Os muitos motivos do “Fora Cabral”
“Fora Cabral”: esse é o principal grito nas ruas da cidade. De todos os governantes do país, Cabral foi o mais prejudicado com os protestos de junho. No Rio, as manifestações se concentraram principalmente na sua figura.
Daniel Faria*
“Agora é a vez do governador Sérgio Cabral ser o vice”. Quem disse isso foi Eduardo Paes, prefeito do Rio, defendendo que Cabral compusesse a chapa de reeleição de Dilma. A troca também foi defendida pelo vice-governador, Luiz Fernando Pezão: “Nada contra nosso Michel Temer, mas o Rio tem de se colocar”.
Isso foi em outubro de 2012. Depois da fácil reeleição de Paes, nada parecia poder impedir o projeto de poder do PMDB no Rio. Hoje, Sérgio Cabral é o governador mais mal avaliado do Brasil. Há quem diga que o próprio secretariado de Paes defende que o prefeito busque desvincular sua imagem da do governador, e a tão adiantada candidatura de Pezão a sucessão de Cabral parece difícil de decolar.
Cabral foi reeleito, em 2010, com cerca de 65% do votos já no primeiro turno. Como chegou a apenas 12% de aprovação?
As chuvas que atingiram a região Serrana no início de 2011, deixando mais de 900 mortos, foram um sinal de que o segundo mandato seria mais turbulento que o primeiro. Boa parte dos recursos para a recuperação das cidades foi desviada, e o descaso continuou a matar e a deixar inúmeros desabrigados nos temporais dos anos seguintes.
A imagem de Cabral foi incialmente prejudicada em dois episódios que revelaram sua relação com empresários: em 2011, usou um jatinho de Eike Batista para ir numa festa de Fernando Cavendish; e em 2012 vazaram fotos do governador, com alguns de seus secretários e o próprio Cavendish, festejando em um restaurante em Paris. Os dois empresários têm vários contratos com o governo do estado e, não por acaso, foram doadores da campanha de Cabral.
Mas o inferno astral do governador estava reservado para esse ano. Pra começar, sofreu desgaste com a privatização do Maracanã, por uma série de motivos: os gastos na reforma (mais de 1 bilhão) e o pouco retorno que a concessão vai trazer; a entrega do estádio à Odebrecht e à IMX, de Eike Batista; a elitização do estádio; a demolição da Aldeia Maracanã, do Parque Aquático Júlio Delamare e do Estádio de Atletismo Célio de Barros, supostamente necessárias pra reforma.
Já durante a onda de protestos que começou em junho, novos fatos derrubaram a já combalida popularidade de Cabral: o uso indiscriminado dos muitos helicópteros do governo, a violência policial na repressão aos próprios protestos, o decreto inconstitucional que criou uma comissão para combater o vandalismo nas manifestações, os 10 mortos numa operação policial na Maré e o sumiço de Amarildo, morador da Rocinha.
Duas das marcas do seu governo são cada vez mais criticadas: a UPP, pelo entendimento de que só a ocupação policial não resolve nada; e a escolha do Rio para sediar a Copa do Mundo e as Olímpiadas, que não trazem benefícios para a cidade na mesma proporção dos seus gastos.
Para finalizar, no dia 30 de julho, uma adutora da CEDAE se rompeu em Campo Grande, matando uma criança e afetando mais de 200 casas. Ao visitar a região, o governador foi hostilizado pelos moradores, que o chamaram de covarde e levantaram cartazes escritos “Fora Cabral”.
“Fora Cabral”: esse é o principal grito nas ruas da cidade. De todos os governantes do país, Cabral foi o mais prejudicado com os protestos de junho. No Rio, as manifestações se concentraram principalmente na sua figura, fato que fica evidente com os atos em frente a sua casa. Isso quer dizer que o futuro do governador não será tranquilo.
Depois de mais um de mês adotando uma postura arrogante, relacionando os protestos aos seus adversários políticos e à organizações internacionais, Cabral admitiu em recente entrevista ter sido tocado pela humildade do Papa Francisco e mudou seu discurso. Fez uma autocrítica de seu governo, recuou em alguns pontos, e prometeu estar aberto ao diálogo.
Quem conhece o governador sabe que essas declarações não passam de uma jogada desesperada para recuperar o prestígio. A resposta da população não pode ser outra se não continuar nas ruas.
*Daniel Faria é estudante de Comunicação da UFRJ e militante do Juntos-RJ.