas é a necessidade da produção de alimentos para o combate à fome. Nada mais mentiroso, pois a produção em larga escala é realizada basicamente para a exportação, e cada vez mais a produção nas terras mais férteis dá lugar à do etanol (combustível feito através da cana) ou da soja para rações animais. Com isso a produção de alimentos é feita nas terras mais pobres e, para aumentar a produtividade, são entupidas de agrotóxicos, fertilizantes químicos, entre outros insumos venenosos. Além de ser um ataque à saúde da população, também encarecem os alimentos consumidos pelo povo.
O governo de joelhos aos ruralistas
O governo indicou o deputado Aldo Rebelo (PCdoB/SP) como relator do projeto para negociar com ruralistas e ambientalistas. A proposta final do deputado foi um escândalo: defendeu os ruralistas e gerou uma crise no governo, já que caía a máscara do PT que historicamente defendeu a preservação. A senadora Kátia Abreu (PSD/TO), presidente da Confederação da Agricultura e Pecuária (CNA) e liderança dos Democratas na época (partido da oposição de direita), elogiou bastante o projeto e mudou de partido no mesmo período, fundando o PSD (Partido Social Democrático) com o prefeito Kassab e aproximando latifundiários para o governo Dilma.
O desconforto de alguns deputados petistas não impediu o governo de atuar pelos grandes fazendeiros. O deputado Aldo Rebelo, ex-presidente da UNE e ex-comunista, como responsável pelo “trabalho sujo” na defesa dos grandes produtores foi alvo de vários protestos. Pelo lado ambientalista, o destaque foi o PSOL (Partido Socialismo e Liberdade), com os deputados Ivan Valente (PSOL/SP) e Chico Alencar (PSOL/RJ) atuando contra o governo e propondo um modelo agrário mais justo.
O capitalismo destrói a natureza
O nó dessa questão está no próprio funcionamento de nossa sociedade, onde a busca desenfreada por lucros põe a preservação da natureza em segundo plano. A produção em áreas desmatadas, a ocupação irregular de áreas de preservação e a poluição de rios e solos são realizadas principalmente por grandes empresas que põem seus interesses particulares acima do interesse coletivo e influenciam o governo através de seu poder econômico.
Nessa disputa o governo Dilma já definiu seu lado. Independentemente de concessões menores, o desmatamento e a poluição no geral são aceitos em nome do “crescimento econômico”, e o fato de todos os ministros da Agricultura dos governos petistas serem ligados ao agronegócio confirma isso. Para preservar o meio ambiente é necessário inverter a lógica social e pensar no benefício de todos, não de poucos. E para desafiar esses poderosos interesses, só palavras e boa vontade não bastam.
O movimento ambientalista coerente defende a preservação ecológica e a qualidade de vida das pessoas, a divisão da grande propriedade através da reforma agrária e o incentivo à agricultura familiar, fonte sustentável da maior parte dos alimentos consumidos na cidade.