Contra a criminalização da luta em Campinas
Ano passado ocupamos a câmara de vereadores de Campinas, lutando por transporte! Agora querem criminalizar os lutadores da geração de junho! Assim como ocorreu aos companheiros de Porto Alegre, a palavra de ordem é uma só: se lutar é crime, somos todos réus confessos. Não nos intimidam!
O juiz da 6ª Vara Criminal de Campinas recebeu no dia 23 de maio a denúncia oferecida pelo Ministério Público contra 108 manifestantes que participaram da ocupação do plenário da Câmara Municipal de Campinas no dia 07 de agosto de 2013, enquadrando-os nos crimes de dano ao patrimônio público (pena de detenção de seis meses a três anos, e multa) e desobediência (pena de detenção de quinze dias a seis meses, e multa), abrindo um processo criminal contra os mesmos. De maneira extremamente rasa, o MP se baseou no relatório encaminhado pela polícia civil, que identificou que a responsabilidade pelos supostos crimes foi coletiva, incriminando todos os manifestantes que legitimamente participavam daquela manifestação.
Este processo começa na criminalização daqueles que se mantiveram nas ruas após junho, como forma de conter e desorganizar os movimentos populares e de juventude. Além do Juntos!, que tem 10 militantes como réus, companheiros da ANEL, do Domínio Público, do DCE da PUCC, do DCE da Unicamp e de demais coletivos e movimentos também estão respondendo ao mesmo processo, que reúne praticamente toda a juventude organizada da cidade.
Embora mais grave, o avanço repressivo não se limita à esfera criminal. Os manifestantes também respondem a um processo cível movido pela Prefeitura no valor de R$24.000,00; os 34 menores (dos quais, 4 são do Juntos!) respondem a um processo na Vara da Infância e Juventude; os servidores municipais detidos (uma dos quais também do Juntos!) respondem a um processo administrativo e, no âmbito da Câmara de Vereadores, o vereador Paulo Búfalo (PSOL) é alvo da corregedoria por ter intermediado o diálogo com o movimento.
Imagens de móveis revirados circularam repetidamente nos principais meios de comunicação, inclusive pelo Jornal Nacional. Em todos os editoriais da grande mídia a tônica girou em torno da depredação da casa legislativa, criando um senso comum de censura à manifestação. Os vereadores da base e o governo avançaram para o ataque de maneira feroz, referindo-se a todos como “bandidos” e “baderneiros”, jogando uma cortina de fumaça às pautas e aos problemas políticos que as manifestações desnudaram em junho e que continuam sem resposta.
JORNADAS DE JUNHO E A OCUPAÇÃO DA CÂMARA
As jornadas de junho de 2013 colocaram os governos, seus financiadores e a grande mídia na defensiva. Em Campinas não foi diferente. Apesar da forte repressão policial, a manifestação do dia 20 de junho, que reuniu mais de 70 mil pessoas nas ruas, forçou o governo Jonas Donizzeti (PSB-PSDB) a rever o último aumento de passagem e mediar o discurso com o movimento organizado. No entanto, apesar da retórica, praticamente todos os atos na cidade foram marcados pela repressão policial. Centenas de detenções e prisões arbitrárias, agressões e abusos marcaram a luta política na cidade neste período.
A Frente Contra o Aumento da passagem, que partiu de uma articulação entre os movimentos organizados e da juventude da cidade, convocou as principais manifestações e apresentou uma pauta de reivindicações que tinha como uma de suas principais bandeiras o Passe Livre e a abertura de uma CPI dos Transportes na Câmara de Vereadores, a fim de analisar os contratos firmados entre as empresas do Transporte Público e a Prefeitura. Em uma reunião convocada às pressas, após um ato que cercou o legislativo com milhares de manifestantes, os vereadores e o governo apresentaram respostas evasivas, sem se comprometerem com as pautas apresentadas, o que gerou, no mesmo dia, uma manifestação que culminou com um acorrentamento simbólico nos portões da Câmara e o protocolo de uma pizza ao presidente da casa.
Com o recesso de julho iniciado no mesmo dia, a Frente Contra o Aumento convocou uma manifestação para o dia 07 de agosto, data do retorno dos trabalhos da Câmara, que reuniu centenas de manifestantes e que culminou com a ocupação do plenário. O ânimo dos que participavam deste ato era permanecer no recinto até que os vereadores se dispusessem a dialogar sobre as demandas. Todavia, a resposta imediata foi a chamada da Tropa de Choque da Polícia Militar, que em minutos cercou o prédio e se posicionou atrás das portas internas do plenário, causando pânico generalizado e incentivando que parte dos manifestantes obstruísse as entradas com os móveis e objetos disponíveis no local.
Mesmo sem autorização judicial (negada pelo juiz de plantão), o presidente da Câmara, vereador Campos Filho, solicitou à Polícia Militar que retirassem todos a força. De maneira ilegal e truculenta, a Tropa de Choque arrancou na unha um por um dos manifestantes, que resistiram pacificamente em cordão humano, dada a flagrante ilegalidade da operação. No total, entre maiores e menores de idade, 134 pessoas foram encaminhadas ao 4ºDP em dois ônibus fretados pela Câmara Municipal e respondem hoje aos processos movidos pela justiça e pelo poder público.
Encorajado e sentindo-se vitorioso, o governo passou da defensiva à ofensiva, atacando toda a juventude que protagoniza as principais lutas na cidade. Ao lado de Porto Alegre, onde diversos lutadores respondem a um processo criminal vergonhoso pelo crime de associação criminosa, o Ministério Público e o governo de Campinas tomam a frente na criminalização das principais lideranças das jornadas de junho, buscando conter a voz das ruas e manter intactas os podres poderes tão questionados pelas grandes manifestações.
ENTRE A VIOLÊNCIA E A CORRUPÇÃO, UMA JUVENTUDE QUE DIZ NÃO!
A história recente de Campinas é marcada por uma grande crise política, com escândalos de corrupção que geraram a cassação de dois prefeitos e acentuaram o desmonte e precariedade dos serviços públicos. Junto a isso, Campinas tem um histórico de violência política que remonta ao período escravista, e que hoje está institucionalizada no uso costumaz da repressão e da ilegalidade para conter setores indesejados politico e socialmente. Isso se reflete no assassinato do prefeito Toninho em 2001, nas chacinas feitas por grupos de extermínio na periferia, nas ordens racistas do comando da PM, na militarização da GM e, também, na severa repressão às grandes marchas que tomaram as ruas a partir de junho.
A instauração quase que imediata de um processo criminal contra os manifestantes que participaram da ocupação da Câmara Municipal se contrasta com o pouco rigor judicial frente a casos envolvendo abusos cometidos pela Polícia Militar na cidade ou mesmo casos mais emblemáticos de corrupção e fisiologismo político, como o do ex-prefeito Hélio de Oliveira Santos, cassado em 2011 após desviar mais de R$615,00 milhões dos cofres públicos.
Não a toa, não só a quase totalidade dos vereadores da atual legislatura da Câmara ou foi base do governo passado, ou foi cargo comissionado do mesmo. Não a toa, os empresários do transporte foram financiadores de ambas as campanhas, e preservam suas planilhas não auditadas. Definitivamente, não é a toa que a juventude e a população continuará a tomar as ruas para denunciar e enfrentar essa velha forma de fazer política e permanecerá firme na defesa do direito à livre manifestação!
SE LUTAR É CRIME, SOMOS TODOS RÉUS CONFESSOS!
O Juntos! encampa esta batalha junto a todos os demais lutadores perseguidos pela justiça e pelo
governo municipal de Campinas. A resposta que daremos é nas ruas, com uma ampla campanha contra os processos abertos, denunciando o caráter eminentemente político destas ações. Com um grupo de advogados populares articulado para fazer o enfrentamento jurídico, nenhum manifestante criminalizado estará desassistido. Assim como ocorreu aos companheiros de Porto Alegre, a palavra de ordem é uma só: se lutar é crime, somos todos réus confessos. Não nos intimidam!