PARA A CHAPA ENFRENTE NA USP FALAR SOBRE RACISMO AFASTA OS ESTUDANTES
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PARA A CHAPA ENFRENTE NA USP FALAR SOBRE RACISMO AFASTA OS ESTUDANTES

Diante do feito histórico de ter a primeira presidenta negra à frente do XI de Agosto, o papel de um coletivo de esquerda deveria ser oportunizar os debates e enfrentamentos que surgem a partir daí para ampliar a discussão e combater o racismo estrutural.

Juntos Negros e Negras e Juntos USP 19 out 2021, 21:50

Nesta semana está acontecendo as eleições de um dos centros acadêmicos mais importantes do Brasil, o XI de Agosto – Centro Acadêmico da Faculdade de Direito da USP. A última gestão eleita em 2019 – Travessia, que nós do Juntos! integramos, iniciou um processo de mudança política na faculdade, elegendo a primeira presidente negra (Letícia Chagas) em mais de 118 anos de história do Centro Acadêmico. Isso significou um marco, uma gestão que se propôs a combater o racismo estrutural, não só na universidade, mas utilizando de sua estrutura para disputar a opinião pública e fazer de uma das universidades mais brancas do país, cada vez mais negra, plural e democrática. 

Em meio ao processo eleitoral, no primeiro debate das eleições, uma membra branca da chapa Enfrente (Disparada/PT, Levante Popular da Juventude e UJS) fez uma fala, reforçada posteriormente por outros membros, levando a entender que para a gestão Travessia tudo é questão de racismo. Segundo a mesma: “(…) essa coisa de representatividade que a Camila (candidata à presidência pela chapa Travessia) falou na fala dela é muito problemática, porque é isso que fazem com que as pessoas fiquem afastadas do movimento estudantil, porque qualquer coisa que elas vão falar vai ser interpretada como racista, vai ser interpretada como excludente e isso afasta as pessoas do debate”. 

 Num país em que falar sobre racismo ainda é uma ferida aberta, em que há pouco mais de 10 anos pessoas negras e indígenas passaram a entrar na universidade, em que as pessoas negras são as que mais morrem por fome, covid-19 e bala, falar sobre racismo deveria ser o comum e o cotidiano e não algo banalizado, ofuscado e não dito. Ao colocar que tudo que a gestão Travessia aborda e expressa é questão de racismo, a chapa Enfrente possui a mesma postura da direita reacionária na política nacional, que ao se ver questionada por figuras negras em espaços de poder, dizem que tudo é questão de racismo, “mimimi” e vitimização para deslegitimar tais figuras excluídas historicamente ou então como um professor, Conselheiro Universitário da USP que em uma reunião de conselho, após a fala de três RDs negras disse que a diversidade é bom, mas às vezes atrapalha.

Por isso tudo, é que repudiamos tal atitute da chapa Enfrente e nos solidarizamos com o conjunto da chapa Travessia, em especial às estudantes negras e negros. Apontar a existência do racismo estrutural não afasta e não deve afastar os estudantes, pelo contrário, é parte do processo educativo e integrativo que o conjunto da nossa universidade e sociedade precisa. Diante do feito histórico de ter a primeira presidenta negra à frente do XI de Agosto, o papel de um coletivo de esquerda deveria ser oportunizar os debates e enfrentamentos que surgem a partir daí para ampliar a discussão e combater o racismo estrutural, e não deslegitimar a figura da Letícia, como se o problema fosse ela apontar o racismo e não a existência do racismo e de quem o pratica e reproduz. Defendemos que a superação do racismo é uma tarefa de todos, negros e brancos, em especial da população branca, por isso, apontar a existência do racismo é fazer um convite ao diálogo para que juntos possamos ser parte de seu combate. Numa faculdade racista, como diz Ângela Davis, não basta não ser racista, é preciso ser antirrascista. Se ausentar desse debate e desqualificá-lo é só contribuir para a existência de um problema ainda não superado no Brasil e no mundo. 

Saudamos por fim a gestão histórica da Travessia presidida pela Letícia Chagas, e que agora terá ainda mais desafios para incluir e garantir a permanência dos estudantes pobres e negros nesse retorno presencial, mas que com a presidência de Camila Lais, cria da Brasilândia, periferia de São Paulo, seguirá na batalha por uma SanFran popular!


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