Tarso Genro, a reforma do Ensino Médio, o piso nacional e o concurso público
A situação da relação magistério e governo estadual no RS está crítica. O magistério gaúcho vem sofrendo dos últimos governos o maior descaso que a categoria, até então, sofrera. A atual política adotada pelo governador e pelo secretário da educação tornou esse descaso vergonhoso e alavancou a ira dos profissionais da Educação.
* Rafael Lapuente
A situação da relação magistério e governo estadual no Rio Grande do Sul está crítica. O magistério gaúcho vem sofrendo dos últimos governos o maior descaso que a categoria, até então, sofrera. Porém, a atual política adotada pelo governador Tarso Genro e o secretário da educação José Clovis de Azevedo tornou esse descaso vergonhoso para a figura do governador e alavancou a ira dos profissionais da Educação, que creditaram no ex-ministro da educação do governo Lula suas fichas para a reversão do desleixo dos outros governos perante os educadores, o que, para a desilusão dos professores, não aconteceu.
Os ataques à educação já iniciaram nos primeiros momentos do governo. Na primeira articulação, Tarso Genro e a base aliada implantaram, contra a vontade do CPERS, uma reforma do Ensino Médio que distancia ainda mais o estudante de escola pública, que já enfrentava sérias dificuldades quanto à concorrência com os alunos do ensino privado no ingresso à Universidade e aos cursos técnicos públicos (que também são bastante concorridos). A atitude do governo estadual no ensino médio deixa o empresariado feliz e sorridente: O objetivo e reflexo dessa reforma que “prepara o aluno para o mercado de trabalho” é fazer pessoas competentes para o sistema industrial capitalista com cabeças vazias e mão de obra barata. Além do mais, o estágio será obrigatório e gratuito, prestando serviços gratuitos às empresas. O que agrava mais o regresso com a reforma do Ensino Médio é que ela ocorrerá só no ensino público, ou seja, os alunos do ensino privado estarão com a vida ainda mais facilitada para serem aprovados no vestibular, pois a concorrência, que já é desleal, se acentua ainda mais, enquanto que o aluno do ensino público terá que se virar sozinho ou com cursinhos pré-vestibulares – geralmente mais caros e inviáveis para a maioria dos estudantes da escola pública.
O governo estadual gaúcho promoveu também mais um golpe duro contra a educação. Depois de Tarso Genro prometer implantar o Piso Nacional dos professores em uma assembleia no CPERS, durante a campanha eleitoral, e com esse voto de confiança dado pelos professores impulsionar sua votação a governador, ele e o secretário José Clóvis de Azevedo primeiro entram com um pedido de inconstitucionalidade na lei que ele mesmo criou já em janeiro de 2011 (primeiro mês de mandato), vindo a ser indeferido o pedido pelo Supremo. Não satisfeito, o governo entrou novamente com um pedido de inconstitucionalidade, sendo novamente indeferido. Agora, o governador tenta dar outro golpe, ao tentar modificar o indexador de reajuste do Piso Nacional dos professores do FUNDEB para o INPC. A ideia do governador é diminuir o índice de reajuste.
Só para se ter uma ideia, caso o INPC fosse adotado, o reajuste seria de 6,2% este ano e não 22,3%. Atualmente, a diferença entre o vencimento básico dos professores e o piso nacional ultrapassa nada mais nada menos que 80%. Pouco menos de um ano de mandato o governo declara que o planejamento se daria através do INPC, desconsiderando a constitucionalidade da lei do Piso que zela pelo FUNDEB como indexador e elevando o salário dos professores até 2014 para R$1.260,19, sendo que HOJE o piso está em R$ 1.451,00. Não bastando todo esse desrespeito com os profissionais, o governo tentou, de forma suja, ludibriar a população gaúcha investindo em propaganda nos grandes jornais da cidade e em outros veículos de comunicação, como Rádio e TV, como o governo que concedeu “reajuste histórico” para os professores, como se os23,5% aproximassem o salário atual dos professores ao salário mínimo da categoria e encaminhou esse reajuste de forma emergencial para não dialogar com o CPERS, e a oposição, de minoria absoluta, assistia o reajuste do governo ser aprovado e se retirou da votação para tentar a anulação por falta de Quórum – o pedido do CPERS era para a votação ser adiada, pois assim o sindicato teria mais tempo para dialogar com o governo, outra promessa feita na campanha e não foi posta em prática pelo governador.
No meio de toda essa novela com o descaso ao pagamento de um direito constitucional que os professores têm, o Ministério Público decidiu entrar na jogada. Em março deste ano, a ação movida em Setembro de 2011 pelo MP na Justiça gaúcha DETERMINA o pagamento do Piso Nacional para janeiro de 2013 RETROATIVO a janeiro de 2009 (nesta época, a governadora era a Yeda Crusius, do PSDB, que ficou mais famosa pelo desleixo com o funcionalismo público e com as denúncias de corrupção), quando a lei do Piso passou a valer e desde lá, para o magistério gaúcho, não significou nada de aumento real nos salários. A essas alturas, não sendo mais surpresa a ninguém, o governador Tarso Genro e o secretário da Casa Civil Carlos Pestana voltaram a tomar uma atitude nada comparável com o comprometimento que ele tivera em campanha eleitoral: Recorreram da decisão judicial sob a mesma alegação de que questionavam o índice de reajuste ser o FUNDEB, retardando ainda mais o pagamento do piso aos professores.
E justamente o não pagamento imediato do piso nacional poderá acarretar no maior desastre financeiro da história do Rio Grande do Sul: Quanto mais o governo demorar a pagar o piso, automaticamente estará gerando um passivo cada vez maior nas finanças do Estado, acumulando valores retroativos cada vez maiores e debilitará o Tesouro gaúcho como jamais em sua história. Tudo isso por que é uma lei constitucional, e os professores já estão reivindicando seu direito na Justiça, sendo certamente os vencedores da causa judicial: Isso acarretará num rombo financeiro que será pago e médio prazo, e o governador Tarso não estará mais no poder gaúcho, ou seja, Tarso Genro e Yeda Crusius plantaram hoje o abacaxi e amanhã outro governador terá que descascá-lo por incompetência e desleixo desses chefes de estado – Cristóvam Buarque, senador pelo PDT, concedeu entrevistas defendendo o impeachment aos governadores e prefeitos que não cumprirem a lei do piso.
Tarso Genro e Yeda Crusius, além do não cumprimento da lei do Piso, têm algo a mais em comum: Ambos foram os únicos que cortaram o ponto dos professores nas greves que eles fizeram pela luta do piso nacional. Apesar de nada justificar a atitude do governo Yeda Crusius, a contradição pendeu para o governador petista outra vez: Logo quando assumiu em 2011, o governo do PT, que durante o governo Yeda fez severas críticas ao corte de ponto dos professores, aprovou o pagamento do ponto aos professores que fizeram greve durante o governo tucano, como forma de bancar o “amiguinho” dos professores, mas na primeira manifestação de greve realizada em novembro do ano passado, não autorizou o abono do ponto dos professores que fizeram greve na gestão de Tarso Genro. Obviamente, vindo de um governo tucano, que tradicionalmente reprime os trabalhadores durante suas reivindicações, em nada surpreende, mas vindo do partido que se diz dos trabalhadores, que quando era oposição organizou uma série de greves e manifestações, ressalta a contradição do governo do PT a nível estadual também, pois Dilma Rousseff, ex-anistiada política, na greve dos policiais baianos, defendeu veementemente não apoiar a anistia aos grevistas alegando que eles estavam fora da lei, como se ela no período militar, quando guerrilheira, estivesse dentro da constituição daquele período.
Para fechar a série “como desvalorizar os professores em um ano e quatro meses de governo”, o Secretário da Educação Zé Clóvis anuncia concurso público para o magistério gaúcho, com 10 mil vagas para o professorado gaúcho, tendo a inscrição de 70 mil professores a um valor de inscrição de R$ 120,00, gerando uma receita de oito milho~es e quatrocentos mil reais aos cofres públicos. Além do objetivo não declarado que era lucrar com o concurso, o objetivo declarado pelo secretário é cancelar 10 mil das 19 mil contratações que há no Estado, pois, de acordo com o secretário, os contratos são constantemente cancelados pelos professores quando os mesmos recebem melhores propostas do ensino privado (qualquer instituição de ensino privado valoriza financeiramente mais o professor que o estado), e o Concurso objetiva a continuidade dos professores. Porém, o maior desleixo com os concursandos ocorreu durante a aplicação da prova na cidade de Uruguaiana, no último domingo, dia 15 de Abril: Os candidatos ao cargo de professor de Língua Portuguesa e Educação Física tiveram suas provas trocadas na aplicação do teste. A coordenação, para tentar consertar a situação, propôs a tiragem de XEROX das provas, pois o Estado não enviou a quantidade de provas que suprisse a quantidade de candidatos. Os candidatos de Educação Física, inteligentemente, se negaram a fazer o concurso e prestaram queixa na delegacia, alegando acertadamente que as provas devem ser lacradas e que essa norma é uma lei federal.
Diante de todos esses problemas que ocorreram durante a gestão do Governador que era tido como o “salvador da pátria dos professores”, eu conversei com alguns profissionais vinculados ao Estado, e o que percebi foi a total desilusão e desistência dos professores quanto à valorização deles pelo Estado. Isso, obviamente, deixa um sinal de alerta ligado. Discordo deles quando pensam em desistir das lutas, pois várias foram travadas e todas perdidas, mas compreendo quando pensam assim. Desde o governo do peemedebista Germano Rigotto, de 2002, o magistério têm as portas do Palácio Piratini fechadas para fazer suas reivindicações, e quando abrem essas portas, raramente tem seu pedido atendido. Dentro de governos da Direita que não tem nenhuma ligação com a educação, o magistério suportou os duros golpes que sofreu de Rigotto e Yeda. Esses não se elegeram com o voto unânime dos professores e não ouviram desses governantes a palavra de que garantiria a categoria o cumprimento de suas exigências. Mas no governo Tarso foi diferente: Havia a esperança que o ministro que garantiu a lei do piso e instituiu outros avanços na área da educação como o Programa Universidade para Todos (PROUNI) fosse o governador dos gaúchos. Havia o desejo de que a partir de janeiro de 2011 começasse um novo governo nos moldes de Leonel Brizola e Júlio de Castilhos, que deram a devida valorização ao ensino. Mas não foi assim. Tarso foi mais duro que os governadores anteriores, iludiu os professores, modificou o ensino médio contra a vontade da categoria e instituiu um concurso falho e com fins lucrativos, com as normas das provas alteradas durante as férias da categoria para anular a possibilidade de greve.
Seja como for, a união não deve ser dos professores, deve ser da sociedade. Todos querem ensino de qualidade a nossas crianças, mas nem todos se unem a luta da categoria do magistério. Sem cumprimento de direitos, não se pode dar total atenção ao cumprimento dos deveres, e a categoria está cansada de lutar quase sempre sem o apoio da massa social. É hora de união. É hora de apoio. De reivindicação. Com a força dos professores, mas também de estudantes, pais e demais setores da sociedade. Se os pais estão cansados de assistirem a paralisações dos professores, os professores estão mais cansados de gritar, lutar, batalhar, e terem como resultado mais mentiras eleitorais, mais promessas não cumpridas, mais descaso com a educação, que é ela, como diria Paulo Freire, não a responsável pela mudança da sociedade, mas pela mudança das pessoas, e essas serão as responsáveis pela mudança social.
* Rafael é do Juntos! e graduando de licenciatura em História pelo Centro Universitário Leonardo da Vinci (UNIASSELVI).