Se a situação é grave a solução é…
Defender a educação não pode estar em segundo plano em 2024
O primeiro ano de governo Lula se finda. Um ano tumultuado internacionalmente, marcado pela continuidade da Guerra da Rússia contra a Ucrânia, do massacre israelense contra o povo palestino e do escancaramento da crise climática como um problema emergente da nossa geração. Por aqui, uma certa sensação de alívio. Os últimos anos de ameaça constante às liberdades democráticas e aos direitos conquistados pela luta dos trabalhadores, nos colocava em alerta constante contra Bolsonaro.
O movimento estudantil cumpriu um papel chave para essa resistência. Nunca é demais recordar a força do que foi o Tsunami da Educação para impôr uma trava ao governo Bolsonaro, em um momento que o ex-presidente estava fortalecido. Porém, o “alívio imediato” também nos trouxe dispersão. Terminamos 2023 sem grandes lutas a nível nacional, mesmo que não nos faltassem motivos. O arcabouço fiscal e consequentemente o orçamento aprovado para 2024, é aterrorizante. A política de déficit zero de Haddad, gera como consequência o corte de R$310 milhões no orçamento da educação. Diante disso, não nos basta ter um Ministério da Educação (que, aliás, está sendo comandado na prática pela Fundação Lemann) que convide representações estudantis para conversar, se o que vemos é, mais uma vez, o sucateamento da educação pública em detrimento do privilégio de ricaços.
Na contramão da situação do país, o estado de São Paulo presenciou fortes lutas, especialmente dos trabalhadores que se enfrentaram diretamente contra o projeto privatista de Tarcísio. Infelizmente a privatização da SABESP foi aprovada no mês de dezembro sob forte repressão na ALESP, mas ainda teremos uma luta prolongada contra a tentativa de corte bilionário na educação do estado e a privatização de linhas de metrô e trens em 2024. Mas também foi forte a luta no movimento estudantil, apesar da UNE ter apostado na estratégia do “diálogo” com o governo federal. As greves na USP e na UNICAMP foram as maiores em décadas. Mesmo em um contexto de ajuste neoliberal, os estudantes arrancaram vitórias concretas e se mobilizaram até mesmo em cursos e campus com pouca tradição de movimento. O movimento estudantil da UFMA, igualmente de forma independente da majoritária da UNE, produziu uma ocupação de reitoria heroica e foi a ponta de lança da luta nas federais. Quais lições, podemos então tirar desse ano, para construir um 2024 de lutas e vitórias nas universidades públicas?
O ano que passou
2023 encerra-se com alguns ensinamentos, que passam desde uma ruptura com o que vivemos nos anos de Temer e Bolsonaro, mas também sinalizam elementos de continuidade. No último período, tivemos uma marca de uma hierarquia geral nas lutas, pelos impeachments de Temer e Bolsonaro, como bandeiras iniciais para possibilitar o avanço em outros fronts. Esses processos tiveram uma marca de unidade entre os setores da esquerda, mas que se envolviam com estratégias distintas. Tanto no governo Temer, como no de Bolsonaro, vimos o campo orientado pelo lulismo, também conhecido como democrático-popular, entrando nas lutas, mas com um pé no freio, impedindo o seu desenvolvimento.
É nítido o exemplo dessa direção nos atos de 2021, buscando trazer um caráter festivo às mobilizações pelo impeachment, com datas com pouco enfrentamento e voltadas para canalizar forças nas eleições do ano seguinte. No Rio de Janeiro, para esfriar de vez as lutas, o último ato se converteu em uma roda de samba pela democracia.
Ainda que tenhamos superado Bolsonaro, a estratégia desses setores segue a mesma, buscando ditar as lutas de cima para baixo. Foi o caso da UBES e da UNE, entidades dirigidas pela UJS (PCdoB), em relação ao Novo Ensino Médio. Se colocarmos no papel, devemos ter mais reuniões dessas entidades com o MEC do que dias de mobilização convocadas por elas.
Mas havendo indignação para que haja luta, ela sempre acaba surgindo. Lutas se desenvolveram por todo o país, ainda que apresentando pautas que aparentam ser parciais, no fundo carregam um sentido de combate ao programa neoliberal que tem uma continuidade no governo Lula III.
O que acontece na Argentina, com a eleição do ultraliberal Milei, é um sinal de alerta. A extrema-direita não está derrotada e se reproduz através da justa indignação de parcela da população com as frustrações vividas na crise multidimensional que nos atinge. Ainda que tenhamos importantes melhorias neste ano, não temos uma ruptura com o programa neoliberal que possibilita, através de suas insuficiências, que figuras que parecem folclóricas cheguem ao poder.
O chão que pisamos
Estar conscientes dos desafios para 2024 é o primeiro passo. Entraremos o ano sob a vigência do arcabouço fiscal, que é apelidado corretamente de novo teto de gastos, por seguir a cartilha de contenção dos gastos sociais. Mesmo com um orçamento já reduzido, certamente teremos os tradicionais cortes ou contingenciamentos que vivemos nos últimos anos, enxugando ainda mais o pouco que já temos. Mas dessa vez, estão ameaçados os pisos constitucionais para saúde e educação, que já vem sendo questionados pela equipe econômica, por serem um entrave a políticas como a do déficit zero e a própria realização das emendas parlamentares utilizadas nas negociações do Congresso.
O orçamento das universidades federais para 2024 apontam uma redução de R$ 310 milhões em relação ao de 2023. Ou seja, temos um orçamento que é inferior ao elaborado no governo Bolsonaro. Enquanto isso, estudos técnicos da Andifes demonstram que precisamos de um acréscimo de R$ 2,5 bilhões para garantir o mínimo. O colapso é iminente. Não podemos assistir novas tragédias nas nossas universidades, como foi o incêndio do Museu Nacional na UFRJ ou mesmo um retrocesso na popularização do acesso por políticas de permanência insuficientes.
Ser ponta de lança das lutas sociais
Assim como a FASUBRA e o ANDES já apontam, devemos desde o início do ano preparar uma greve nas universidades federais, construída através da base do movimento estudantil. Se as entidades nacionais vêm se demonstrando insuficiente na elaboração de uma calendário geral de lutas, por uma escolha política, precisamos apostar numa cultura democrática, combativa e antineoliberal no movimento, a exemplo do que foram as greves nas estaduais paulistas de 2023. Tendo por objetivo a derrota do Novo Ensino Médio e a urgente recomposição orçamentária nas universidades, para que seja garantido o mínimo de estrutura e permanência, mas para que também possamos ir além.
Não se trata de um caminho fácil de se trilhar, onde devemos superar tanto a paralisia da UNE e UBES, mas também qualquer sentimento vanguardista que pretende por si só resolver os problemas da educação, como vimos na experiência da greve da USP. Precisamos construir um processo que faça com que essas lutas sejam massificadas e unitárias, mas sobretudo, orientadas pela radicalidade que uma nova geração de ativistas vem fomentando diante da indignação com o neoliberalismo.
Por isso, acreditamos que o movimento estudantil brasileiro precisa entrar 2024 com 5 principais tarefas, para que possamos de fato defender a educação, mas também construir um pólo radical e democrático na sociedade, que impeça o retorno de falsas alternativas de extrema-direita:
- Radicalidade com unidade na luta!
A greve da USP não foi um raio em céu azul, mas uma aposta consciente de uma direção convicta da necessidade de retomar grandes mobilizações, combinado com movimentações que surgiram debaixo para cima, que buscou construir de forma unitária com diversos setores sejam estudantis mas também da classe trabalhadora. A simples autoproclamação de cada organização também atrapalha nessa tarefa. A unidade que precisamos é para lutar!
- Sem democracia, não há ampliação!
Não podemos nos acomodar com assembleias esvaziadas e espaços deliberativos onde apenas quem participa são estudantes que já são organizados. É necessário buscar envolver a maioria dos estudantes, especialmente os que mais precisam de permanência estudantil, que são trabalhadores e que por muitas vezes não conseguem participar do dia-a-dia do movimento estudantil. Com comunicação, criatividade e democracia, precisamos construir lutas que expressem as reais necessidades dos estudantes.
- Ao lado da classe somos mais fortes!
O ápice da greve da USP foi no dia em que São Paulo parou na greve dos metroviários, ferroviários e dos trabalhadores da SABESP. A paralisação dos trabalhadores do IBAMA logo no primeiro dia do ano, nos demonstra que diversas categorias que serão atacadas por essa política econômica neoliberal do governo Lula, irão lutar em 2024. Só teremos condições de arrancar vitórias, se estivermos lado a lado desses trabalhadores!
- Disputar um programa ecossocialista e antineoliberal
Tentam nos convencer de que o desenvolvimentismo capitalista é o único modelo possível de sociedade. Mas a verdade é que o planeta e o nível de desigualdade em que nos encontramos demonstra que essa fórmula está nos levando ao abismo. É necessário avançarmos e discutir propostas para uma educação anti-neoliberal, que esteja a serviço do combate às desigualdades e da exploração ambiental.
- Quem se fortalece com o sucateamento da educação é a extrema-direita!
Enquanto a reforma do ensino médio não for revogada e as universidades públicas estiverem sob ataque, quem se fortalece é o projeto daqueles que odeiam a educação crítica e de qualidade. Se não queremos o retorno da extrema-direita, a luta por investimento na educação deve ser prioridade!
SÓ A LUTA CONQUISTA. VAMOS PARA 2024 CONSTRUIR A GREVE DA EDUCAÇÃO: CONTRA O NEM, OS CORTES, E O AJUSTE NEOLIBERAL DO GOVERNO LULA!
Participe dos acampamentos regionais do Juntos! neste início do ano, saiba mais aqui.