Ainda é pouco: os desafios da oposição de esquerda no 59⁰ Congresso da UNE
Não há razão para fazer com que aqueles que não tem um projeto de independência ao governo tenham mais capacidade de construir sínteses que aqueles que querem propor um programa de mobilização dos estudantes.
Se iniciaram, por todo Brasil, as disputas do Congresso da União Nacional dos Estudantes. As eleições de tiragem de delegados já têm, nacionalmente, sido uma das principais oportunidades pós-pandemia para que o movimento estudantil brasileiro possa debater quais caminhos serão seguidos após a derrota eleitoral de Bolsonaro.
Esse é um Congresso que não se dá em qualquer momento: o CPI do MST demonstra uma necessidade objetiva da esquerda em unidade seguir em constante mobilização contra a extrema-direita, que ainda possui um papel central na política brasileira e se movimenta para tentar criminalizar os movimentos sociais. Ao mesmo tempo, o próprio governo já demonstra seus limites, com uma estratégia política de conciliação com os bilionários, tentando aprovar um arcabouço fiscal que traz ajustes para a classe trabalhadora, também explicitando a necessidade de que o movimento estudantil possa traçar um caminho independente do governo.
Assim como em períodos anteriores, a majoritária da UNE tem sido incapaz de fazer com que possa haver um projeto de entidade que permita um plano de mobilização que consiga, ao mesmo tempo que busca combater a extrema-direita, demonstrar uma saída que possa também impedir que uma política governamental econômica e social de ajuste que prejudique a vida dos estudantes e trabalhadores brasileiros. A estratégia política desses setores de alinhamento ao governo, tem feito com que a própria UNE até agora não tenha proposto nenhuma jornada efetiva contra o arcabouço fiscal, mesmo que ele possa afetar imensamente os rumos das universidades brasileiras.
Ou seja, segue necessário como nunca a afirmação de um polo independente do governo, focado em uma saída de mobilizações sociais e que construa um programa e um calendário unitário de lutas em defesa da universidade pública, dos direitos dos estudantes e do papel social que o movimento estudantil pode exercer em apoio às lutas dos trabalhadores.
A dispersão da oposição na UNE e as limitações da divisão
Infelizmente, o cenário das eleições nos principais centros políticos não tem refletido essa necessidade política. A marca em diversas eleições no país tem sido a dispersão das chapas de oposição – universidades importantes com 4, 5 chapas diferentes com projetos similares que, muitas vezes, tem criado mais confusão e desgaste entre os estudantes do que um debate de projeto dentro das universidades.
Essa tem sido a consequência da política de alguns setores da oposição de esquerda, em especial o movimento Correnteza e a UJC, que tem priorizado uma auto-afirmação de seus coletivos e partidos do que a busca de uma unidade com os marcos que definem o centro da luta política no país.
Isso tem feito com que as disputas eleitorais nas universidades não tenham possibilitado que os estudantes possam ter acesso ao centro da polêmica política que a nova conjuntura demanda: a necessidade de afirmar – contra o projeto da majoritária da UNE – que é necessário ter uma posição independente que não aceite passivamente a política econômica do governo e que aposte na estratégia de mobilização antifacista permanente.
Ao invés disso, vimos na UFPA um cenário de uma oposição dividida, que, após opção do Correnteza de montar uma chapa com a UJC separada do resto da oposição, permitiu um DCE já desgastado e abandonado pela UJS se reeleger trabalhando com a dispersão entre as oposições. Enquanto as chapas da oposição disputavam entre si, a majoritária pôde fugir das polêmicas que já a desgastavam na base estudantil e conseguiu cavar um espaço para poder ser maioria na universidade.
Na UFMG, por outro lado, a unidade entre os setores próximos ao PSOL foi fundamental para garantir uma maioria na reeleição do DCE da universidade. Enquanto tanto o Correnteza quanto a UJC saíram em chapas separadas um dos outros, a unidade entre Afronte, Juntos, Travessia, RUA e Manifesta permitiu que a chapa da atual gestão, a qual nos somamos, pudesse ser maior que essas duas outras chapas de coletivos da oposição à UNE somadas. O complemento entre um trabalho de peso dos camaradas do Afronte na universidade com contribuições importantes que pudermos dar na FAFICH, Montes Claros, FAE e especialmente na FACE, permitiram a construção de um polo vitorioso na universidade – uma decisão política que fortaleceu todos setores nessa construção.
Ou seja, ao mesmo tempo que parte dos setores da oposição têm utilizado a separação e dispersão como estratégia, buscando a autoafirmação, temos visto as dificuldades que essa política tem para construir uma perspectiva real para os estudantes. Esse processo que tende a se repetir em outras universidades do país, como a UFRJ e a UFF demonstra uma limitação na perspectiva política que alguns setores da oposição de esquerda têm tido na sua estratégia para o CONUNE.
Por um plano de mobilização dos estudantes em todo país!
Não acreditamos que nossa crítica à UNE seja somente ao seu método de atuação e organização. O atual Congresso está repleto de regras burocráticas e antidemocráticas, mas acreditamos que a disputa atual tem que ir além disso. Nem achamos que só a agitação em abstrato de nosso programa partidário seja suficiente para criar o sentido político que achamos que é necessário imprimir à UNE.
É necessário redebater o sentido político dessas disputas. Participamos do Congresso da UNE não somente para fortalecer o Juntos ou o PSOL nas nossas universidades – óbvio que isso também é fundamental – mas para disputar na consciência dos estudantes a necessidade de se indignar e lutar por mais direitos e para construir uma UNE independente do governo e combativa.
Nenhum desses desafios será feito somente pelo coletivo A ou B. O Juntos, por si só, não tem pretensão alguma de ser o único coletivo que tem as respostas revolucionárias para toda conjuntura brasileira. Mas acreditamos que é na construção de uma estratégica em comum e unitária de mobilização entre os dispostos a se mobilizar que podemos encontrar um caminho para o movimento estudantil diferente do proposto pela atual direção da UNE.
Precisamos de uma entidade comprometida em enfrentar o arcabouço fiscal, uma que possa fazer uma jornada permanente de lutas contra o Novo Ensino Médio. Queremos que a UNE se posicione sobre a legalização das drogas, construa as greves pelo clima no país, que se some à luta indígena e dos sem terra e que tenha posição política quando necessária contra o governo para garantir a recomposição orçamentária.
Queremos construir um caminho focado nas lutas e mobilizações sociais e não só em nossa própria afirmação – levar os estudantes para estarem mobilizados conosco e não somente votarem em nós. Para tudo isso precisamos ser mais do que estamos sendo, ter como estratégia a luta dos estudantes e não só nosso próprio fortalecimento perante outros na oposição, refletir uma política ampla, plural e democrática.
Convidamos todos setores da oposição a refletirem sobre isso – a UNE ainda precisa mudar. Não há razão para fazer com que aqueles que não tem um projeto de independência ao governo tenham mais capacidade de construir sínteses que aqueles que querem propor um programa de mobilização dos estudantes. O teto político da divisão, auto afirmação e disputa interna é muito mais baixo que o da unidade da luta.
Para isso, nosso desafio é construir um projeto de mobilização desde já, com um calendário de mobilizações contra o arcabouço fiscal e o ensino médio, disputando contra os setores que não acreditam na prioridade dessas lutas. Nós faremos que todas nossas chapas e disputas sirvam a esse objetivo: a construção de uma oposição ampla, plural e democrática que permita um convite à luta a todos estudantes indignados.