Por que as eleições do Equador importam para nós?
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Por que as eleições do Equador importam para nós?

A América Latina e os ecos da rebeldia

Theo Louzada Lobato 16 fev 2021, 17:59

As eleições do Equador na semana passada surpreenderam. Após diversas pesquisas eleitorais apontarem para um segundo turno certo entre Arriez – candidato do ex-presidente Rafael Correa – e o banqueiro Guilherme Lasso, a disputa se colocou em outros marcos. Yaku Pérez, do partido indigenista Pachakutik, esteve em toda apuração a frente de Lessa, podendo entrar no segundo turno com Arriez, para apenas nos últimos momentos das eleições o banqueiro tomar a dianteira. As últimas urnas, que garantiram a virada, tiveram diversos indícios de fraude e, após uma mobilização dos indígenas chamada pelo Pachakutik, o país decidiu recontar os votos.

Mesmo que se consolide a fraude e Lessa vá para o segundo turno, uma coisa é certa: essas eleições representam um sinal de uma mudança no país que pode ser relevante em todo continente. A projeção de Pérez não é ao acaso nem se resume a sua pessoa, mas é um reflexo das mobilizações políticas que tomaram o país em 2019 e que foram um marco de um novo momento que vive a América Latina.

O Equador é um país que foi marcado nesse século tanto pelas imposições que sofreu do imperialismo e do FMI quanto pelas rebeliões sociais que eclodiram em sua resposta. O país que, no auge de um programa neoliberal, adotou o dólar americano como moeda oficial em 2000, passou por uma Revolução Cidadã que levou ao governo Rafael Correa e permitiu diversas políticas progressistas como a auditoria da dívida pública. Um processo que, como visto no bolivarianismo de outros países do continente foi mudando de rumo a partir de suas contradições, cristalisando uma casta burocrática, muitas vezes envolvidas em casos de corrupção, que foi perdendo o legado das mobilizações sociais que lá a colocaram.

A maior expressão dessa degeneração foi a eleição do vice de Correa, Lenin Moreno, que chegou a romper por completo com o correísmo e aplicou um plano abertamente neoliberal no país – que teve como resultado as mobilizações de 2019, que não só agitaram o Equador como iniciaram um processo de ebulição continental. É compreendendo esse contexto e o protagonismo que teve a luta popular e indígena para definir os rumos políticos do país que se pode entender o motivo de Pérez ter tido tamanho peso eleitoral. Ele e seu partido são expressões reais dessas mobilizações travadas pelo povo equatoriano e de uma vontade de mudança de rumo no país – rejeitando tanto o programa neoliberal de Lessa quanto a velha esquerda burocratizada e extrativista de Arriez e Correa.

As eleições do Equador importam porque não dizem só sobre o Equador. Os chilenos, após uma das maiores jornadas de luta de sua história, foram às urnas por uma nova constituição no ano passado e os peruanos agora enfrentam, durante um dos momentos mais difíceis do país, uma eleição na qual Verônica Mendoza, representante de uma nova esquerda que se apresenta no país, pode ir ao segundo turno e ser a voz das contestações sociais que o país recentemente tem vivido. Existe de fato uma possibilidade do surgimento de novos atores sociais e políticos, que reflitam as indignações populares que têm aquecido a dinâmica do continente, se apresentarem como alternativas de disputa de poder.

Isso não significa que esses atores estão livres de contradições, muito pelo contrário, mas expressa que existe um avanço de consciência em parte da América Latina e uma busca de um programa para expressar as indignações que vem tomado às ruas no continente. Por isso precisamos não só acompanhar como intervir diretamente – apoiando por exemplo o Pachakutik nas suas denúncias de fraude e apoiando os companheiros peruanos na sua disputa eleitoral e nos enfrentamentos contra a direita. 

A América Latina começa a ouvir os ecos de sua rebeldia. Os novos desenvolvimentos do continente nos últimos anos também são parte do nosso arsenal de nossas lutas contra Bolsonaro e o negacionismo. Acompanhar e participar desses processos é fundamental para também podermos entendermos de que forma esses processos podem refletir no Brasil e no nosso combate contra a extrema-direita e pela consolidação de uma nova alternativa de esquerda no país. 


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