O EMPOBRECIMENTO POLÍTICO DO CENTRO ACADÊMICO XI DE AGOSTO
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O EMPOBRECIMENTO POLÍTICO DO CENTRO ACADÊMICO XI DE AGOSTO

Quem lê sobre a história do XI, mal reconhece o centro acadêmico de atualmente. Como pode o XI de Agosto que fechou as portas da faculdade com tijolos em resistência à ditadura, que emocionou o brasil na defesa de uma democracia real durante o ato da Carta de 22 e que liderou a luta dos estudantes por permanência e contratações em 2023 ser o mesmo que se omite nos debates das cotas trans, dos movimentos negros, da palestina, contra o PL da Devastação e tantos outros do nosso tempo?

Ekop Novis dos Santos 29 set 2025, 16:54

O centenário Centro Acadêmico XI de Agosto é uma das entidades estudantis mais importantes do país. Ao longo de sua história, foi protagonista de uma série de processos marcantes para a luta dos estudantes. As ocupações da sanfran contra a ditadura em 1968, a luta por “Diretas Já”, contra o governo Bolsonaro e a greve de 2023 são exemplos de uma entidade que não teve medo de dialogar com os estudantes sobre a urgência de se mobilizar.

Quem lê sobre a história do XI, mal reconhece o centro acadêmico de atualmente. Como pode o XI de Agosto que fechou as portas da faculdade com tijolos em resistência à ditadura, que emocionou o brasil na defesa de uma democracia real durante o ato da Carta de 22 e que liderou a luta dos estudantes por permanência e contratações em 2023 ser o mesmo que se omite nos debates das cotas trans, dos movimentos negros, da palestina, contra o PL da Devastação e tantos outros do nosso tempo?

A resposta pode ser resumida em 3 palavras: União e Reconstrução. A gestão atual do XI de Agosto, que se fantasia de independente, mas é orquestrada pela UJS, juventude do PCdoB, esvaziou politicamente o Centro Acadêmico e deixou de utilizá-lo para mobilizar os estudantes, para transformá-lo em um mero gestor do patrimônio das entidades da faculdade e ferramenta de networking para seus diretores.

Mas uma dúvida paira no ar, principalmente para os franciscanos mais novos: Como chegamos até aqui? Como uma entidade que pautava a política nacional passou a estampar os jornais com escândalos de demissão de funcionários? Esse texto pretende explorar esses tópicos.

De onde veio o União e Reconstrução?

Para as turmas 197 e 198, que não testemunharam o nascimento do União e Reconstrução, vale a pena retomar a história da atual gestão do Centro Acadêmico. O União e Reconstrução pode ter sua origem traçada a um antigo coletivo da São Francisco chamado Movimento Resgate Arcadas, que atuava na Sanfran desde os anos 2000. O movimento era reconhecido pelos estudantes como claramente de direita, lançando para a política nomes como Caio Miranda Carneiro, ex-vereador e filiado ao União Brasil.

Em dado momento, a opinião pública da faculdade, assim como de boa parte da juventude, teve um giro à esquerda, de tal forma que um coletivo abertamente de direita não teria espaço na política estudantil. Assim, o Resgate fez um rebranding, se apresentando como Construção, coletivo que ocuparia a RD por anos e, a partir disso, desenvolveria relações fortes com os professores da faculdade.

Por anos, o Construção esteve à margem da política na faculdade, sendo engolido pelos movimentos de esquerda Travessia e Contraponto. Assim foi até a greve de 2023. Inicialmente, a RD se posicionava a favor da greve e defendia o momento de ascensão como uma oportunidade de avançar em diversas reivindicações. No entanto, conforme a greve foi aumentando as tensões entre estudantes e professores, a RD passou a ter uma posição de botar panos quentes na mobilização, buscando evitar desgaste com os professores.

Em um momento de conflito acentuado com um ex-diretor da faculdade, que tinha comparado os grevistas aos terroristas do 8 de janeiro, a RD passou a defender, dentro do comando de greve, que os estudantes pedissem desculpas publicamente a esse professor, dizendo que ele era muito influente e poderia infringir represálias aos grevistas. Contudo, quando o Comando de Greve decidiu não se desculpar a esse professor, a RD se retirou publicamente da greve, dizendo que não poderia mais apoiar a mobilização.

A partir disso, o Construção começou a ganhar uma simpatia dos estudantes que eram contrários à greve, começando a criar uma narrativa de que o XI de Agosto não deveria fomentar mobilizações como aquela, mas sim focar na administração de seu patrimônio. Assim, estava na hora de lançar uma nova marca: o União e (Re)Construção, estratégia que obteve sucesso ao conseguirem ganhar a eleição do XI de 2023.

Uma vez assumindo a gestão, o União e Reconstrução passou a tratar nosso Centro Acadêmico como se fosse uma mera entidade administradora do patrimônio das entidades. Fazendo uma gestão de austeridade, os diretores do XI aproveitam o nome dele para fazer networking, celebrando nomes como Camilo Santana e Geraldo Alckmin, na esperança de construir sua própria carreira. A partir disso buscam cumprir exatamente o papel que nossa faculdade exerceu historicamente na sociedade brasileira: a formação dos próximos quadros da política burguesa.

A desconstrução política do XI de Agosto

Fazendo esse panorama histórico, está claro que as gestões União e Reconstrução entregaram justamente o que prometeram: Ausência total de convocações à mobilização. Apesar das inúmeras movimentações ocorridas em 2024 e 2025, a sensação dos estudantes da faculdade é de um congelamento político. Não houve chamados aos estudantes na luta por cotas trans, pela Palestina, contra o PL da Devastação e tantas outras tão caras para a juventude.

Até quando o XI de Agosto raramente se propõe a organizar algo político, como no ato pela soberania no meio do ano, o faz de modo muito protocolar, após um chamado da diretoria, sem espaço para falas do público e fechado no Salão Nobre. Ao fazer chamados no instagram para os atos, o XI não se preocupa em convidar de fato os estudantes na sala de aula, fazer um bloco dos estudantes da São Francisco, se limitando a enviar 3-5 representantes do Centro Acadêmico para tirar uma foto e talvez gravar um vídeo para mostrar que marcaram presença.

Os eventos políticos são esvaziados, iniciativas como o PL da nova lei do estágio são feitas sem consultar ou envolver os estudantes, as mobilizações protagonizadas pela oposição são ignoradas, os coletivos anti-opressão silenciados e tudo isso em nome de uma abstrata “responsabilidade com a política”.

Posso citar exemplos vergonhosos como a demissão das diretoras da Clínica Luiz Gama e a realização de uma semana de eventos antirracista sem diálogo com os coletivos negros da sanfran, mas sem dúvidas o fato mais emblemático desse empobrecimento político é a ausência de Assembleias.

AGE da greve, realizada dia 25/09/2024

AGE das Entidades, realizada dia 23/09/2025

Ao falar sobre AGE’s com as turmas mais novas, o que vem à mente delas é a seguinte cena: uma urna do lado da Sala dos Estudantes, junto de um corredor polonês de diretores do Centro Acadêmico XI de Agosto gritando para perguntar se você já votou na assembleia e que você precisa votar em tal opção. O que muitos não sabem é que as assembleias não eram, e nem devem ser, assim.

Em gestões anteriores, um dia de AGE era um dia que parava a faculdade. A pedido do Centro Acadêmico, os professores cancelavam as aulas para permitir que os estudantes participassem de um dos dois turnos da assembleia. Uma mesa era posicionada no centro das arcadas e centenas e centenas de estudantes sentavam-se em volta para ouvir e, o mais importante, falar o que pensam.

Debates acirrados aconteciam entre a gestão do XI, opositores e independentes. O motivo da assembleia, seja um saque milionário para reformar a Casa do Estudante, seja a apreciação de uma greve, era amplamente dominado pela totalidade dos estudantes, que tinham suas próprias opiniões e podiam manifestá-las. Ao final, os encaminhamentos da assembleia eram votados e os próprios estudantes poderiam sugerir medidas, inclusive que rivalizavam com as protocoladas pelo CA.

Um modelo muito mais democrático e político do que o “plebiscito” organizado pela atual gestão, que muitas vezes induz os estudantes a votarem em uma opção que nem eles sabem as consequências. Mais do que isso, os assuntos discutidos não eram apenas administrativos, mas podiam incluir a própria mobilização estudantil, com a votação de atos e greves.

Como o leitor pode imaginar, devido à origem dessa gestão, a “inovação” na modalidade de AGE não é por uma mera conveniência ao Centro Acadêmico, mas sim parte de seu projeto político. O modelo atual permite que o XI apresente à Justiça que houve uma assembleia, tal como o estatuto da nossa entidade exige, e que os estudantes deram suas opiniões, sem, de fato, abrir espaço para opiniões divergentes ou para qualquer tipo de discussão mais aprofundada. Possibilita as mudanças burocráticas que eles querem realizar no Centro Acadêmico, sem abrir espaço para que qualquer política de movimento seja colocada em pauta.

Desse modo, não é surpresa alguma que o XI não tenha chamado uma assembleia para discutir alguma mobilização por cotas trans. Até porque eles sabem que a São Francisco foi o segundo instituto que mais assinou o abaixo-assinado da Xica e do DCE. Eles sabem que os estudantes estão dispostos a se chocar com a institucionalidade, se preciso, para avançar na conquista das cotas. Então, sabendo que a sua opinião desmobilizadora é minoritária, a solução clara é suprimir o debate.

Esse esvaziamento político, contudo, acontece por um motivo. O União e Reconstrução compõe hoje uma ala do movimento estudantil que não aposta nas mobilizações, acreditando que devemos nos limitar apenas à atuação institucional. Tal lógica, contudo, faz com que nosso centro acadêmico deixe de ser uma casa para os movimentos sociais, deixando de ecoar as lutas que vem de dentro e de fora da sanfran. O resultado é um grêmio que não busca lutar por nenhum tipo de mudança sistêmica na universidade e que está disposto a sacrificar projetos sociais como a Clínica Luiz Gama em nome de uma suposta austeridade na nossa entidade.

O XI pode ser muito mais

A centenária história da nossa entidade mostra que o XI de Agosto pode ser muito mais do que é hoje em dia. Ao olharmos para o passado, fica claro que, caso haja vontade, nosso Centro Acadêmico pode ser usado para pautar a política nacional, mobilizar a universidade toda em prol de certa pauta e ocasionar mudanças concretas na vida dos estudantes e da sociedade em geral.

É claro que o trabalho administrativo do XI não pode ser secundarizado. Diversos estudantes moradores da Casa dependem dele, diversas atividades extensionistas essenciais à sociedade dependem dele. Contudo, quando esse trabalho não é feito através de um viés político, o resultado são cortes como o ocorrido com a Clínica Luiz Gama.

O XI de Agosto é o maior Centro Acadêmico do país justamente por conta de seus patrimônios. A Casa do Estudante, o Campo do XI e o Fundo do XI são bens de toda a comunidade franciscana que devem ter uma administração séria. Porém, fato é que a gestão atual está precarizando o nosso principal patrimônio: A influência política.

Precisamos (re)construir um movimento estudantil que não tenha medo de defender as suas pautas e dizer o seu nome: De esquerda radical, independente e disposto a ir até às últimas consequências pela democratização da universidade. Um movimento estudantil que não peça permissão aos professores para se mobilizar. Se você acredita na urgência desse movimento estudantil, venha com o Coletivo Juntos! construir uma esquerda de verdade na São Francisco!


Imagem O Futuro se Conquista

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