Um balanço sobre o movimento estudantil na UFG
Por um programa para a universidade que unifique todos os estudantes, Centros e Diretórios acadêmicos e coletivos combativos para além da disputa eleitoral.
Em agosto do ano passado a chapa “oposição para mudar” venceu as eleições e assumiu a direção do DCE-UFG por – em tese – um ano. Com 2279 votos, frente aos 1764 depositados na chapa “É tudo pra ontem”, fruto da unidade entre correnteza, Juntos!, UJC e manifesta, as juventudes do PT e PCdoB encerraram um hiato de mais de 10 anos e voltaram à direção da entidade.
Precisamos nos debruçar sobre as razões que possibilitaram esse setor a se reabilitar na UFG, fazer um balanço sobre esse quase um ano e meio de gestão e -sobretudo- refletir sobre qual o papel dos estudantes nesse contexto.
O que possibilitou a volta dos setores imobilistas ao DCE?
Há muito tempo os alunos da UFG ficaram acostumados com gestões independentes e combativas a frente do DCE, seja por coletivos ligados à oposição de esquerda da UNE, seja por movimentos autonomistas nosso Diretório atuou apostando na mobilização, no contato com as bases e na independência política com relação aos governos e reitorias.
Não se trata de negligenciar as falhas que houveram nesse período, mas inegavelmente essa administração representou uma mudança na lógica em que a entidade opera: temos um DCE burocrático, imobilista que atua apenas em reuniões fechadas com a reitoria ou em gabinetes parlamentares, jamais com a base que deveriam representar. Essa distância entre o Diretório e os estudantes é ainda maior nos campi de Aparecida e Cidade de Goiás, justamente os locais em que as condições são mais precárias e que o Movimento Estudantil (ME) ativo é ainda mais necessário.
Elencamos três razões principais que abriram terreno para esse setor:
– A administração anterior “o futuro exige coragem” ligada ao movimento correnteza atuou praticamente apenas no período pandêmico , se estendendo devido à falta de condições sanitárias para novas eleições. Sentimos que a direção “perdeu o fôlego” e gerou insatisfação entre os estudantes. Para além das dificuldades impostas a todo ME pela COVID, a entidade atravessou crises internas que culminaram inclusive na saída da, então, Coordenadora-Geral. As dificuldades internas e sanitárias fizeram com que a atuação fosse bem aquém da expectativa.
Os setores da “oposição para mudar” buscaram, desde o nome escolhido, canalizar a insatisfação legítima. Em certo ponto foram bem sucedidos, já que venceram as eleições. Mas para além da retórica, quais mudanças conseguiram realmente efetivar? Certamente não as que constavam na carta-programa,nenhuma das questões pautadas no período eleitoral foram executadas;
– Acreditamos também que o sectarismo e a priorização da autoconstrução em detrimento da construção unitária tem sido um gargalo entre os coletivos da esquerda socialista. No último pleito conseguimos pela primeira vez em tempos convergir em uma chapa unitária desse campo, o Juntos! vê essa unidade como um acerto político a ser mantido para além da disputa eleitoral. Essa unidade, se tivesse começado anteriormente, poderia ter dado mais musculatura para a gestão “ o futuro exige coragem” e garantido uma entidade forte que não abrisse brechas para o fortalecimento dos setores reformistas na universidade, infelizmente os coletivos correnteza e UJC escolheram sair em chapas próprias, ao passo que o juntos ainda não tinha atuação na UFG. Em 2018 a situação foi ainda mais grave, na contramão de toda construção nacional ,a UJC impulsionou uma chapa em comum com a UJS. Essa irresponsabilidade quase culminou, já nessa eleição, na lógica imobilista tomando frente do Diretório;
– Essa unidade entretanto não se dá no abstrato, senão na síntese e acordos na construção de um programa comum. Ponto central da derrota eleitoral do nosso campo foi a falta de entendimento dessa tarefa. Entendemos que embora cada membro e organização política tenha suas posições,por vezes divergente, é necessário avançar na construção de consensos e acordos que devem ser respeitados. O desrespeito a esses acordos e consensos foi decisivo ao longo do processo eleitoral: setores da chapa começaram a agitar, em nome de todos, posições que não haviam sido acordadas. A questão do Movimento Empresa Jr. foi particularmente sensível, boa parte dos alunos fizeram um voto de protesto contra nós, devido a inconsequência dos que agitaram bandeiras contra o MEJ que não refletiam os acúmulos coletivos.
Como tem sido a atuação da ‘‘Oposição para mudar’’?
Desde antes das eleições esse grupo cumpriu um papel regressivo ao condenar os estudantes que lutavam por melhores condições no RU a fim de desgastar os coletivos de esquerda que enfrentariam no pleito. Após o início do processo eleitoral pautaram sua campanha em difamações, ataques pessoais e mentiras, a situação chegou ao ponto de que a própria administração da UFG precisou desmentir as informações veiculadas por esses setores contra a nossa chapa.
Posteriormente, após saírem vitoriosos, deixaram o Diretório abandonado por mais de dois meses,resolveram tomar posse apenas no meio de outubro. Em um momento chave da política nacional o DCE simplesmente resolveu parar de existir sem qualquer justificativa. Depois da posse, apesar de formalmente constituído, nunca de fato existiu: a tônica da atual administração tem sido o distanciamento das bases e um déficit democrático imenso. Os que estão no começo da graduação, em sua maioria, sequer sabem o que é a entidade. Situação que se agrava em Aparecida e na cidade de Goiás, onde os discentes estão totalmente desassistidos pelo seu órgão de representação. Justamente os campi mais precarizados da UFG.
Plenárias e assembléias estudantis que faziam parte da cultura política da UFG desapareceram, o Conselho de Entidades de Base, reunião entre os Centros e Diretórios Acadêmicos (CAs e DAs), não ocorre há mais de 9 meses. O prazo para encerramento da gestão se esgotou há 4 meses e, novamente sem justificativa, não foram convocadas novas eleições.
Foram omissos em pautas locais como as condições de mobilidade e de alimentação em Aparecida, na resolução do problema de diversos alunos que passaram semanas sem acesso ao passe livre, também se ausentaram das mobilizações da FIC por pautas locais como a presença discente na rádio universitária.
Se acovardaram e defenderam a presença da Polícia Militar dentro do campus em um dos estados com maior índice de violência policial do Brasil. Se acovardaram e silenciaram sobre o corte na verba Capes. Postergaram ao máximo, na contramão do movimento social goiano, para se solidarizar com o povo palestino. Até mesmo nas mais básicas e burocráticas tarefas como emissão de carteirinhas esse setor é uma tragédia. A UFG precisa de uma nova orientação no ME.
O que fazer?
Esse texto é, antes de tudo, um chamado aos discentes da UFG, aos CAs, DAs e aos coletivos Rebeldia, Correnteza, UJC, manifesta e travessia para o avanço na construção de um programa comum, um projeto que unifique todos os setores consequentes com a luta estudantil em um mesmo campo.
Antes de tudo é necessário a luta democrática: o DCE caducou.Desde agosto quando a gestão deveria ser findada ele não possui legitimidade alguma. É urgente pautar a realização de um CEB eleitoral, precisamos de um calendário eleitoral e de constituir a comissão responsável pelo processo.
É necessário devolver legitimidade ao DCE, mas mais do que isso precisamos refletir sobre qual papel os estudantes devem cumprir no próximo período. Colocamos nossa contribuição, não somente para a disputa de entidades, mas também sobre qual orientação deve nos guiar:
Os estudantes tiveram papel central no enfrentamento e na derrota eleitoral de Bolsonaro:a aposta nas ruas via tsunamis da educação foram fundamentais para sairmos vitoriosos nas urnas. A mobilização permanente segue sendo uma necessidade imperativa, a extrema direita segue forte e organizada e precisa ser enfrentada,a luta antifascista para nós é muito cara: para que não haja anistia aos crimes de Bolsonaro e dos golpistas, para que os setores antidemocráticos não possam se sentir confortáveis dentro da UFG.
Entender a importância da derrota eleitoral da extrema direita em nada se confunde com qualquer tipo de ilusão com a frente ampla de Lula. O arcabouço fiscal, a ‘’reforma da reforma do Ensino médio’’, os cortes na Capes são provas da insuficiência do projeto petista para a educação. Acreditamos em um movimento estudantil com independência do governo federal para que possamos nos mobilizar e levar às últimas consequências nossas pautas. Não abaixamos nossas bandeiras:
Queremos localizar o DCE-UFG no centro das lutas nacionais e locais,e queremos uma entidade que entenda Aparecida e Goiás como parte integrante da UFG e não como mero apêndice. Queremos uma entidade em contato com o corpo discente, promovendo CEBS, assembléias e plenárias constantes, sabemos que só com o diálogo e a mobilização permanente podemos arrancar vitórias. Apresentamos algumas contribuições programáticas para novos rumos na universidade, convidamos todos a contribuir nesse processo:
- Pela Revogação da Reforma do ensino médio, pela contratação de professores e a construção de uma nova reforma para o ensino básico; Defender uma reforma universitária protagonizada pelos estudantes e trabalhadores!
- Recomposição orçamentária das Universidades Federais e Institutos Federais; pela continuidade e ampliação da lei de cotas, implementação das cotas trans e dos vestibulares indígenas; Permanência estudantil é um direito: pela ampliação dos programas de assistência estudantil, mais investimento no PNAES, e pelo fim da EBSERH;
- Por uma universidade feminista: contra o assédio, por mais segurança, creches e permanência estudantil para as mulheres;
- Pelo fim da lista tríplice, reitor eleito é reitor empossado! que a UFG nunca mais tenha uma reitoria inimiga dos estudantes;
- Pela construção do RU Aparecida e pelo café da manhã no RU Goiás.
- Contra a exclusão dos alunos da programação da rádio universitária;
- Pela implementação, a exemplo de diversas universidades, de ônibus circulares intercampi entre Aparecida, Colemar e Samambaia;
- Revisão da resolução nº 40/2017 que dispõe sobre a regulamentação do uso de espaços da UFG para a realização de atividades festivas, de lazer, culturais e eventos de maior porte na UFG. Que a UFG seja de fato um espaço de acolhimento e lazer com segurança, romper com a lógica higienista e patrimonialista que permeia essa resolução.
- Por um DCE que não se restrinja às pautas dos alunos! Por uma política de solidariedade ativa às lutas dos trabalhadores e povos oprimidos