O camarote da vacina  e o Brasil dos ricaços
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O camarote da vacina e o Brasil dos ricaços

Nota das regionais do Juntos no Nordeste sobre a votação do PL 948/21 na Câmara dos Deputados.

Juntos! Nordeste 8 abr 2021, 12:49

Na semana em que o país superou mais um recorde no número de mortes por COVID-19, a Câmara dos Deputados, a partir de ampla campanha e apoio absoluto de Bolsonaro e seus capachos ministeriais, votou favorável ao Projeto de Lei 948/21, que permitirá ao setor empresarial adquirir vacinas por conta própria, em detrimento do que deveria ser gerência integral do SUS sob as doses que já são bastante insuficientes para o grosso da população. Na prática, se trata do aval dos parlamentares antipovo para a lógica do “comida pouca, meu pirão primeiro”.

Não há precedentes de uma perversidade assim em qualquer outro lugar do mundo, nem mesmo naqueles em que o capitalismo também tratou de aprofundar miseravelmente as condições de vida do povo mais pobre. Isso porque o enfrentamento à pandemia passa pela formulação de uma estratégia coletiva que atenda à hierarquia dos grupos prioritários e ao que faz sentido demograficamente no plano de vacinação. Dos 70 milhões de brasileiros que se enquadram nos grupos de risco, apenas 6 foram vacinados. Por que, então, desorganizar essa fila, senão para favorecer os interesses não dos que mais precisam, mas dos que têm mais dinheiro? Se faltam insumos hoje para a produção de novas doses, não deveriam ser respeitadas as vidas de quem está mais vulnerável ao vírus?

É dessa forma que opera um governo deliberadamente genocida. Enquanto milhares de famílias sofrem com os níveis assustadores de desemprego, o aumento exponencial da fome e os leitos superlotados de UTI, bilionários não apenas conservam os seus patrimônios, mas também continuam enriquecendo e os alargando. Não é de se admirar que desejem garantir sua imunização através de camarotes, mas ainda assim é escandaloso que 317 deputados, contra os 120 que foram contrários, não se sintam constrangidos em forjar o caminho para esse circo fúnebre.

Dos 317 que votaram pelo enfraquecimento do SUS e o fim da necessária fila única no Brasil, cerca de 82 legislam pelo Nordeste. Entre oportunistas da ordem e a base de apoio do governo, entraram no “bolo” alguns parlamentares dos partidos que hoje estão localizados na oposição ao bolsonarismo, como o PT (2, sendo 1 abstenção), PDT (7) e PSB (8). No momento em que há um grande apelo ao chamado de uma frente ampla capaz de derrotar o nosso inimigo em comum – afinal, mais de 4 mil pessoas estão morrendo por dia – é inadmissível que um tema como a defesa irrestrita do SUS seja tergiversado. Não somos parte dos que conferem ao Congresso a solução de todos os problemas de nossa classe e nem agendam para as eleições de 2022 o #ForaBolsonaro, mas acreditamos que episódios como esse reforçam o princípio de que a construção unitária não pode vir desacompanhada de um programa firme no que é mais imprescindível hoje para o povo trabalhador.

Além disso, existem elementos dialéticos de um país de proporções continentais como o Brasil que impõem atenção às particularidades da situação política no Nordeste. Uma região que ainda possui bastante peso do petismo e seus aliados, à frente dos governos de 7 dos 9 estados (com exceção de Sergipe e Alagoas) e com os quais registramos muitas diferenças, a exemplo da aprovação das reformas da previdência estaduais e do papel recuado diante da crise pandêmica nas medidas protetivas. À margem do país, campeã dos maiores índices de pobreza, tendo pontuado a maior rejeição à Bolsonaro desde o início de sua gestão na última pesquisa XP/Ipespe e com as veias abertas de contradições: não é possível disputar no Nordeste um programa que não diga as coisas como elas são, com o poder de definir os rumos do país nos próximos anos.

Não queremos que os interesses do Brasil dos ricaços se confundam ou sufoquem o Brasil que sonhamos construir: livre de negacionismo, do obscurantismo, da exploração da classe dominante, onde a juventude e o povo marcado pelas cicatrizes da pandemia possam viver dignamente. Até lá, não abriremos mão das lutas pela vacinação em massa, pelo SUS, por um auxílio emergencial justo e pela queda dos nossos carrascos. Para quem está com “a lama até o meio da canela” e afundando, não serve um projeto de pouca coragem. Manteremos unidade de ação com quem se colocar na oposição a Bolsonaro, já que a derrota de seu governo é uma tarefa histórica urgente, porém não abdicaremos de forjar alternativas políticas que estejam perpetuamente ao lado das pautas e direitos dos explorados e oprimidos de nossa sociedade.


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