O QUE É A MP 1303/2025 E O SEU REFLEXO NA EDUCAÇÃO
Por trás do discurso de justiça fiscal, a MP 1303 abriu caminho para novos ataques à educação e ao serviço público
A Medida Provisória 1303/2025 foi apresentada pelo governo como uma iniciativa de justiça tributária voltada para os setores mais ricos da sociedade, especialmente os bilionários, os bancos e as Bets, os chamados BBBs. Contudo, ao analisar seu conteúdo e o contexto de sua tramitação, é possível perceber que a MP não rompeu com a lógica de austeridade que domina a política econômica brasileira. Ao contrário, ela representou uma tentativa de conciliação entre um discurso progressista e a manutenção dos interesses do mercado financeiro.
O texto da MP continha alguns elementos que poderiam ser considerados progressivos, como a tentativa de regulamentar a tributação sobre fundos exclusivos e investimentos no exterior. No entanto, o objetivo central da medida era recompor receitas e garantir equilíbrio fiscal, não promover redistribuição de riqueza ou fortalecimento do investimento público. Assim, ainda que tenha sido apresentada como um passo na direção de uma justiça fiscal, a MP manteve intocados os principais mecanismos de privilégio do capital financeiro e dos grandes grupos econômicos.
O resultado foi um texto híbrido, que buscava agradar o mercado e, ao mesmo tempo, oferecer à população a sensação de que algo estava sendo feito para cobrar dos ricos. Essa estratégia de conciliação, típica dos governos que evitam o enfrentamento direto com os setores dominantes, acabou se mostrando ineficaz. O Congresso, dominado pelos interesses do sistema financeiro e das bancadas empresariais, desmontou a medida, retirando de pauta o que poderia representar até mesmo pequenos avanços. O resultado concreto foi a manutenção do regime tributário desigual que favorece os bilionários, as bets e os bancos, enquanto a população trabalhadora segue arcando com a maior parte da carga fiscal.
Mas talvez o aspecto mais grave e menos comentado da MP 1303 esteja no seu impacto sobre a educação pública. Entre as alterações propostas, a Medida Provisória modificava o artigo 65 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação, permitindo que transferências monetárias, como o programa Pé-de-Meia, fossem consideradas parte da manutenção e desenvolvimento do ensino. Essa mudança contábil cria uma ilusão de investimento, pois permite que o governo cumpra formalmente o piso constitucional de 18% em educação sem, de fato, ampliar o investimento real em infraestrutura escolar, contratação de professores e apoio estudantil. Trata-se de uma manobra que esvazia o financiamento público da educação, enquanto o discurso oficial mantém a aparência de compromisso com o setor.
Essa lógica se repete em outras partes da medida, como na limitação de pagamentos de direitos sociais, entre eles o seguro-defeso, que passa a depender da disponibilidade orçamentária. Essa política de compressão fiscal transforma direitos em despesas contingentes, subordinando o bem-estar social à lógica do ajuste. O Estado deixa de ser garantidor de direitos e passa a operar como gestor de planilhas.
Essa orientação não é isolada. Ela dialoga diretamente com a proposta de reforma administrativa em curso, que se apresenta como modernização do serviço público, mas na verdade é parte do mesmo projeto de austeridade e gerencialismo. Sob o pretexto de eficiência, pretende-se reduzir o papel do Estado, flexibilizar vínculos trabalhistas, congelar progressões e enfraquecer a estabilidade dos servidores. O objetivo é transformar o serviço público em uma estrutura subordinada à lógica empresarial, com metas, cortes e contratos temporários substituindo o princípio de universalidade do atendimento.
O impacto combinado dessas políticas é devastador. De um lado, a MP 1303 cria brechas para o desfinanciamento da educação e o enfraquecimento das políticas sociais. De outro, a reforma administrativa consolida um modelo de Estado enxuto, controlado por tecnocratas e subordinado ao capital financeiro. Juntas, essas medidas pavimentam o caminho para a mercantilização dos direitos e o desmonte do serviço público.
É preciso compreender que a MP 1303 não foi apenas mais uma tentativa frustrada de reforma tributária. Ela simboliza a contradição central do atual governo: tentar agradar tanto o mercado quanto o povo. Essa conciliação, que busca equilibrar interesses irreconciliáveis, acaba sempre em prejuízo para os trabalhadores. Quando o governo evita o confronto com o Congresso e as elites econômicas, abre espaço para que até mesmo seus tímidos avanços sejam destruídos, e o resultado é a continuidade da austeridade e da desigualdade.
A classe trabalhadora e a juventude não podem aceitar que a educação, a saúde e os direitos sociais sejam tratados como moeda de troca nos acordos de gabinete. A luta por um sistema tributário justo deve caminhar junto da defesa intransigente do investimento público e da valorização do serviço estatal. O Congresso Nacional demonstrou mais uma vez que é um instrumento das elites econômicas e não dos interesses do povo. Cabe à juventude e aos movimentos sociais organizar a resistência e lutar por um outro projeto de país, onde os ricos paguem mais, o Estado sirva ao povo e a educação pública seja tratada como prioridade, não como despesa a ser cortada.