Ninguém fica pra trás!  – Sobre a continuação do semestre na pandemia
Nenhum estudante fica para trás.

Ninguém fica pra trás!  – Sobre a continuação do semestre na pandemia

Posição do Juntos sobre o ensino remoto nas universidades públicas.

12 jun 2020, 21:07

Diante da situação crítica que o mundo enfrenta desde a declaração da pandemia de covid-19 em 11 de março, a sociedade busca alternativas para manter atividades com o necessário distanciamento social.

Desde então, as universidades públicas brasileiras tem se destacado em iniciativas para defender a vida. Além do trabalho dos hospitais universitários, muitos cursos iniciaram projetos especiais para somar forças contra o novo coronavírus. No entanto, a discussão sobre a conclusão do semestre vem colocando em risco a graduação de muitos colegas. Muitos gestores buscam resolver continuidade do semestre com substituição das aulas presenciais para aulas remotas e isso pode aprofundar a desigualdade social em nosso país.

Nosso objetivo é contribuir com propostas e alertar para o perigo de soluções apressadas sem respaldo pedagógico e científico que podem impor um retrocesso à democratização que as universidades estão vivendo desde a implementação de ações afirmativas.

Defendemos que as universidades públicas intensifiquem suas ações no combate ao novo coronavírus e priorize o acolhimento e apoio aos seus estudantes e trabalhadores.

Educação

A crise sanitária e econômica colocou a educação no centro do debate público, com a mobilização pelo adiamento do ENEM até as propostas de ensino remoto nas universidades brasileiras. Está posta a necessidade de avançar com um projeto de educação pública, universal, laica, democrática e socialmente referenciada contra o projeto obscurantista, autoritário e anti-ciência de Weintraub e de Bolsonaro.

Com a suspensão das aulas presenciais, intensificou a pressão de empresas que vendem “soluções tecnológicas” para o ensino remoto sobre gestores de instituições de ensino. A esta pressão se soma a atuação do MEC em cima de reitorias insistindo na imposição de um “EAD” precarizado, sem fundamentação e planejamento pedagógico que vai desqualificar a formação de quem conseguir acompanhar e deixar pelo caminho aqueles colegas sem as necessárias condições para o “estudo remoto”.

É fundamental alertar para o perigo da adoção de soluções de ensino remoto em caráter emergencial porque pode resultar na adaptação curricular permanente para esta modalidade – o que significaria um retrocesso também para a educação pós-pandemia.

Assim defendemos:

  • Cumprimento do Plano Nacional de Educação – Lei n. 13.005/2014
  • Revogação da Emenda Constitucional 95/2016, que atacou o orçamento da educação em 2019 retirando 32,6 bilhões de reais
  • Adiamento do ENEM por tempo indeterminado
  • Aprovação da PEC 15/2015, com a implantação do novo FUNDEB

Ninguém fica pra trás!

Sabemos que a pandemia do COVID-19, colocou em destaque todas a desigualdades sociais presentes no nosso país.

Desde as questões mais relativas ao acesso aos serviços básicos como saúde e saneamento básico às desigualdades regionais, de classe, gênero e raça. Nesse sentido, esses aspectos não podem ficar de fora da implementação de qualquer política universitária em relação ao ensino remoto.

Dados divulgados pelo Comitê Gestor da Internet (Cetic.br), indicam que 70 milhões de brasileiros têm acesso precário à internet na pandemia do coronavírus e que mais de 42 milhões de pessoas nunca acessaram a rede. Ou seja, a desigualdade digital é uma realidade em uma parcela significativa da vida dos brasileiros.

Para além disso, não é só a desigualdade de acesso que contribui para as dificuldades do ensino remoto, mas as condições sob as quais os estudantes estão submetidos em suas casas para dedicarem parte do seu tempo aos estudos. Se as condições precárias de moradia, como a existência de poucos cômodos para muitas pessoas, significam uma dificuldade na implementação do isolamento social, isso não é diferente para as devidas condições de concentração e estudo dos estudantes que compartilham dessa realidade. O mesmo vale para as mães estudantes, que nesse momento de crise sanitária, tem dividido o seu tempo entre trabalho, o cuidado com seus filhos e o ensino remoto.

Por isso, qualquer ação que for tomada pelas universidades, devem levar em conta as condições específicas de cada estudante, não deixando ninguém para trás!

Por isso reivindicamos:

  • Nenhuma migração de disciplinas obrigatórias ao ensino remoto;
  • Criação de disciplinas especiais, de créditos eletivos, vinculadas à luta contra a pandemia;
  • Nenhuma solução que exponha estudantes mais pobres a maiores riscos frequentando laboratórios;
  • Que as universidades que, após amplo debate e consenso com a comunidade acadêmica, optarem por qualquer tipo de atividade remota garantam internet de qualidade e computadores para seus alunos;
  • Que nenhum estudante tenha o seu semestre prejudicado por conta da dificuldade de acompanhar as aulas virtuais ou com avaliações que não levem em contas as suas condições sociais;
  • Que a universidade seja sensível e corresponda às necessidades das mães estudantes, para que não tenham o seu direito à educação negada neste momento;
  • No caso dessa opção da comunidade acadêmica e suas representações optarem, de forma democrática pelo ensino remoto e apliquem as medidas necessárias para dar acesso aos estudantes mesmo assim houverem casos com a não possibilidade de cursar as disciplinas de forma virtual, que seja colocada a possibilidade de trancamento do semestre sem que isso contabilize no tempo de jubilamento ou impeça a matrícula em disciplinas futuras.

Nada sobre nós sem nós

O debate sobre o ensino remoto nas universidades vem sendo feito sem transparência. Decisões estão sendo tomadas sem debate nas respectivas instâncias. Formulários sobre a aulas online estão circulando e seus resultados não são discutidos nos conselhos universitários ou espaços institucionais das universidades.

Um problema grave está se repetindo: os estudantes e suas representações não estão tendo voz sobre a implementação desse modelo de ensino.

Não acreditamos que nenhuma mudança radical, mesmo que temporária, pode ser feita sem a construção e debate ativo com os DCEs, CAs e com o corpo estudantil como um todo. Aplicar o ensino remoto não é uma questão somente de “sim ou não”, mas também de quando, como e para quem.

Por isso exigimos:

  • Que nenhuma medida seja tomada sobre ensino remoto nas universidades sem um debate amplo e construção de consensos com as entidades estudantis eleitas;
  • Que toda e qualquer consulta feita nesse sentido também seja elaborada com o DCE e os CAs da universidade, abarcando temas como a atual situação financeira e social, o acesso à internet e, deixando espaço aberto para manifestação do estudante sobre assunto não contemplado no questionário ou pesquisa;
  • Que qualquer decisão sobre a implementação passe por espaços democráticos, com participação estudantil paritária, como Grupos de Trabalho e que continuem analisando sobre quaisquer problemas e exclusões que o sistema poderá gerar;
  • Que nada seja imposto nos conselhos universitários sem acordo com a bancada estudantil, que mesmo tendo minoria de representação nesses órgãos, são os mais afetados pela medida e a maior parte da comunidade acadêmica.

Assistência estudantil

As políticas de assistência estudantil e ações afirmativas são fundamentais para garantir o acesso e a permanência dos estudantes nas universidades públicas, principalmente para aqueles oriundos dos processos seletivos especiais e estudantes de baixa renda.

Estamos em pleno aprofundamento da crise pandêmica no Brasil com propagação larga e acelerada impulsionada pela desigualdade social, ausência de saneamento básico e políticas públicas para a saúde, além de ter um presidente anticiência.

Segundo levantamento da ANDIFES, 70,2% dos estudantes da rede federal são de famílias com renda per capita mensal de até 1,5 salário mínimo. Isso quer dizer que muitos dependem das políticas de assistência estudantil para continuar estudando. E sabemos que muitos destes estudantes não conseguiram acessar o auxílio emergencial e fazem parte da taxa crescente de desemprego.

Por isso reivindicamos:

  • Abertura de edital para a concessão de novas bolsas de auxílio estudantil, como permanência e moradia;
  • Renovação das bolsas durante o período de quarentena;
  • Pagamento em dia para os beneficiários de auxílios estudantis;
  • Auxílio-alimentação para os estudantes cadastrados em programas sociais federais ou que possuam CadÚnico e estudantes contemplados com as políticas de assistência estudantil das IES, isto, como um mecanismo para suprir a demanda dos estudantes que dependiam dos restaurantes universitários;
  • Que toda instituição que tenha clínica de psicologia, fortalece o atendimento com canais por internet ou telefone.

Sobre a situação docente

No momento da pandemia, quando a realidade impôs que escolas e universidades fechassem suas portas, os docentes de todo Brasil se viram frente a uma nova realidade para o magistério. Prontamente, sem que fossem garantidas condições de preparação técnica, didática, tecnológica e material, muitos foram compelidos a adotar o modelo de aula a distância. A aula a distância não é a simples conversão da sala de aula para a tela do computador. Antes de tudo, é preciso garantir aos professores formação continuada que permita aulas, materiais didáticos e avaliações ajustadas ao novo formato de ensino, tempo hábil para o planejamento pedagógico, entre outras medidas preliminares.

Não por acaso o ANDES-SN recomenda aos professores das universidades que não só rejeitem arremedos de propostas de aula a distância, como também garantam amplo debate e planejamento coletivo ao redor dessa modalidade. Trata-se de evitar que o ensino remoto, intencionalmente desvirtuado para não cumprir a legislação em vigor da Educação a Distância (EaD), não aprofunde as desigualdades educacionais, intensificando, por exemplo, a precarização do trabalho docente.

Defendemos:

  • Amplo debate com a comunidade acadêmica e escolar, através das duas instâncias deliberativas, garantindo planejamento coletivo e tempo hábil para construção das propostas de ensino a distância;
  • Formação continuada para todos os docentes com vistas a assegurar condições pedagógicas para o cumprimento de componentes curriculares no formato não-presencial;
  • Garantia de liberdade pedagógica contra o uso indevido e público das aulas ministradas virtualmente com o fim de cercear o pensamento crítico.

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